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Presidente do STF ”Ninguém é imune aos tributos”

BRASÍLIA - Com o mesmo vigor que caminha uma hora, todas as manhãs, sob o ar seco das superquadras da Asa Sul de Brasília, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, rebate as críticas de que o STF “revogou” a cláusula pétrea constitucional do direito adquirido, ao referendar a emenda que determinou a contribuição previdenciária de servidores aposentados e pensionistas. Com a veemência que vem marcando suas intervenções nas sessões plenárias do Supremo, ele refuta as reações contrárias à polêmica decisão.

BRASÍLIA – Com o mesmo vigor que caminha uma hora, todas as manhãs, sob o ar seco das superquadras da Asa Sul de Brasília, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, rebate as críticas de que o STF “revogou” a cláusula pétrea constitucional do direito adquirido, ao referendar a emenda que determinou a contribuição previdenciária de servidores aposentados e pensionistas. Com a veemência que vem marcando suas intervenções nas sessões plenárias do Supremo, ele refuta as reações contrárias à polêmica decisão.

Em entrevista ao Jornal do Brasil, Jobim reafirma que o STF não tratou de direito adquirido no julgamento das ações de inconstitucionalidade contra a taxação dos inativos e pensionistas. Por 7 votos a 4, os ministros limitaram-se a declarar que a contribuição para a Previdência é um tributo. Jobim dá um exemplo no limite do absurdo:

– Se houvesse direito adquirido na área tributária, uma pessoa teria de pagar os mesmos impostos, sem qualquer alteração, desde a data em que nasceu. O ministro também reage com firmeza às insinuações de que o STF vem se rendendo a pressões do governo, numa espécie de parceria para assegurar a governabilidade do país. Quanto à chamada judicialização da política – é de 200 por mês a média de ações de inconstitucionalidade que chegam ao Supremo, Jobim prefere aguardar um levantamento que vai mandar fazer sobre o percentual de ações desse tipo acolhidas ou rejeitadas pelo tribunal. Se a grande maioria tiver sido considerada improcedente, é sinal de que o STF estaria mesmo sendo usado como palco para o prolongamento do debate político.

Os críticos do STF que se previnam. Jobim está em plena forma para enfrentar novos embates. De março a junho – quando assumiu a presidência do STF – perdeu 17 quilos, num regime em que são proibidos, basicamente, carboidratos e doces.

– Boa parte da opinião pública entende que, ao considerar constitucional a taxação dos inativos, o Supremo fez vista grossa à cláusula pétrea do direito adquirido. Que explicação o senhor dá?

– É muito simples. Não estava em jogo nessa questão a teoria do direito adquirido. O pressuposto da decisão era uma decisão anterior, no governo Fernando Henrique, quando houve uma tentativa de taxar os inativos. O que aconteceu, então? Ao votar a Emenda nº 20 (em 1998), o Congresso rejeitou a taxação dos inativos do setor público. E determinou ainda a aplicação das regras do Regime Geral de Previdência ao serviço público. Nessa regra geral previa-se a isenção dos inativos. Mas, em 2000, o mesmo governo resolveu taxar os inativos. Houve então uma ação de inconstitucionalidade, e nós decidimos por maioria, contra os votos de dois ministros, que não se podia cobrar contribuição previdenciária dos aposentados e pensionistas, por que não havia previsão constitucional para isso.

– O que mudou de 2000 para cá?

– O respaldo constitucional veio com a Emenda nº 41, que foi aprovada em dezembro do ano passado. Assim, passou a ser possível a taxação. Ou seja, não havia nenhum direito adquirido a não ser tributado, porque a regra é: ninguém tem direito a não ser objeto de incidência de tributo. Não existe direito adquirido a regime tributário. Nem para aposentado, nem para pensionista. E a contribuição social é um tributo, assim considerada desde a emenda constitucional de 2003. Portanto, não há que se falar na cláusula pétrea do direito adquirido, que não estava em questão.

– O que estava exatamente em questão?

– Estava em questão o seguinte: Era possível se cobrar tributos dos inativos e pensionistas? E nós entendemos que sim, porque tributos podem ser cobrados de qualquer um. Se fosse verdadeira a tese de que a contribuição social não poderia ser exigida para os aposentados, também não poderia ser cobrada dos servidores ativos. Portanto, não se tratava, absolutamente, de direito adquirido. Só para se ter uma idéia, se nós começássemos a pensar que há direito adquirido nesse caso, a pessoa seria tributada com os tributos existentes na data em que nasceu. Da mesma forma, uma empresa só seria tributada com os impostos existentes no dia em que foi constituída. Isto é, seria um direito adquirido ao regime tributário. Então não há nada disso.

– Ou seja, as tabelas do Imposto de Renda, por exemplo, teriam de ser imutáveis…

– É. Seriam imutáveis. Então, não houve nenhuma consideração sobre política econômica, e nenhuma pressão do governo.

– Em julgamentos de questões que envolvem a possibilidade de prejuízos de bilhões de reais para os cofres públicos, os ministros do Supremo levam em conta, de alguma maneira, o impacto de seus votos na saúde financeira da União?

– Não necessariamente. Quando você tem efetivamente um direito líquido e certo definido no texto constitucional, não podemos levar isso em conta. Aí é o governo que tem de se preocupar com isso, na formulação de suas políticas. O que levamos em conta são as regras constitucionais. Agora, quando se tem um espectro de decisão em que são possíveis vários itens de decisão, um eventual impacto na economia pode entrar como elemento de decisão. Mas como elemento acessório da decisão, e não como elemento principal.

– O governo costuma fazer gestões políticas junto ao presidente e aos ministros do Supremo, às vésperas de julgamentos em que haja especial interesse, em nome da governabilidade?

– Não houve nenhum caso desse tipo. O que ocorreu, no caso dos inativos e pensionistas, foi a visita que me fez o ministro da Previdência, para levar os elementos jurídicos de sua assessoria em relação ao tema, dizendo: ”Essa aqui é a nossa posição, a nossa situação é essa”. E me entregou um memorial. E isso é absolutamente normal no convívio do Supremo, onde recebemos visitas de todos os interessados. Eu recebo essas visitas, inclusive, várias vezes, do advogado-geral da União. Como advogado que é, ele leva memoriais aos ministros do STF, e sustenta suas teses, procurando explicar a posição de seu cliente – a União – em relação à questão jurídica em discussão. A gente ouve. É normal você ouvir tanto os interessados de um lado, como do outro. Recebo sindicatos, pessoas interessadas, representantes de aposentados, etc…

– A seu ver, existe mesmo a crescente judicialização da política? Afinal de contas, o Supremo está abarrotado de ações de inconstitucionalidade. Já foram cerca de 3.300 ações, desde a promulgação da Constituição em 1988 – uma média de mais de 200 por ano.

– O que se passa é que, na maioria das vezes, quem foi derrotado no debate político do Congresso prolonga esse debate no STF. Você pode observar que durante os oito anos do governo anterior, os autores das ações de inconstitucionalidade foram exatamente os partidos da oposição. Agora está acontecendo o mesmo. Os partidos hoje na oposição, que antes eram situação, é que estão começando a freqüentar bem mais o Supremo, ajuizando ações diretas de inconstitucionalidade. Em alguns casos, eles têm razão. Mas nos outros casos trata-se de um mero prolongamento do debate político.

– Isso também ocorre em âmbito estadual?

– Sem dúvida. Quando um governador é minoria na Assembléia Legislativa, há uma tentativa de aprisioná-lo com leis inconstitucionais. Houve um momento em que, por exemplo, o governo Olívio Dutra, no Rio Grande do Sul, que era minoria na Assembléia, foi – digamos assim – o maior cliente do Supremo. As assembléias legislativas mantêm disputas políticas com governadores, e nós temos de arbitrar essas lutas políticas através do julgamento de ações de inconstitucionalidade.

– O número aparentemente grande, de mais de 200 ações de inconstitucionalidade por ano, é um índice razoável?

– É o processo de ajustamento democrático. É normal. Mas eu vou fazer um levantamento dessas ações, cujo número conhecemos. Agora quero fazer um levantamento para confirmar ou não essa tese da judicialização da política. É preciso verificar o percentual das ações julgadas procedentes e improcedentes. O fato de se ajuizar uma ação de inconstitucionalidade não significa grande coisa. Contudo, se temos um grande número de ações improcedentes, isso indica exatamente a tentativa de se prosseguir, no Judiciário, o debate político. A expressão judicialização da política significa a tentativa de prosseguir o debate político em outro foro que não o foro político. Essa resposta só será competente na medida em que eu concluir esse levantamento, essa análise da curva de acolhimento e rejeição dessas ações. Se as ações procedentes forem em grande número, os autores tinham razão. Então, chegaríamos à conclusão de que não existe uma judicialização da política, mas tentativas de se fazer com que a política fique dentro dos limites constitucionais.

– Seria, assim, uma questão bem diferente do excesso de recursos protelatórios nas instâncias superiores do Judiciário…

– É outro nível. Nas ações de inconstitucionalidade, a discussão é a seguinte: Excedeu-se ou não o Poder Legislativo ou o Executivo em relação aos limites constitucionais? Esta é a questão. Então, se a taxa de aceitação dessas ações pelo STF for muito grande, vai se demonstrar que os governos tentaram exceder-se, o tribunal interveio e cortou suas asas. Não por política, mas porque é a obrigação do STF fazer com que os poderes Executivo e Legislativo respeitem os limites da Constituição.

– Esse levantamento sobre a taxa de acolhimento ou não das ações de inconstitucionalidade está dentro do amplo diagnóstico do Judiciário que o senhor começou a coordenar?

– Está dentro, digamos, dos indicadores. Lembre-se que eu falei em índice de procedência de ações.

– Por que há tantas ações diretas de inconstitucionalidade e são raras as ações declaratórias de constitucionalidade, que já têm efeito vinculante?

– É porque a regra do Supremo é só admitir ações declaratórias de constitucionalidade quando houver decisões divergentes. Ocorre que as ações de inconstitucionalidade podem ser propostas sem que haja decisões prévias sobre a matéria do Judiciário. Nós só temos aceitado ações declaratórias depois que uma lei entrou em vigor e depois que essa lei foi objeto de decisões das instâncias inferiores divergentes em todo o país, sobretudo no nível de liminares. Como sabemos, essas decisões contraditórias criam uma grande instabilidade. As ações diretas de inconstitucionalidade, ao contrário, não dependem do comportamento dos juízes das instâncias inferiores. São ajuizadas diretamente no STF, por quem de direito. JB

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