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Retrocesso na lava-jato: “A tese de Toffoli não faz sentido“

Sob o título o artigo a seguir é de autoria de Rogerio Tadeu Romano, advogado e ex-Procurador Regional da República.
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A jurisdição do Supremo Tribunal Federal, a teor do artigo 102 da Constituição Federal, se faz em matéria da defesa de preceitos fundamentais instituídos pela Constituição, na defesa de seus princípios e normas e, finalmente, numa jurisdição penal, dentro dos limites ali contidos.

Pois bem: preocupa aos estudiosos do direito os efeitos e, acima de tudo, as consequências, de decisão recente quando se discutiram institutos processuais-penais como prevenção, conexão, continência, para definir competência para instruir e julgar condutas criminais relacionadas ao que se intitulou de operação “Lava-Jato”.

A Corte, com o devido respeito, negou vigência a diversos institutos já relacionados.
Leva-se a discutir “o problema do juiz natural na operação lava-jato”

Não se pode espalhar as “peças de um quebra-cabeças”.

Há prevenção na matéria e persiste tal prevenção diante da conexão instrumental ou probatória existente.
A prevenção é a razão da reunião desses processos.

A prevenção se dá quando, tendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, venha um dele, antecipando-se aos outros praticar algum ato ou determinar alguma medida, mesmo antes de oferecida a denúncia (prisão preventiva, fiança) que o torne competente para o processo, excluídos os demais” (PAULO LÚCIO NOGUEIRA. Curso Completo de Processo Penal, 3ª ed., Saraiva. l987, pág. 66).
Preventa estará a jurisdictio de um juízo, quando este preceder, antecipar-se aos demais juízes igualmente competentes em algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anteriormente ao oferecimento da denúncia ou queixa.

Prevenção é critério de fixação da competência.

Prevenção é ato de prevenir, e prevenir (de prevenire) é vir antes, chegar antes, antecipar-se etc. Diz-se, então, prevenida ou preventa a competência de um juiz quando ele se antecipou a outro, também competente, na prática de ato do processo ou de que a este se relacione, como sucede com a prisão preventiva, a em flagrante, as buscas e apreensões, o reconhecimento de pessoas ou coisas etc.
Deflagrada em 17 de março de 2014 a chamada “operação Lava-Jato” desmontou um esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas que movimentou enorme quantia de dinheiro.

Informa-se que, de acordo com a Polícia Federal, as investigações identificaram um grupo especializado no mercado clandestino de câmbio.

Por certo, a sociedade de economia mista Petrobras está no centro das investigações, que apontam ex-dirigentes daquela empresa envolvidos no pagamento de propina a políticos e executivos de empresas que firmaram contratos com a petroleira.

Como já salientado foram diversos os ilícitos cometidos que estão sendo investigados: peculato; corrupção passiva e ativa(sendo que há uma vertente onde se argumenta pela existência de crime de concussão, forma de extorsão promovida por servidor público); frustrar ou fraudar licitação mediante ajuste ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório com intuito de obter para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação; organização criminosa, formação de cartel, todos em concurso material(artigo 69 do Código Penal). Além deles, pode-se falar no cometimento, dentre outros, de delitos de sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Sabe-se que essa operação levou à prisão de Alberto Youssef, que foi apontado como “chefe do esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas”(este crime de colarinho branco de competência da Justiça Federal, por força da Lei 7.492/86).

Vem a pergunta: Que razões levam à competência da Justiça Federal de primeira instância (que se encerra quando houver investigação envolvendo parlamentar federal, quando então a competência será do Supremo Tribunal Federal), para investigar, instruir e julgar?

Dir-se-á que há outros crimes conexos, de competência da Justiça Estadual, cometidos. Como definir a competência?

Sabe-se que a Petrobras é uma sociedade de economia mista e a competência para instruir e julgar crimes contra ela cometidos é da Justiça Estadual. Como disse Eugênio Pacelli (Curso de processo penal, 16ª edição, pág. 222), tanto a competência da Justiça Federal quanto a da Estadual são fixadas constitucionalmente, daí porque se constituem ambas, no juiz natural para os crimes federais e para os crimes estaduais, respectivamente. A opção pela reunião dos processos pode ser explicada pela necessidade de preservar o princípio da unidade e coerência das decisões judiciais.

Não se pode desmembrar fatos, que estejam associados por uma rede probatória lógica, em verdadeira cadeia, formando uma conexão lógico-probatória, uma conexão instrumental.

O Ministro Barroso, dado a teses proativas em matéria constitucional, não pode fazer o mesmo numa disciplina onde vigora a sistemática jus-racionalista positivista, própria do neo-kantianismo, onde se vê na teoria do processo penal.

Certos argumentos não fazem sentido, como o do ministro Dias Toffoli (foto), que diz que a maior parte dos crimes de lavagem de dinheiro e falsidade ideológica foram cometidos em São Paulo, o que justificaria a atração de todos os processos para a Seção Judiciária do Estado de São Paulo, “ressalvada a apuração de outras infrações conexas que justifiquem conclusão diversa quanto ao foro competente”.
A chamada conexão na fase preliminar investigatória nada mais é que uma forma de conexão instrumental, quando se dá a reunião dos inquéritos, na Polícia, com o objetivo de obter a verdade real e a melhor forma de acompanhar a investigação.

O ministro Teori Zavascki apontou que os trechos que envolvem a petista não mostram “relação imediata” com as investigações em andamento sobre corrupção na Petrobras, que ficam sob sua relatoria. Já a PGR sustenta que repasses passaram pela conta do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari, o que reforça a conexão com o esquema investigado na Operação Lava Jato. A situação da Senadora Gleisi Hoffman, segundo a vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko, que assinou a peça encaminhada ao STF, “mostra “liame mínimo de conexão dos pagamentos de valores envolvendo as propinas da Petrobras ‘administradas’ pelo ex-tesoureiro do PT, João Vaccari, e estas envolvendo a Consist”.

É muito estranho que quando a investigação chega próxima a uma auxiliar, próxima à presidente da República, na Casa Civil, o Supremo Tribunal Federal venha intervir modificando entendimento de competência na matéria.

Ora, se há esse liame mínimo de conexão dos pagamentos de valores envolvendo as propinas da Petrobras, que eram administradas pelo ex-tesoureiro do PT investigado, então seria hipótese de manter a competência para acompanhar e fazer a supervisão ministerial, o Ministro Zavascki, data vênia. Haveria, pois, uma hipótese de conexão instrumental ou probatória(artigo 70, III, CPP).

Em sede de primeira instância, esse desmembramento, envolvendo condutas ilícitas na Eletronuclear etc, poderá levar a investigação para outra Vara Federal.

Na verdade, o que se investiga não é apenas as condutas ilícitas ocorridas na Petrobrás, mas, mais do que isso: a compra de apoio politico-partidário pelo governo federal, por meio de propina institucionalizada nos órgãos públicos. Isso tem nexo probatório, liame probatório, instrumental, a persistir na tese da conexão, e levar a prevenção no juízo que preside todas as investigações desde o inicio, seja em sede de primeiro grau, ou ainda nas instâncias superiores (STJ e STF).

Ademais leve-se em conta o crime principal, corrupção, e não o secundário, que surge apenas porque havia o principal, ou seja, o de lavagem de dinheiro. O que deve ser levado em conta `” é a origem do dinheiro desviado” e não onde ele foi lavado. Isso não foi levado em conta no julgamento.

Ademais, data vênia, se havia incompetência, seria caso de junto ao Tribunal Regional Federal da 4º Região, ser suscitado uma exceção(não objeção) de incompetência, alegando-se que não havia conexão (forma de modificação de competência), algo que, naquele momento não poderia a Corte Suprema se arvorar em fazer.

Assim, “mensalão”, “petrolão”, desvio da Eletronuclear estão dentro de um contexto de uma mesma organização criminosa. No ápice dessa sinistra organização estão pessoas e partidos e o que a investigação tem revelado é que estão ligados à Casa Civil do governo Lula (2003-2010), sob o comando inicial do investigado José Dirceu.

Com esse entendimento externado no Supremo Tribunal Federal está aberto o caminho para anulação dos processos que, porventura, envolvam as condutas na Eletronuclear e outras não diretamente envolvendo ilícitos causados à Petrobras, por incompetência absoluta do juízo e com isso a anulação de todos os atos decisórios, como prisões etc.

POR FREDERICO VASCONCELOS

FOLHA DE SÃO PAULO

CF: A consequência previsível são os advogados suscitar a nulidade dos atos praticados pelo Juiz Sérgio Moro gerando incidentes, que vão procrastinar o final do processo apostando a eternização dos feitos para alcançar a prescrição; a maioria dos réus estão acima da faixa dos 60 anos de idade.

Com o desprezo da conexão se fulminou o princípio da economia processual em benefício da mansa morosidade judicial.

O que se projeta é um cenário em que o tempo, senhor da razão, mostrará um final feliz para a impunidade.

Vamos torcer para estar errado nessa previsão.

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