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O espírito de justiça e a nudez do rei Gilmar Mendes

Gilmar Mendes disse que, para tomar suas decisões jurídicas, jamais levará em conta a opinião do homem da esquina.

Nesta quinta-feira fiz duas palestras sobre [b]ditadura x direitos humanos[/b], na Faculdade de Direito de Sorocaba, interior paulista.
Fui lá a convite do Centro Acadêmico. E percebi o de sempre: cidadão que pegou em armas contra o regime militar continua sendo encarado com desconfiança (para não dizer hostilidade contida) por alguns [i]pilares da comunidade[/i].
Mas, os jovens não têm tais prevenções. Alguns até haviam escutado as falácias das [i]viúvas da ditadura[/i] a respeito dos resistentes. Só que não lhes dão crédito absoluto: vêm me perguntar se são ou não expressão da verdade. E tiram suas conclusões.
Voltei para casa de táxi, cortesia dos organizadores do evento. E o motorista, nordestino e falante, veio discorrendo com muita propriedade sobre religiões.
Lá pelas tantas, ele me disse que toda pessoa, no íntimo, sabe o que é certo e o que é errado.
Comentei que Platão, há milênios, constatou o mesmo, ao se referir ao espírito de justiça que nos é inerente. Ele ignorava a frase célebre.
Fiquei matutando sobre isso. Como o homem comum, na era da internet, passou a confiar mais no resultado de suas reflexões, em vez de acatar bovinamente a posição das autoridades e [i]otoridades[/i].
Este vem sendo meu grande trunfo nas batalhas de opinião pública dos anos recentes: a que travei por minha anistia de ex-preso político e a que estou travando pela liberdade de Cesare Battisti.
Sempre que consegui tornar a verdade acessível e compreensível para quaisquer cidadãos, obtive retorno.
É até uma reação previsível, face à terrível desmoralização das nossas instituições.
Gilmar Mendes disse que, para tomar suas decisões jurídicas, jamais levará em conta a opinião do homem da esquina.
Ele se considera o sacerdote que detém o monopólio da interpretação da palavra divina, então está se lixando para o que qualquer [i]zé mané[/i] pense.
Não lhe caiu ainda a ficha de que o  [i]zé mané[/i]  também está se lixando para a pretensão de infalibilidade dos doutos. Já não engole que os estudados e os togados estejam sempre certos. Quer que lhe apresentem argumentos, não diplomas, títulos e cargos.
Então, o [i]zé mané[/i] sabe que Sarney era, sim, culpado das acusações que lhe foram feitas. E deveria, sim, ter sido expelido da presidência do Senado.
Erro crasso do PT é privilegiar o placar oficial e esquecer o moral. Salvou Sarney por meio a zero. Moralmente, o placar foi de 10 x 0… contra. As consequências virão, com o tempo.
No mesmo dia, Gilmar Mendes, como relator, conduziu o Supremo Tribunal Federal à decisão que interessava ao Poder: isentar Antonio Palocci de uma culpa que salta aos olhos e clama aos céus.
Linguajar pomposo à parte, o que ele alegou foi:
1. o então ministro da Fazenda Palocci sofreu acusação vexatória do caseiro Francenildo;
2. Palocci era a pessoa mais interessada, no Brasil inteiro, em desacreditar Francenildo;
3. Palocci detinha autoridade [i]de fato[/i] sobre o então presidente da Caixa Econômica Federal;
4. o presidente da CEF não tinha motivo real nenhum (o que alegou foi risível) para interessar-se pessoalmente pela movimentação bancária de Francenildo, dentre os milhões de correntistas da instituição;
5. o presidente da CEF requisitou os dados e os levou até a casa de Palocci;
6. por uma [i]feliz coincidência[/i], lá estava também um assessor de imprensa;
7. Palocci leu;
8. o assessor distribuiu à imprensa;
9. mas, não há como provar que foi Palocci quem pediu que os dados lhe fossem mostrados, nem que ele tivesse ordenado ao assessor para divulgá-los, já que os outros dois não admitiram isso;
10. então, o único que cometeu um delito foi o ex-presidente da CEF.
Para quem passou da idade de acreditar em Papai Noel, fada dos dentes e saci-pererê, essa insólita reunião na casa de Palocci foi obviamente tramada para produzir o resultado que produziu. E a ligação entre os personagens secundários só aconteceu porque foram convocados pelo personagem principal.
Ademais, mesmo ao [i]zé mané[/i] mais crédulo ocorreria a pergunta que não quer calar: se dar conhecimento a terceiros de dados sigilosos que se detém em função do cargo ocupado é crime, como um ministro de Estado pôde testemunhar o crime cometido pelo presidente da CEF sem tomar providência nenhuma contra seu autor?
Outra: se Palocci, não sendo um [i]zé mané[/i], estava ciente de que o presidente da CEF não tinha o direito de lhe revelar a movimentação bancária de Francenildo, por que não procedeu como um homem honrado faria, recusando-se a ler o que lhe era ilicitamente oferecido?
Enfim, com malabarismos e interpretações tortuosas pode-se criar a ilusão de que a conduta de Palocci não feriu a letra da Lei, só o alfabeto completo da ética. Mas, o espírito de Justiça continuará levando cada  [i]zé mané[/i]  a concluir, corretamente, que tanto o mandante quanto o segundo pau mandado também eram culpados.
É por essas e outras que, explicando as coisas direitinho às pessoas, evitando que sejam enroladas pela linguagem cifrada dos doutos, conseguimos resultados surpreendentes.
Como o de, a partir da internet, equilibrarmos a batalha de opinião em torno do destino de Cesare Battisti, apesar da extrema tendenciosidade da imprensa burguesa.
Temos o espírito de justiça ao nosso lado. E, cada vez mais, a conquista dos corações e mentes é que determinará o desfecho dos episódios.
Pois até o homem da esquina está enxergando a nudez dos reis, nesta fase deplorável de nossa história republicana.
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* Jornalista e escritor, mantém os blogues:
[url=http://naufrago-da-utopia.blogspot.com/][b][color=#004a69]Náufrago da utopia[/color][/b][/url] e [url=http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/][b][color=#004a69]O Rebate[/color][/b][/url]

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