Uma manobra jurídica poderá devolver a boa parte das 5.559 câmaras municipais brasileiras o número de cadeiras perdidas nestas eleições em razão da resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – que fixou a regra de um vereador para cada 47.619 habitantes, reduzindo 8.528 vagas em todo o País. Ao baixar a resolução, o TSE determinou que até 1º de junho deste ano as câmaras deveriam aprovar leis orgânicas regulamentando a nova composição. O problema é que várias delas não cumpriram a determinação do TSE e agora se valerão da falta de legislação para tentar manter o número anterior de vereadores.
Cinco municípios já preparam suas ações judiciais: Coromandel (MG), Ouro Preto do Oeste (RO), Carazinho (RS), Parnamirim (RN) e Luziânia (GO). As ações serão ajuizadas na Justiça local e solicitarão a diplomação dos vereadores eleitos com base na lei orgânica vigente no município e não na regra do TSE. Essas câmaras perderam entre três e seis vereadores.
A alegação judicial é de que o artigo 29 da Constituição Federal, no inciso IV, diz que o número de vereadores será estabelecido a partir de “lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal”. Há ainda o artigo 30, que dá aos municípios a prerrogativa de legislar sobre assuntos de interesse local.
“Não é função do TSE definir composição de câmaras municipais. A interpretação dos juízes locais pode ser diferente do TSE e vamos acionar a Justiça. Onde não formos vitoriosos, vamos recorrer e, se preciso, iremos até o Supremo”, afirmou na segunda-feira o presidente da Associação Brasileira das Câmaras Municipais (Abracam), Rogério Rodrigues Silva (PDT), eleito este ano para o quinto mandato.
As ações dos cinco municípios que já decidiram recorrer à Justiça, de acordo com o vereador, devem ser ajuizadas até o final desta semana. A Abracam também está orientando várias outras a fazer o mesmo. No entanto, ele alerta que as cidades que aprovaram a lei orgânica reduzindo o número de parlamentares não têm como recorrer à Justiça.
Perda de tempo
O advogado especializado em direito municipal e presidente do Instituto de Direito Municipal (IDM), José Nilo de Castro, reconhece que o argumento jurídico utilizado pelas câmaras municipais é valido, mas ele considera que acionar a Justiça será perda de tempo. “O que o TSE fez foi uma intervenção na autonomia dos municípios, mas com base em uma decisão do Supremo. Ou seja, quem violou a Constituição é que vai acabar tendo que rever a sua decisão”, analisa.
Até que o assunto seja novamente discutido no STF, as câmaras poderão aumentar novamente o número de vereadores caso algum juiz aceite a ação judicial. Para que instâncias superiores atuem, é preciso que sejam provocadas. Dessa forma, caberia ao Ministério Público de cada comarca ajuizar ações civis públicas cobrando o cumprimento da resolução do TSE – explica o promotor eleitoral Thales Cerqueira.
“A reivindicação das câmaras é até válida, mas não se pode desconhecer que o Judiciário também é um poder e controla a constitucionalidade das leis”, pondera. O promotor argumenta ainda que a Constituição Federal permite a atuação do Judiciário no caso de omissão do legislador (o que seria representado pela falta da nova lei orgânica). A própria resolução do TSE diz que no caso da não-aprovação da lei nos municípios, valeria a regra imposta pelo órgão.
Para o advogado José Nilo de Castro, não está claro de quem seria a competência para decidir o assunto: a Justiça local, o próprio TSE ou o Supremo. Ainda assim, ele lembra que o registro de candidaturas e as eleições para as câmaras foram feitos com base na resolução do TSE. Uma decisão diferente agora, poderia gerar divergências em relação às eleições feitas no mês passado.