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Lei de improbidade administrativa exige demonstração concreta de lesão, dolo e má-fé

Servidores do Bacen atuaram no mercado financeiro durante licença não remunerada antes da inclusão do exame de ausência de conflito de interesse no Manual de Serviço do Pessoal do Bacen (MSP), motivo pelo qual a ação civil pública foi julgada improcedente

A Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento a uma apelação ajuizada pelo Ministério Público Federal em ação civil pública para a apuração de conduta ímproba de servidores do Banco Central do Brasil (Bacen). Durante o período de licença sem remuneração para tratar de interesses particulares, eles teriam exercido atividades profissionais em entidades privadas do setor financeiro, em conflito de interesses com a administração pública.

A desembargadora federal Alda Basto, relatora do acórdão, declarou que a imputação de conduta ímproba é eminentemente fática, devendo ser apontada a prática de ato específico por parte do agente para restar configurada a improbidade. Isso significa dizer que deveria ter sido apontado, no caso concreto, fato a partir do qual teria derivado lesão à Administração, tráfico de influência ou outra violação aos deveres funcionais, possibilitando a aplicação das penalidades da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), “sendo descabida a imputação in abstrato de condutas potencialmente violadoras da probidade administrativa perpetrado no período das licenças”.

Segundo ela, a Lei 8.429/92 define três tipos de improbidade: atos que importam em enriquecimento ilícito (artigo 9); atos que causam prejuízo ao erário (artigo 10); e atos que afrontam os princípios da administração pública (artigo 11). Além disso, é essencial a presença do dolo, caracterizado pela conduta consciente e intencional.

Assim, “para a punição do agente público corrupto e desonesto, bem como do particular que com ele atua, impõe-se a constatação, conjunta, de que a prática do ato de improbidade foi consciente, decorrente de uma conduta antijurídica, associada ao dolo e à má-fé. Sem a prova robusta desse comportamento, não se pode falar em improbidade administrativa”.

A desembargadora considerou, ainda, que, à época dos fatos, a concessão das licenças não remuneradas para atuação no mercado financeiro junto a instituições privadas era admitida pelo Bacen, sendo expressa a proibição aos servidores em efetivo exercício “a prestação de serviços, ainda que eventuais, a empresa cuja atividade é controlada ou fiscalizada pelo Banco Central do Brasil, salvo os casos de designação específica”.

O entendimento foi modificado em agosto de 2006, quando foi incluso o exame de ausência de conflito de interesse no Manual de Serviço do Pessoal do Bacen (MSP), como requisito para a concessão da licença para tratar de interesses particulares, consoante entendimento exarado no parecer 120/2006 e no parecer 243/2007 de Procuradoria-Geral do Bacen. Assim, para a concessão das futuras licenças, a autarquia deveria efetivamente considerar a compatibilidade da atividade particular a ser eventualmente exercida pelo servidor no período de gozo de licença não remunerada com o cargo por ele ocupado no Bacen.

Portanto, “a mudança procedimental deriva de nova interpretação no âmbito da Autarquia, cuja aplicação retroativa em prejuízo do servidor é vedada não só em razão dos princípios gerais norteadores do Direito, como à vista do teor insculpido no artigo 2º da Lei 9.784/99”, concluiu a desembargadora.

Assim, ela considerou que não procede o argumento de que os servidores “estariam se aproveitado da ausência de fiscalização ou controle do Bacen quanto às atividades desempenhadas durante o gozo da licença para tratar de interesses particulares, dedicando-se a atividades no setor privado do Sistema Financeiro”, pois era “inequívoca a ciência e anuência da instituição quanto aos pleitos das licenças apresentados pelos funcionários e ao escopo a que destinavam”.

A desembargadora também afirmou que o salário auferido em razão do desempenho de atividades privadas, durante o gozo de licença não remunerada do cargo, não caracteriza enriquecimento ilícito, uma vez inexistir efetivo exercício da função pública e percepção cumulativa de vencimentos.

Portanto, a Quarta Turma do TRF3 concluiu que “apesar de não ser endossável, lato sensu, a conduta dos agentes públicos que se afastaram de seus cargos junto ao Bacen para atuar no mercado financeiro privado, pois a priori incompatível com a função pública desempenhada, mesmo no gozo de licença para tratar de interesses particulares, restou demonstrada a ação dos requeridos em conformidade aos regramentos à época vigentes (Lei 8.112/90, Lei 9.650/98, Portaria Bacen/Secretaria Executiva 35.817/2006) e mediante anuência da autarquia, em evidente boa-fé, não sendo possível considerar o grau de reprovação da conduta na seara ética como prova inequívoca de dolo e má-fé para fins de configuração de improbidade administrativa”.

Apelação cível nº 0020625-54.2009.4.03.6100/SP

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