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Min. Herman Benjamin: Juízes devem entender que ética não é só para terceiros

E enquanto o tema ética judicial não integrar o caderno de perguntas do concurso para juiz, os cursinhos não vão colocar a matéria em sua grade curricular. Quem se preocupa com esta questão é do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Herman Benjamin (foto).

“Nós juízes precisamos entender que o discurso da ética não é apenas para terceiros, o que vale para as outras instituições, vale para nós também”, afirmou.

O ministro, que também é corregedor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sugere que o curso de ética deveria abranger temas do dia-a-dia, como por exemplo, como o juiz deve lidar com as mídias sociais. Segundo ele, o juiz que utiliza a mídia social para tratar de questões concretas de processos, cria um problema muito sério para a magistratura.

“Não deixa de ser impressionante e preocupante que os cursinhos preparatórios para concursos de juízes tenham matérias que vão desde o direito romano até as tendências do direito, mas não se diz uma palavra sobre ética judicial”, criticou.

Em entrevista à imprensa, Benjamin ressaltou ainda que a discussão sobre combate à corrupção tem contribuído para a melhoria da imagem do Poder Judiciário. Segundo ele, antes, a questão não recebia a devida importância, o que fazia com que o judiciário fosse visto como leniente.

“Hoje, de uma maneira geral, o judiciário responde a essas questões, não digo de uma forma ótima, mas vem respondendo a essas questões da corrupção”, opina.

Leia a entrevista com o ministro Herman Benjamin:

Há alguns casos tramitando na Justiça contra alguns ministros do STJ. Como o senhor avalia esta fase pela qual o tribunal está passando?
Eu não vou falar do STJ, mas o que nós temos que entender é que a ética permeia e deve permear todas as instituições do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Por isso que, no que se refere ao Judiciário, nós temos o CNJ e uma série de mecanismos como as corregedorias e, para os casos mais graves de desembargadores, temos o STJ. Nós como juízes temos que entender que esse discurso da ética não é apenas para terceiros, o que vale para as outras instituições, vale para nós também. Por isso que a Enfam (Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento dos Magistrados) está em um processo de reforma. Precisamente para, junto com as escolas de magistratura do país inteiro, investir na capacitação dos juízes sobre os aspectos éticos da jurisdição.

O tema ética deve ser tratado num momento anterior da carreira?
Não deixa de ser impressionante e preocupante que os cursinhos preparatórios para concursos de juízes tenham matérias que vão desde o direito romano até as tendências do direito, mas não se diz uma palavra sobre ética judicial.

Tal a centralidade do concurso público hoje no Brasil, se a ética judicial não integra o caderno de perguntas da prova, os cursinhos não irão colocar essa matéria na sua grade curricular. E, mais preocupante ainda, é que as próprias escolas da magistratura fazem cursos sobre tudo, mas não têm, por exemplo, cursos específicos periódicos sobre ética judicial.

Digo ética judicial numa perspectiva mais ampla, para incluir temas novos, por exemplo, para incluir o juiz e as mídias sociais. Porque o juiz tem que entender que a nossa profissão traz belíssimas oportunidades, mas também restrições. Isso tem que ser explicado não só na escola da magistratura. Antes dos cursos também.

O senhor pode citar algum exemplo de como o uso das mídias sociais pode prejudicar o Judiciário?
Sem dar exemplos concretos, nós temos casos de juízes que utilizam a mídia social para tratar de questões concretas de processos. Tudo isso, quer dizer, eu como não uso a mídia social, não sei dar exemplos concretos. Mas isso cria um problema muito sério para a magistratura.

Qual é o papel das escolas da magistratura ao tratar desta questão?
Tudo isso exige um trabalho pelas escolas da magistratura no sentido de orientar, informar e no sentido até mesmo de capacitar o juiz para se comportar adequadamente. É uma questão até de comportamento. Eu não vejo as escolas da magistratura trabalhando neste sentido sobretudo em relação ao juiz que acaba de ingressar na carreira, que não fez ainda uma transição e se sente tão livre como antes do concurso. Isso causa problemas para a instituição como um todo em termos de imagem e o Judiciário brasileiro vive da sua imagem. Ao contrário de Judiciários como o dos Estados Unidos, em que os juízes são eleitos, um sistema que eu não quero para o nosso país, a nossa legitimidade depende de duas coisas: da norma constitucional, que diz  que o acesso ao cargo se dá por concurso público, e de uma imagem positiva do Judiciário.

Qual é a imagem do Judiciário hoje?
É difícil dizer a imagem como um todo porque teria que categorizar. A Justiça do Trabalho, por exemplo, tem uma imagem, enquanto a Justiça penal tem outra. Mas, de uma maneira geral, as pessoas vêem o judiciário como uma instituição com menos defeitos do que as outras. É uma das instituições, e as pesquisas demonstram, mais respeitadas. Acho que o tema do combate à corrupção tem contribuído muito para a melhoria da imagem do poder Judiciário. No passado, ele era visto como leniente com a corrupção. Não por opção, mas porque não se dava a devida importância a essa questão. De maneira geral, com exceções nos estados, a percepção é a de que o Judiciário hoje responde a essas questões envolvendo a corrupção.

O aumento na demanda de processos demonstra esse respeito ao Poder Judiciário?
A curva do acesso à Justiça no Brasil é crescente. Fala-se inclusive que o Brasil é campeão de judicialização. Não é verdade. No Brasil, se fizermos não só uma análise quantitativa, mas uma análise qualitativa, nós vamos verificar que o percentual das corporações acionando os indivíduos é muito maior do que o percentual dos indivíduos acionando as corporações. A judicialização no Brasil não é como a de uma cidadania “hiperjudicializada”. Não é isso. São as instituições financeiras, as telefônicas, e o próprio Estado que mais figuram como autores.

Então, infelizmente nós não temos feito essa radiografia de maneira correta. Você pega o número lá, divide tudo aquilo pelos 208 milhões de habitantes, e comparativamente, em termos proporcionais, vê que cada brasileiro tem o triplo de processos do que os noruegueses, os americanos. Se fizermos outra análise, vamos descobrir que embora se tenha aumentado a procura das dos cidadãos, essa esmagadora maioria de processos é das corporações e do próprio Estado contra os indivíduos.

Por Livia ScocugliaBrasília

livia.scocuglia@jota.info

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