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Prisão Virtual

A prisão, hoje em dia, ao invés de ressocializar, de procurar reinserir o condenado na sociedade, na verdade, tem o propósito de estigmatizar, de humilhar.

A prisão, hoje em dia, ao invés de ressocializar, de procurar reinserir o condenado na sociedade, na verdade, tem o propósito de estigmatizar, de humilhar. A infração penal não pode ser entendida como um fenômeno isolado e fruto de um ser anormal, mas um acontecimento inerente à sociedade. Daí a Organização das Nações Unidas (ONU) ter, na Assembléia Geral de 14.12.90, pela resolução 45/110, aprovado as Regras Mínimas para as Medidas não Punitivas de Liberdade — as regras de Tóquio.
A ONU tem-se preocupado com o tratamento dado aos presos, provisórios ou não. Perante o Comitê Permanente da América Latina para Revisão das Regras Mínimas da ONU para Tratamento dos Presos, Seminário Internacional, realizado em Buenos Aires (Argentina), de 27 a 29 de abril de 2009, a temática foi a busca de mecanismos garantidores da efetividade das Regras Mínimas da ONU para Tratamento dos Presos, com objetivo de redução de oportunidades aos conflitos e controvérsias na reforma global das prisões.
A pena privativa de liberdade, a prisão, o brutal encarceramento, em prisões infectadas, promíscuas, superpovoadas, continuam a ser a dos tempos antigos: “a) a mais difundida das penas; b) a mais degradante; c) a mais indigna; d) a mais risível de pena; e) a mais abusiva de direitos humanos na execução da pena” (Edmundo Oliveira).
E o que dizer do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), consagrado na Lei 10.792, de 1º de dezembro de 2003, em que os presos mais perigosos não falam entre si; todos ficam em celas individuais sem desenhos ou fotos; o banho de sol é limitado a uma hora por dia; não há atividades recreativas; TV e rádio são proibidos, assim como jornais e revistas e não há visitas íntimas? Como disse um detento: “Aqui o lugar é horrível, é horrível. É o pior lugar que eu já tive na minha vida. Eu estou bem fisicamente. Psicologicamente é que eu estou um bagaço. Esta é que é a verdade. Isso aqui é horrível. Nada se compara com isso aqui. É uma fábrica de fazer maluco, sinceramente. Eu já estou chamando formiga de meu louro”.
O RDD lembra as prisões nazistas, as do tempo da ditadura no Brasil, em que para o preso não morrer tinha acompanhamento médico durante as sessões de tortura. Uma monstruosidade. E, hoje, um governo democrático aceita esse tipo de tortura!
Num mundo altamente tecnológico, no qual a velocidade da informação “avança na luz do tempo real”, não se pode mais pensar em prisão em termos de masmorras e grades. As grades serão virtuais.
A ciência penal tem de valer-se da tecnociência para romper com métodos de vigilância, de encarceramento, que não deram certo, a não ser embrutecer o condenado, torná-lo uma fera, um revoltado, para depois devolvê-lo ao convívio social. Na verdade, a pena de prisão, como diz o professor Raúl Zaffaroni perdeu sua legitimidade.
Para reduzir a massa carcerária, o mundo tem de buscar os ensinamentos da tecnociência, valendo-se do monitoramento eletrônico por telefonia fixa ou celular em rede de fibra ótica, do Sistema de Posicionamento Global (GPS) e do microship, implantado na camada subcutânea do corpo humano — entre a derme e a epiderme, para vigiar e monitorar os presos. O controle poderá ser total, mais do que nas penitenciárias.
O monitoramento evita as deletérias consequências das prisões, com suas promiscuidades, más condições de higiene, evita a ociosidade — mente desocupada é fonte de maus pensamentos. A falta de vagas faz com que os presos, como é de todos sabido, se amontoem em pequenos espaços, vivendo como animais.
A solução proposta pelo Direito Penal Máximo: prisão, sempre prisão, fracassou há muitos anos. O Direito Penal Mínimo, em que a prisão deve ser decretada em ultima ratio, é que deve prevalecer. A prisão sem grades, livra, por outro lado, o estigma do preso e reduz as despesas do Estado.
O monitoramento eletrônico para as penas de curta duração e de final de cumprimento é realizado através de pulseira (que pode causar, em razão da exposição, algum estigma), tornozeleira, cinto ou de microship implantado no corpo (este método pode acarretar o risco de uma pena invasiva). Ainda tem-se a utilização do GPS, que permite fiscalizar se o condenado entra em área de exclusão, fixada pelo juiz, como parques públicos, escolas, determinadas ruas, enfim áreas em que o condenado não pode transitar.
O monitoramento de vigilância não pode ser utilizado unicamente para obter-se a punição do preso. Medidas de assistência socioeducativas devem ser asseguradas. A comunidade deve ser chamada para a recuperação do preso. O monitoramento pode, em algumas hipóteses, vir a substituir, inclusive, a prisão cautelar.
A prisão virtual pode encarcerar o condenado em sua própria residência. Prisão domiciliar com monitoramento eletrônico. Aí teremos, no futuro, o fim das penitenciárias. Ele está livre das grades de ferro, mas é prisioneiro, em sua própria casa, uma vez que a liberdade de ir e vir está cerceada, com o controle inclusive das visitas.
Não pode, porém, haver uma devassa da intimidade secreta do infrator, aquela esfera em que o indivíduo não reparte com ninguém, nem com seus entes mais queridos. A prisão virtual será a prisão do futuro, de um futuro não muito longe.
 
aUTOR: F. TOURINHO NETO
Juiz do TRF-1ª Região, membro do Conselho Deliberativo do Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas, da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, membro do Comitê Permanente da América Latina da F

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