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Cabo Patrício: O povo votou em Arruda e sua base

Em entrevista exclusiva, presidente da CLDF mostra-se cético com possibilidade de impeachment e cobra dos eleitores mais responsabilidade nas urnas

 
O presidente em exercício da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), Cabo Patrício (PT), assumiu o cargo cinco dias depois de a Operação Caixa de Pandora, da Polícia Federal, colocar de pernas para o ar a política na capital do país. Desde então, a sede do Poder Legislativo foi invadida duas vezes, manifestantes foram agredidos, o governador José Roberto Arruda (sem partido) se desfiliou do DEM para não ser expulso.
 
O escândalo provocou uma enxurrada de ações. A Câmara recebeu, até agora, 15 pedidos de impeachment contra o governador, além de processos por quebra de decoro contra parlamentares envolvidos no mensalão do Arruda. O próprio Cabo Patrício responde a um deles, por ser o autor de um projeto que beneficia a empresa do filho do presidente licenciado da CLDF, Leonardo Prudente (DEM), na coleta de lixo hospitalar.
Nesta entrevista ao Congresso em Foco, realizada em seu gabinete na manhã de ontem (17), o petista mostrava-se com poucas esperanças sobre o processo político na Câmara. Patrício não acredita que o impeachment terá prosseguimento dentro da Casa, já que a base aliada ao governador deve enterrar os pedidos dentro da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Colegiado que, de acordo com a Procuradoria da Câmara, não tem competência para analisar a admissibilidade dos processos por crime de responsabilidade.
Ele divide a responsabilidade das atuais denúncias com os eleitores do Distrito Federal. Afirma que a composição da Câmara é um reflexo da sociedade. E acredita que a imagem do poder Legislativo, que sempre esteve em baixa, está muito arranhada. Mesmo assim, diz que o discurso de divisão de responsabilidades não é conformista. Patrício comenta que é necessário analisar bem os candidatos antes de votar. “Não basta mudar a composição”, afirmou.
Para o petista, Arruda repete as práticas do ex-governador Joaquim Roriz (PSC), dono de quatro mandatos como chefe do Executivo local. “A prática do governo Arruda é uma continuidade da prática do governo Roriz”, afirmou.
Uma investigação séria, na visão do deputado, começa pelo afastamento do governador e seu vice, Paulo Octávio (DEM). “Se você quer investigar a corrupção no DF, só tem duas pessoas que devem ser afastadas: o governador e o vice”, apontou. “É uma mudança de postura. E para mudar você tem que tirar o chefe da quadrilha. Não é o chefe que manda?”, questionou.
Leia os principais trechos da entrevista:
A Câmara Legislativa vai sair dessa crise com uma imagem pior do que entrou?
Na verdade, atingiu todos os poderes: Judiciário, Legislativo e Executivo. E a Câmara não deixa de sair com um prejuízo muito grande. Quando nós começamos o projeto “Câmara nas cidades, mais perto de você” deu uma melhorada na imagem da Câmara, porque os parlamentares se aproximaram da sociedade, ouviram os problemas das comunidades. Tem deputado que não tem muito contato fora da Câmara Legislativa. Tem deputado que não conhece nem algumas cidades satélites. É uma realidade. Com esse escândalo, com certeza arranhou-se e muito a imagem da Câmara.
A Câmara tem de analisar e votar um processo de impeachment contra o governador. E, além disso, decidir sobre a possibilidade de cassação de oito deputados titulares e dois suplentes. E, mesmo assim, vai entrar em recesso e só voltar a trabalhar no dia 11 de janeiro. Essa é uma atitude correta? Isso não reforça a impressão de que a Câmara pouco se importa com os anseios da sociedade?
As pessoas têm que entender o seguinte: os 24 parlamentares são eleitos pela sociedade. Essa composição da Câmara Legislativa é um reflexo do que as pessoas escolheram na última eleição. Ninguém veio para cá sem ter voto da população. Os parlamentares representam os anseios da população. Claro que ninguém votou para que alguém se envolvesse em corrupção, isso é claro. Mas por isso é que o cidadão tem que ter a consciência de que, quando ele vota, a pessoa vai pra lá e pode ser base do governo, pode ser corrompido. Tem que conhecer a história da pessoa, de quem vai ser parlamentar e como ele vai se posicionar.
Mas é só responsabilidade do eleitor? Independentemente dos votos, os deputados não têm as suas responsabilidades?
Têm, claro. Ficou muito ruim o recesso ficar para o dia 11. Mas pior seria se nós voltássemos apenas no dia 2 de fevereiro, para aí começar a discutir tudo de novo. Se teria comissão especial, se o impeachment passa pela CCJ, se ia ter CPI. Na verdade, nós deveríamos ter continuado os trabalhos. Mesmo votando o Orçamento, nós podíamos ter feito uma autoconvocação para o dia seguinte. Para saber o conteúdo do relatório da Polícia Federal, para saber o posicionamento do ministro Fernando Gonçalves, para ver se teve algum desdobramento do depoimento que o Durval [Barbosa, ex-secretário de Assuntos Institucionais do GDF e autor das denúncias contra Arruda e os demais envolvidos no escândalo] deu ao Ministério Público Federal em São Paulo. Então, tudo isso seria novos acontecimentos. Era importante que a Câmara não entrasse de recesso de maneira nenhuma até para que ela pudesse acompanhar e até tomar decisões em função disso. Mas o que eu queria dizer é que essa é uma casa colegiada. A maioria aqui é governista. São 19 deputados governistas e cinco de oposição. E dos cinco de oposição, você tem um partido que é da base do governo [o PDT], votando com o governo em alguns momentos. De fato, você tem apenas quatro deputados e um partido que faz oposição. Com o andar das coisas, você teve seis partidos que saíram da base do governo.
Mas os deputados desses partidos, na prática, não saíram da base na Câmara.
Os deputados desses partidos é que estão dando sustentação para o governador. Tanto que foram 16 votos para votar o Orçamento. Quem decidiu que a Câmara volta no dia 11 e não continua direto? Foram os mesmos parlamentares. Tudo isso foi colocado. Tanto que a sessão terminou às quatro horas da manhã. Então, é importante que as pessoas tenham isso muito claro: jogo de cena para tirar partido da base do governador. Não tirou o apoio ao governador Arruda. Então, o governador Arruda continua com uma base de sustentação muito forte dentro da Câmara Legislativa.
Não é um discurso conformista dizer que os deputados foram eleitos pela população, como se preparando para dizer que as investigações não vão dar em nada?
Não é conformista. A população tem que entender que ela também tem responsabilidade. A corrupção instalada no DF, todo esse modelo político, foi desenhado por Arruda. Havia outros projetos estabelecidos. O cidadão foi lá e despejou o voto na urna no Arruda. O Arruda é alguém que foi lá e violou o painel do Senado, que foi lá e infringiu a legislação, que renunciou, que foi lá e pediu desculpas, e a população aceitou as desculpas que ele deu. Então foi esse cidadão. É importante colocar isso. Por quê? Pra que esse cidadão entenda que Brasília vai fazer 50 anos no ano que vem. É importante que ele vote em pessoas que tenham um passado limpo, pessoas que têm caráter, que mudem Brasília. Que ele vote em pessoas decentes e mude essa conjuntura. O que ele prefere? Ter uma festa de milhões de reais ou votar certo e extirpar a corrupção do DF? Ele tem que ter isso muito claro. Pode até não dar em nada. As duas CPIs que tiveram por aqui. Esses parlamentares que vão julgar o Arruda serão julgados em dezembro de 2010.
A pressão que vem das ruas não vai fazer efeito?
Espero que faça. É bom ter claro isso: a Câmara foi ocupada, houve confronto de manifestante e PM no Buriti. No dia da votação, na última sessão, os manifestantes vieram pra cá. Teve enfrentamento de seguranças e, mesmo assim, a base não recuou. A base continuou do lado de quem, da pressão popular ou do governador? Continuou do lado do governador.
Isso é interpretado como um sinal de prestígio do governador. Isso se deve a quê? Às denúncias do mensalão, que podem aumentar ainda?
Tudo o que o Arruda conseguiu foi conversando individualmente com os deputados. Tem que se saber o que ele conversou com eles. Se é que isso não foi filmado. Cada conversa pode ser gravada e sair um dia. O tempo é senhor de todas as coisas.
Existem três processos de impeachment correndo na Câmara. Vai ter algum tipo de resultado?
A oposição quer que eles sejam analisados primeiro pela CCJ, mesmo contra o parecer do procurador da Câmara. Pode ter, não precisa nem ser três. Entraram 15. Um só seria suficiente. Desde que afaste o governador e o vice. Eu não duvido que esse depoimento do Durval e outras questões possam vir à tona. O que é que acontece aqui: você teve a votação do Orçamento, aí tem as festas de final de ano. Na cabeça dos aliados do governador, isso pode dar uma acalmada. E pode depois não dar em nada. Mas também pode vir uma nova denúncia forte, fatos novos. Será que a base vai reagir da mesma forma se houverem novos fatos de corrupção? Ou imagens mais fortes do que essas que foram apresentadas? Continua assim mesmo se houver uma revolta da sociedade, da população como um todo? Eu duvido. Essa pressão popular tem que aumentar para que esses deputados sejam sensibilizados e cumpram o seu papel conforme o seu juízo.
Agora, votação do impeachment é com voto aberto. E em um ano de eleição.
Você acha que vai chegar no ponto do voto aberto? Porque essa questão da CCJ é isso aí. É uma reunião fechada, decide que não tem admissibilidade e morreu ali. Quatro vão ficar expostos, só a posição do Chico Leite, do PT, vai ser preservada. Isso é para não correr o risco de uma votação aberta com a galeria lotada. No dia 11, as galerias estarão abertas. E os deputados têm que entender que isso aqui é a casa do povo. Se eu ainda for presidente da Câmara, a galeria e o auditório estarão abertos. Seja contra ou a favor de Arruda.
O senhor, então, tem pouca esperança no impeachment?
Você tem uma lei federal que cassou o presidente Fernando Collor. Que inclusive foi usada nos casos do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Maranhão. Por que? Porque a lei estadual não pode ser superior à lei federal. A Lei Orgânica não pode sobrepor. Por isso que o rito é baseado nessa lei, para não haver questionamento judicial, para as pessoas ganharem tempo. Como a base do governo insiste pela CCJ, é uma estratégia. Você tem alguma esperança que não vá ser enterrado pela CCJ? O discurso dos governistas é da admissibilidade. Tem admissibilidade maior que as imagens que foram divulgadas?
Mas a tática é dizer que o que aconteceu foi crime eleitoral e já prescreveu.
As imagens mostram um momento, que foi em um momento eleitoral e realmente já prescreveu, tudo bem. Mas e o restante das acusações que o Durval faz? As imagens são para você marcar que havia uma forma de agir. Tá declarado. Por que está cheio de obra em Brasília? Porque obra é caixa 2. Obras sem licitação, com contrato emergencial. Você não pode fazer o julgamento só baseado nas imagens. Você tem outras provas, testemunhas. A Polícia Federal vai pedir a quebra do sigilo bancário e fiscal. Por isso, você tem duas investigações, a política e a jurídica. A CPI é importante. Por mais que não dê em nada, muita coisa vai vir à tona.
A impressão é que não existe muita preocupação com as eleições de 2010, com o julgamento público.
Eu dou o exemplo de Rondônia [numa fita de vídeo, deputados estaduais pedem propina ao governador Ivo Cassol]. Dos 24, só cinco se reelegeram. Aqui, você pode ter a Câmara toda. Eu falei isso no começo da legislatura. Não é só mudar a Câmara, tem que analisar a prática.
A postura da oposição foi contestada durante a votação do Orçamento, quando faltou apenas um minuto para adiar a análise por um dia. A oposição falhou?
A oposição não falhou em nada. A Casa é democrática. Votar na terça e votar na quarta, qual a diferença? Votar na quarta e votar na quinta, qual a diferença, com essa base que está aí? Vamos ser honestos: ficar trabalhando até o dia 2 de fevereiro do jeito que a gente vinha, discutindo a indicação dos membros da comissão especial para o impeachment. A base insistindo que era CCJ. Nós íamos ficar aqui só discutindo. A sociedade precisa do Orçamento, ele tinha que ser votado. Nós votamos contra por causa da quantidade de dinheiro que vai para as empresas envolvidas. O governo Arruda tem uma diferença para o governo Roriz. O Roriz centralizava toda a tecnologia da informação na Codeplan. O governo Arruda não. Ela é desmembrada em todo o governo. Não dava para votar a favor. Agora, você também barrar o Orçamento tendo saúde, educação, segurança, aí também não dá, é ser irresponsável. Agora, não impedia a autoconvocação para o dia seguinte. Tanto que nós aprovamos um requerimento para o dia seguinte. Isso é o mais importante. Quem é que tem que ser afastado? O governador. Se você quer investigar a corrupção no DF, só tem duas pessoas que devem ser afastadas: o governador e o vice. Eles que controlam toda a execução do Orçamento. Se você puder colocar outra pessoa, quem quer que seja, você pode controlar, suspender os pagamentos. Você pode suspender as obras, fazer auditoria nos contratos, você acaba com o mensalinho do DEM na Câmara Legislativa. É uma mudança de postura. E para mudar você tem que tirar o chefe da quadrilha. Não é o chefe que manda?
A Câmara tem isenção para julgar os processos? A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) defende que os deputados citados não participem do julgamento.
Eu concordo que os deputados envolvidos não possam participar do julgamento do impeachment. Tem que ter transparência nos julgamentos, inclusive no meu.
Não cria mais um problema o presidente em exercício da Câmara estar envolvido em outra denúncia, como o caso do projeto que beneficiou uma empresa do filho do deputado Leonardo Prudente (DEM), presidente licenciado da Câmara, na coleta de lixo hospitalar?
Cria mais suspeição ainda sobre a Câmara Legislativa. Mas esse é o clima que a base do governo quer. É jogar todo mundo na vala comum, dizer que todo mundo é igual. Ainda querem criar suspeição para dificultar a investigação. Tem que ter uma investigação completa. Quem sancionou foi o governador. É uma lei que existe em outros estados. O governador poderia ter feito licitação, não fez. Contratou em caráter emergencial. Depois, poderia ter feito novamente a licitação, não fez. A prática do governo Arruda é uma continuidade da prática do governo Roriz.
 

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