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De olho na impunidade

O novo presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, propôs ontem, ao assumir a direção da entidade

O novo presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, propôs ontem, ao assumir a direção da entidade, em solenidade de posse realizada no Centro de Convenções Brasil 21, em Brasília, a criação de um Observatório da Corrupção, com vistas ao monitoramento de todas as denúncias que se encontram em análise pelo Judiciário brasileiro. Como adiantou em entrevista ao Jornal do Commercio publicada ontem, promover o combate ostensivo à impunidade, principalmente nos crimes de colarinho branco, é uma de suas principais metas para os três anos de gestão que terá à frente da instituição, que representa mais de 700 mil advogados em todo o País.
Para isso, Cavalcante convocou as seccionais e subseções da Ordem para que, juntamente com o Conselho Federal, possam municiar com informações necessárias e fazer funcionar esse observatório. O objetivo dessa iniciativa é cobrar das autoridades a conclusão dos processos que envolvam casos de corrupção. A corrupção é uma de nossas maiores tragédias. Dinheiro em meias, em cuecas, em bolsas, oração para agradecer a propina recebida. Essas são anomalias inconcebíveis, que demonstram total subversão de valores por parte dos que deveriam dar o exemplo. As imagens falam por si, sim, mas expressam ainda um autismo revoltante, já que falam apenas para si, sem qualquer conseqüência penal para os infratores, que continuam em seus cargos e cinicamente ainda perdoam os que contra eles protestam. Precisamos pôr um fim à impunidade, disse.
Na posse de ontem, o vice-presidente José Alencar representou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Gilmar Mendes, e o presidente da Câmara, Michel Temer, também estiveram presentes, entre outras autoridades.
De acordo com Cavalcante, nenhuma ameaça é maior à democracia, às conquistas do Estado democrático de Direito e ao resgate da dívida social que a perversa associação entre corrupção e impunidade. A ela chegamos não por falta de leis, mas talvez por excesso. O incontável número de leis processuais, que permitem que um mesmo processo obtenha inúmeros graus recursais e acabe prescrito pelo tempo, beneficia apenas o topo da pirâmide social. Não funciona para o cidadão comum, que, além de não conhecer a lei, tem, quando tem, precário acesso à Justiça, defendeu.
Cavalcante destacou a importância desta campanha, principalmente em ano eleitoral. Esse é o momento propício a uma reflexão profunda sobre o que nos tem acontecido nestas duas décadas e meia de redemocratização. Reconquistamos liberdades formais, essenciais, sem dúvida, mas que não se refletem ainda em melhoria substantiva na qualidade de vida da maioria da população, disse o advogado, que criticou práticas como a do assistencialismo por parte de muitos políticos. Precisamos de cidadãos integrais, sãos, em condições de participar plenamente da política, não como massa de manobra, mas senhores de seu destino, fiscais efetivos de seus eleitos, acrescentou.
O advogado reconheceu as ações já empreendidas no combate à corrupção, no entanto destacou a necessidade de estas produzirem mais resultados. Por essa razão, ele afirmou que é preciso avançar mais, inclusive com a revisão da legislação infraconstitucional e processual. Não se trata de suprimir a ampla defesa, sem a qual não há justiça, mas, sim, de impedir que, a seu pretexto, se protele a justiça, eliminando-a. Também não se trata de simplesmente inverter o que aí está, levando a falta de justiça que há embaixo para o topo da pirâmide. Trata-se de levar justiça a todos, nos termos do que determina o artigo 5º da Constituição, de que todos são iguais perante a lei.
O novo presidente da Ordem afirmou que este tema – combate à corrupção – preocupa a entidade, pois esta não se posiciona apenas em questões corporativas.
Segundo Ophir, a impunidade, sobretudo nos casos de corrupção, traz consequências danosas para os diferentes setores da vida brasileira. Os poderes constituídos precisam assumir suas responsabilidades diante desse quadro, e há várias ações simultâneas a serem criadas, cujo objetivo único pode ser resumido naquela Constituição que Capistrano de Abreu, há mais de um século, sugeriu para o Brasil. Artigo 1º: Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. Artigo 2º: Revogam-se as disposições em contrário. Vergonha na cara. Eis a receita básica de nossa emancipação. Somente com ela, e a partir dela, poderemos considerar a República efetivamente proclamada, disse.
Cavalcante defendeu uma profunda reforma do atual sistema político, não limitada à revisão do sistema eleitoral, mas ampliada a outros setores da administração, com o objetivo de sanear uma das piores mazelas do setor público, que é a distribuição política de cargos. Ele também sugeriu o financiamento público de campanhas e a inclusão, no currículo escolar, da disciplina Ética.
Precisamos sanear esse ambiente, hoje irrespirável. Precisamos cuidar da ecologia política, mudando o perfil dos agentes públicos, que hoje respondem pela quase totalidade da emissão do gás venenoso da corrupção, afirmou.
Não basta, porém, punir, embora seja indispensável fazê-lo. É preciso que, paralela e simultaneamente, haja um grande esforço no contexto educacional para reverter esse quadro. É preciso inserir no currículo escolar a disciplina da Ética, mais especificamente da Ética Pública. Mais que uma ciência, ética é um sentimento, a percepção do que é certo e do que não é; do que tem de ser feito e do que deve ser evitado. Só poderá defender a integridade e a moralidade quem internalizar esses valores, acrescentou.
Cavalcante foi eleito por voto de 79 dos 80 conselheiros que participaram do pleito realizado na noite de domingo, na sede da Ordem. Apenas uma pessoa não votou. O advogado foi candidato único pela chapa Por uma Advocacia Forte. Junto com ele, tomaram posse os demais integrantes da diretoria do Conselho Federal: Alberto de Paula Machado (vice-presidente), Marcus Vinicius Furtado Coelho (secretário-geral), Márcia Regina Machado Melaré (secretária-geral adjunta) e Miguel Ângelo Sampaio Cançado (diretor-tesoureiro).
Em seu discurso de despedida, o antecessor de Cavalcante na Presidência da OAB, Cezar Britto, fez um balanço de sua gestão e destacou o combate ao que chamou de mercantilização do ensino. Necessário se fez o combate à fome e à ganância dos empresários que mercantilizaram o ensino jurídico. Há exatos dois anos estamos sem a criação de um curso de Direito sequer no País, lembrou.

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