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Análise de contratos atípicos de Vendor pelo STJ

Recentemente foi julgado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) um recurso especial envolvendo matéria de alta relevância jurídica para o segmento do mercado bancário, que certamente sentirá os imediatos reflexos do posicionamento adotado pela 4ª Turma.

Discutiu-se, nos autos do Recurso Especial nº 1.309.047/MT, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, acerca da exequibilidade ou não dos conhecidos contratos de vendor. Originariamente a execução proposta pela credora contra a devedora havia sido extinta por supostamente não estar embasada em título líquido, certo e exigível, acompanhando posicionamentos anteriores da jurisprudência no sentido de não ser o contrato de vendor um título executivo, mas a turma houve por bem reformar o acórdão que manteve inalterada a sentença, afastando a extinção por inexequibilidade por ela decretada.

O contrato de vendor é um contrato bancário atípico que tem por finalidade o financiamento de vendas. Por meio desse instrumento, a vendedora, cliente do banco, contrata uma operação de crédito em favor da compradora, com quem mantém relação comercial, garantindo o adimplemento da obrigação por esta última. É uma operação vantajosa para ambas as partes, já que a vendedora verá suprida sua necessidade de reposição de capital de giro, além de ser contemplada com evidente benefício fiscal decorrente do faturamento à vista; e a compradora terá a oportunidade de contratar financiamento a prazo com taxas atrativas.

Assim é que dele nascem obrigações particulares e distintas para cada uma das partes, na medida em que a vendedora transferirá crédito à instituição financeira que, mediante taxa de administração, lhe pagará o valor de venda à vista; e a instituição financeira financiará a compradora, que lhe pagará o valor da venda com os acréscimos decorrentes do prazo concedido.

No recurso objeto de apreciação pelo Superior Tribunal de Justiça, verificou-se, no contrato de vendor que embasou a ação executiva, a existência de informações precisas acerca do valor financiado, taxa de juros, forma e data de pagamento, além de outras cláusulas e condições do negócio. Somou-se a isso o fato de estarem os autos igualmente instruídos por planilhas de financiamento que indicavam de maneira inconteste que as notas fiscais ali relacionadas correspondiam a operações realizadas entre a financiada e a vendedora-garantidora, devidamente assinadas por ambas as partes.

Como bem destacou o ministro Sidnei Beneti em seu voto, “no caso, não se põe em dúvida a emissão válida dos títulos de crédito decorrentes do contrato de ‘Vendor’. Até onde foi o acórdão, discutiu-se tão somente a validade do próprio contrato de ‘Vendor’ – sem chegar à análise de cada operação titulada em decorrência desse contrato. (…) Tem-se, pois, fundamento cartular suficiente ao aparelhamento da execução por título executivo extrajudicial”.

Neste caso, portanto, em que os instrumentos de crédito não deixam dúvidas acerca dos valores – fixos e determinados – envolvidos nas operações mercantis efetivadas entre a vendedora e a financiada inadimplente, a outra conclusão não se chega senão a de que tais títulos ostentam os requisitos legais que os enquadram no conceito de título executivo extrajudicial, a teor do que dispõe o art. 585, II, do Código de Processo Civil.

Sendo o contrato de vendor um contrato “guarda-chuva”, que dá ensejo ao nascimento de outros negócios jurídicos dele derivados, e, tratando-se a ação originária de execução das notas promissórias vinculadas a tais outros negócios jurídicos, percebe-se com tranquilidade a existência de certeza e liquidez aptas a legitimar a execução proposta.

O recente posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, no entanto, não deve ser aplicado indistintamente a todos os negócios jurídicos envolvendo vendor, afirmando-se sem a devida cautela que todos estes contratos podem ser considerados títulos executivos. Deve ser levado em consideração o fato de que o financiamento pode vir a ser obtido por meio da abertura de crédito rotativo ou mediante a inclusão de cláusula-mandato inserida no próprio contrato de vendor, o que faz ressurgir a discussão acerca da exequibilidade do título por ausência de certeza e liquidez.

É imprescindível que a pretensão de utilização da via executiva pelo credor-garantidor seja meticulosamente analisada caso a caso, na medida em que a conclusão quanto à viabilidade da medida dependerá das condições específicas do financiamento e dos respectivos documentos, que deverão ser aptos a demonstrar a liquidez e certeza do crédito cuja recuperação é buscada.

Patrícia Dabus Buazar Ávila é advogada sênior do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

 

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