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Guerra ridícula tem sido armada contra o Judiciário

Faz pouco tempo, uma senhora me procurou para pedir informações sobre a situação de seu filho, que estava preso por roubo, em um Distrito Policial.

Faz pouco tempo, uma senhora me procurou para pedir informações sobre a situação de seu filho, que estava preso por roubo, em um Distrito Policial. Quando ela disse a frase “meu filho está preso”, chorou. De fato, filho preso é pior que filho doente, só não é pior que filho morto.

Era uma mulher de cerca de 40 anos, vestida com roupas surradas e sem os dentes da frente. Ela explicou que o filho tinha 20 anos e era boa pessoa, mas se envolveu com más companhias e praticou o assalto induzido por três menores de 18 anos, viciados em drogas.

Disse para ela acompanhar o processo e garanti-lhe que os advogados do Estado, aos quais incumbia a defesa do rapaz, eram bons profissionais. Que ela ficasse tranqüila quanto aos defensores, mas não desistisse de procurar se informar sobre o julgamento.

Perguntei, então, se ela havia apanhado do marido, pois foi a primeira coisa que me ocorreu diante da falta dos dentes. “Não, meu marido foi embora faz tempo, me deixou com três crianças e nunca mais apareceu para saber da gente. Os dentes da frente eu perdi por falta de dinheiro para pagar um dentista.

Os que sobraram, vou ter de arrancar porque também não prestam. Peço a Deus que me dê meios para colocar uma dentadura, porque tenho vergonha”.

Incrível um país em que não há serviço dentário gratuito para a população carente. Todo hospital público deveria ter, além do atendimento à saúde, consultório de dentista. Ou os pobres não precisam de dentes?

Perguntei a ela porque havia me procurado, já que o caso do seu filho não estava comigo. “É que tem outra coisa que eu preciso dizer sobre esse roubo. A vítima havia recebido seu salário do mês e meu filho e os menores sabiam disso. Por essa razão, decidiram roubar-lhe o dinheiro, usando uma arma. Eram 500 reais.

Acontece que o assalto não deu certo e a Polícia prendeu todos, depois soltou os menores e só meu filho ficou detido na Delegacia. A culpa ficou só para ele, que não foi quem teve a idéia”.

Procurei explicar a questão da menoridade penal, mas ela respondeu que já estava informada do assunto. “Então, o que a senhora quer saber?”, perguntei. “É que os policiais ficaram com o dinheiro”, disse ela. “Os que prenderam meu filho ficaram com o dinheiro da vítima. Meu filho sabe que eles estão com os 500 reais, a vítima sabe também, mas ninguém tem coragem de dizer. Se os policiais fazem isso, que direito eles têm de prender o meu filho?”

Nessa hora, percebi qual era a grande indignação daquela mulher. Que prendessem seu filho era triste, doído, desesperador, mas tinha uma explicação; ele, de fato, roubara. Como mãe, nunca ensinara ao rapaz esse comportamento, muito pelo contrário, arranjara-lhe um emprego, mas ele não quis.

Achou mais fácil conseguir dinheiro roubando dos outros, que pagasse pelo erro. Mas e os policiais? Iriam ficar assim, tomando o dinheiro das pessoas sem que nada acontecesse?

“São os maus policiais”, falei, lamentando não poder fugir do jargão. “É lamentável, mas existem. Esperamos que um dia paguem por isso também”.

A corrupção ocorre em todos os lugares, mas como no Brasil é demais. O roubo é institucionalizado, cada um rouba onde e como pode, basta surgir a ocasião. Quem tem fome e não tem emprego, rouba, mas quem tem emprego e não tem fome, também. Trata-se de um valor cultural que cada vez mais se consolida.

A impunidade ajuda bastante, mas as raízes desse mal são ainda mais profundas. Trata-se do sentimento de que as regras não precisam ser cumpridas. Aliás, existem justamente para não ser respeitadas, de forma que algumas pessoas possam tirar proveito. Nosso grande valor moral, portanto, é a hipocrisia.

Enquanto isso, arma-se uma guerra ridícula contra o Judiciário, como se fosse o responsável por esse estado de coisas.

No mesmo dia em que fui abordada pela senhora sofredora e em razão do estado depressivo em que aquela conversa me deixara, decidi espairecer à noite. Queria caminhar pela rua, mas, por falta de segurança, tive de ir a um shopping center, embora não quisesse comprar nada.

Lá, por mero acaso, encontrei um juiz criminal, amigo de longa data, excelente profissional e ótima pessoa, que vinha esbaforido pelo corredor. Ele parou para me cumprimentar e, em seguida, contou que lhe havia acontecido algo inusitado no fórum, naquela tarde.

“O promotor me mandou cópia de uma declaração prestada por um sujeito acusado de roubo, na qual ele dizia que iria matar o juiz do processo. O juiz que ele quer matar sou eu”.

“E então, o que você vai fazer? Pedir segurança?”

Ele riu da minha sugestão e disse, calmamente, que já havia dado um despacho nos autos: “Ciente. Aguarde-se”.

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