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Não existe protecionismo da Justiça a favor dos devedores

Após anos de aplicação de uma política econômica de viés ortodoxo, sem resultados muito alentadores, a nova palavra de ordem dos economistas de plantão é a chamada “instabilidade jurisdicional”.

Após anos de aplicação de uma política econômica de viés ortodoxo, sem resultados muito alentadores, a nova palavra de ordem dos economistas de plantão é a chamada “instabilidade jurisdicional”.

Segundo tais economistas, arrumada a casa (sic) no plano macro-econômico, o Brasil precisa agora de reformas micro-econômicas, de forma a reduzir a chamada “instabilidade jurisdicional”.

Trata-se de um conjunto de medidas cujo objetivo declarado é reduzir o custo do crédito (leia-se: reduzir os juros) e atrair investimentos, através de um arcabouço jurídico que garanta de forma eficiente o cumprimento dos contratos e a segurança das relações jurídicas. Segundo os difusores dessa nova tábua de salvação, nossas leis e nossa Justiça protegem demais os devedores, causando insegurança e desestímulo a investimentos.

Exemplo de tais “microrreformas” são a nova lei de falências — cuja principal tônica é privilegiar, ainda mais, os credores, notadamente os bancos, em desfavor dos empregados — e o crédito mediante desconto em folha de pagamento — no qual o mutuário assina autorização “irrevogável” para desconto em seu salário das parcelas de pagamento do empréstimo empregado, tudo com a chancela dos sindicatos.

Mas será verdade que existe essa “instabilidade jurisdicional”, esse protecionismo dos devedores contra os credores? Ou será que o assunto está sendo mistificado, distorcido, usado como argumento “ad terrorem” pelos bancos e seus defensores, para conseguir a aprovação de leis ainda mais draconianas contra os pobres mortais que tomam empréstimos ou compram a prazo?

Um esforço de memória faz lembrar que continuam em vigor no Brasil algumas leis que nada tem de protecionistas; ao contrário, parecem ter sido redigidas na própria Febraban – Federação Brasileira de Bancos –, tal o caráter sumário dos procedimentos e o cerceamento que impõem à defesa dos supostos devedores.

A execução extrajudicial, flagrantemente inconstitucional, é o exemplo mais gritante de procedimento em que se dispensa até a intervenção da Justiça para a execução de dívidas e de suas garantias.Também a alienação fiduciária com possibilidade de prisão do devedor (cuja constitucionalidade ainda é discutida), recentemente introduzida também para financiamento de compra de imóveis.

E a Justiça, seria mesmo paternalista, protegendo os devedores contra os gananciosos bancos? Ora, quem advoga sabe que ainda é majoritária a mentalidade de que os bancos são instituições idôneas e infalíveis, e que os que se recusam a pagar aquilo que lhes é cobrado não passam de caloteiros contumazes. Uma planilha de cálculo de um banco, ao menos na Justiça paulista, goza, praticamente, de presunção “juris tantum”.

Mas não é só: quem não se lembra da histórica (e vergonhosa) decisão do Supremo Tribunal Federal de ignorar o agora revogado parágrafo 3o do artigo 192 da Constituição Federal, quando a leitura de seu texto (certo ou errado, não cabe aqui discutir) não deixava nenhuma dúvida quanto à sua aplicabilidade.

E da facilidade com que se concedem liminares “inaudita altera parte” em ações de reintegração de posse de veículos em contratos de leasing. Basta a alegação do credor sobre a mora do devedor, sem necessidade de nenhuma prova bilateral a respeito, para que se determine que o veículo deve voltar ao credor, sem que o devedor possa apresentar qualquer defesa antes de ver-se privado da posse do automóvel.

Nota-se que não existe o tal “protecionismo” da Lei ou Justiça a favor dos devedores. Muito ao contrário, pode-se afirmar com certeza de que são os credores, mais especificamente os bancos, que são protegidos.

O único ponto que favorece os devedores é a morosidade da Justiça. Realmente, como dizia Rui Barbosa, justiça tardia é verdadeira injustiça, pelo que o estado de colapso que hoje atinge o Judiciário brasileiro deve, isto sim, ser solucionado. E isso se faz com recursos, com um choque de gerenciamento, com racionalização, com treinamento e motivação dos funcionários, não com leis draconianas.

É mistificação, portanto, culpar a lei ou uma postura “paternalista” da Justiça pelas altas taxas de juros e pela falta de investimentos. E é terrorismo chantagear o Congresso e a opinião pública para que aceitem leis ainda mais favoráveis aos bancos, como condição para uma redução na taxa de juros. Curiosamente, ano a ano seus balanços apresentam lucros recordes.

Esperemos que a imprensa e, sobretudo, o governo, não se deixem enganar, como infelizmente vem acontecendo até agora.

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