seu conteúdo no nosso portal

Nossas redes sociais

Lula sancionará projeto de renda básica de Eduardo Suplicy

Neste último final de semana, o senador Eduardo Matarazzo Suplicy (PT-SP) entrou em clima de comemoração: no dia 8 de janeiro, uma idéia dele gerada há pelo menos 15 anos e convertida em projeto de lei, será sancionada com pompa e circunstância pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Neste último final de semana, o senador Eduardo Matarazzo Suplicy (PT-SP) entrou em clima de comemoração: no dia 8 de janeiro, uma idéia dele gerada há pelo menos 15 anos e convertida em projeto de lei, será sancionada com pompa e circunstância pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A Lei de Renda Básica entra em vigor a partir da chancelada lustrosa do presidente da República. O Brasil será o primeiro País a dispor de uma lei como essa.

Em entrevista de 40 minutos concedida à revista Consultor Jurídico, Suplicy explicou a história e filosofia de sua tão sonhada lei. “Será como se todos fôssemos sócios do Brasil. Do mais pobre ao Antônio Ermírio de Moraes, todos receberão a renda básica”, disse o senador petista.

Leia a entrevista:

Como o senhor começou a pensar em seu projeto de lei?

Em verdade, a idéia de se garantir uma renda a todas as pessoas em cada nação pertence a muitos economistas e filósofos. No século 20, foram tantos os economistas, no mais largo espectro, que defenderam esta proposição que, na verdade, quase todos os países desenvolvidos, seja na América do Norte ou na União Européia, têm programas de garantia de renda, seja nas formas de seguro-desemprego, seja a Renda Mínima de Inserção, na França, na Espanha, em Portugal e nos países escandinavos. Nos Estados Unidos há também diversas formas de transferência de renda, como o Crédito Fiscal por Remuneração Recebida.

Nos anos 80, no Brasil, começou-se a pensar nisso mais e mais, inclusive dentro do PT. Já em 1975, o Antonio Maria da Silveira havia proposto um imposto de renda negativo para se prover um mínimo de renda para todos, e foi nos anos 90, no Senado Federal, em abril de 1991, que eu apresentei o primeiro projeto para instituir um programa de garantia de renda mínima através de um imposto de renda negativo.

Este projeto foi aprovado em dezembro de 1991, tramitou na Câmara dos Deputados, recebeu parecer favorável do hoje governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigoto, mas ficou na Câmara aguardando a votação até hoje. Só que o debate a respeito de programa de renda mínima frutificou e daí se desenvolveram as idéias de bolsa-escola, de programas de renda mínima associados à educação, que se espalharam pelo Brasil inteiro, houve também o programa bolsa-alimentação, o cartão-alimentação relacionado ao Fome Zero e outros.

E com a interação que tive com economistas que têm pensado a respeito deste assunto e, sobretudo, aqueles que fundaram e compuseram a Rede Européia da Renda Básica e congêneres na África do Sul, na Argentina, na Colômbia e em vários países do mundo, eu fiquei persuadido de que a melhor maneira de se instituir a garantia de uma renda para todos é a da Renda Básica de Cidadania, uma renda básica incondicional.

Como incondicional?

Sim, incondicional. Todas as pessoas, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou mesmo sócio-econômica, passaram a ter o direito de receber uma modesta renda, como direito de todos serem sócios do Brasil, um direito que a todos será garantido. Um direito semelhante, digamos, ao de os moradores de São Paulo, se o desejarem, ricos e pobres, poderem passear no Parque do Ibirapuera, ou se formos ao Rio de Janeiro, de tomarmos um banho de mar em Copacabana e assim por diante.

Então, em dezembro de 2001, eu apresentei um novo projeto para garantir uma renda a todos, mas através da Renda Básica de Cidadania. Obviamente consciente de que não seria possível obter isso de um dia para o outro, eu propus no meu projeto que a Renda Básica de Cidadania fosse instituída gradualmente a partir de 2005.

E o projeto foi aprovado pelo Senado Federal, com parecer do senador Francelino Pereira, em dezembro de 2002, e consensualmente todos os partidos, e o próprio senador Francelino Pereira é que teve a idéia de se instituir gradualmente, iniciando-se pelos mais necessitados, até que a todos este direito venha a ser oferecido, não como uma dádiva, mas como um direito de todos os brasileiros.

E, neste ano, na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados foi aprovado, em outubro, o parecer do deputado Paulo Bernardo, do PT do Paraná, e em dezembro último foi aprovado o parecer do deputado Irineu Colombo, do PT do Paraná, na Comissão de Constituição e Justiça e em caráter terminativo.

Quando um projeto é aprovado em caráter terminativo, depois ele é publicado em cinco sessões seguidas e se não houver o recurso por parte de pelo menos 10% dos 513 deputados isso significa então que a Câmara dos Deputados o aprovou. E isto foi o que aconteceu. Não houve recurso de quem quer que seja e em 12 de dezembro foi considerado aprovado.

De maneira que, em 15 de janeiro, o presidente João Paulo Cunha, da Câmara dos Deputados, encaminhou para sanção ou veto do presidente Lula o projeto de lei que institui a Renda Básica de Cidadania, o que significa que o presidente terá até 15 de janeiro (30 dias constitucionalmente) para sancioná-lo ou vetá-lo.

No âmbito dos ministérios, como o do Planejamento, como o da Fazenda, e outros, como na coordenação do Programa Bolsa-Família, com a senhora Ana Fonseca, assim como os ministros Guido Mantega e Antônio Palocci, todos eles já deram o parecer favorável para a sanção do presidente Lula e justamente o chefe do gabinete do presidente Lula, Gilberto Carvalho, em diálogo comigo, e junto do presidente, marcou a cerimônia de sanção da lei no próximo dia 8 de janeiro às 17h.

Eu quero informar que inclusive o maior especialista no assunto, o economista e filósofo que tem dado contribuições notáveis sobre este assunto, o professor Philippe Vamparijs, da Universidade Católica de Louvain, na Bélgica, comparecerá à cerimônia de sanção dada a sua relevância.

O Brasil é o primeiro no mundo?

Sim, na verdade o Brasil é o primeiro país no mundo que aprovou por seu Congresso Nacional a lei que será então sancionada pelo presidente Lula que instituiu uma Renda Básica de Cidadania. Quero ressaltar quem a forma como foi aprovada a Lei é consistente com a atual sistemática da recém-aprovada lei que institui a Bolsa Família, que ordenou e unificou os diversos programas de transferência de renda como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão-Alimentação,

Auxílio Gás, em um único programa.

E segundo o presidente Lula, este programa será gradualmente expandido até 2006, de maneira a beneficiar todas aquelas famílias com renda per capita até R$ 100 por mês e quem tiver crianças deverá ter a comprovação de que as crianças estejam em dia com as vacinas recomendadas pelo Ministério da Saúde, famílias que deverão ter a nutrição de suas crianças acompanhada pelos postos de saúde, as crianças de sete a 15 anos devem demonstrar que estão indo à escola e os pais, os adultos, devem estar fazendo um programa, seja de alfabetização ou de capacitação, mas este programa Bolsa Família que concede às famílias rendas da ordem de R$ 50, R$ 60, ou R$ 95, dependendo se a família tiver uma, duas, três ou mais crianças, pode ser visto como um passo na direção da Renda Básica Incondicional.

Está previsto para 2006 que 11,3 milhões de famílias, correspondendo a 44 milhões de pessoas no Brasil, terão direito a este complemento de renda na forma da Bolsa Família. Mas a partir daí estará o Brasil caminhando na direção da Renda Básica Incondicional, ou seja, a partir de certo momento simplesmente todos os brasileiros passarão a ter o direito a uma modesta renda mensal que será igual a todos.

Como?

Vai se pagar isto até mesmo, digamos, ao Antonio Ermírio de Moraes, ao Pelé, ao Ronaldinho, à Xuxa, a mim senador Suplicy, ao presidente Lula e mesmo a quem não esteja precisando. Só que as pessoas que detêm mais recursos obviamente vão colaborar para que elas próprias e todas as demais venham a receber.

E quais as grandes vantagens dessa sistemática? Primeiro: nós estaremos eliminando toda e qualquer burocracia em se ter de saber quanto cada um ganha, no mercado formal ou informal. Segundo: será eliminado o sentimento de vergonha ou estigma de a pessoa ter de dizer “eu só recebo tanto por isso mereço tal complemento de renda”. E em terceiro lugar, do ponto de vista da liberdade, da dignidade do ser humano, será muito melhor para cada um saber que nós próximos doze meses e daí para frente a cada ano e cada vez mais, com o progresso do país, todos vamos ter o direito de receber aquela modesta renda incondicionalmente.

Então, esta é a forma que economistas que vão desde James Tobin, a Milton Friedman, de Phillipe Vamparijs ao Thomas Payne, a Bertrand Russell, até pessoas que estudaram isso em profundidade, como o John Kenneth Galbarith até o Martin Luther King Jr., todos avaliam que este é o formato mais racional e eu fico feliz de o Brasil estar sendo o primeiro país no mundo a aprovar, mesmo que para ser instituído digamos na segunda metade da década primeira do século 21, uma Renda Básica de Cidadania como um direito de todos os brasileiros, inclusive dos estrangeiros que aqui residem há cinco anos ou mais conforme diz a lei que o presidente Lula sancionará dia 8 de janeiro.

Para quem ganha hoje salário mínimo, como isso fica em números?

Vamos supor que essa pessoa receba um salário mínimo da ordem de R$ 240 e que ela tenha na sua família quatro filhos. Vamos supor, porque que ficará a critério do Poder Executivo definir o montante da Renda Básica de Cidadania, levando-se em conta a disponibilidade financeira e o grau de desenvolvimento do país. Vamos supor que iniciamos com uma renda básica modesta da ordem de R$ 40 por mês. Então numa família de seis pessoas, teríamos seis vezes R$ 40, então teríamos R$ 240 a mais e o rendimento desta família, que antes era apenas de R$ 240, passará para R$ 480.

Obviamente, a grande diferença para as pessoas nesta família é que se porventura surgir uma única alternativa de trabalho, de sobrevivência, alguma atividade que coloque a sua vida em risco, ou que seja digamos humilhante para a pessoa, que signifique digamos a mulher estar vendendo o seu corpo ou o rapaz na família ter de participar de uma quadrilha de narcotraficantes ou algo desta natureza, o fato de se estar garantindo um mínimo de renda, mesmo que modestamente, significa o direito desta pessoa passar a ter muito maior grau de liberdade, liberdade de opção em aceitar ou não alguma atividade que porventura não seja a mais saudável para ele e para seus familiares.

Então, isto significa uma verdadeira revolução. O professor Phillippe Vamparijs, o grande filósofo de Louvain, e autor de livros como Liberdade Real Para Todos, diz que se há algo que possa justificar o capitalismo será a Renda Básica de Cidadania, que significa uma grande modificação na relação entre digamos os empresários, as empresas e as pessoas, porque as pessoas terão muito maior liberdade de opção e maior grau de barganha e obviamente então muito maior grau de dignidade.

Fale sobre as críticas à sua lei e como o senhor reage a elas.

Algumas pessoas ficam perguntando: “Mas será que você não estará aí estimulando a ociosidade? O que fazer com as pessoas que terão uma tendência à vagabundagem?” Em verdade, já dizia Bertrand Russell, estas pessoas são muito poucas e há tantas atividades tão úteis para a humanidade, como cuidar de familiares que precisam de assistência, ou mesmo serviços que prestamos à comunidade sem querer estar tendo uma remuneração. Há trabalhos que são úteis à comunidade e nem sempre encontram remuneração no mercado, como por exemplo quando Amedeo Modigliani e Vicent Van Gogh pintaram as suas obras, mal conseguiam sobreviver vendendo as mesmas e hoje os seus quadros são vendidos por milhões de dólares. Ambos ficaram doentes e acabaram morrendo bem mais cedo do que se tivessem tido uma vida melhor.

Por outro lado poderíamos também estar perguntando: “Afinal de contas, a nossa Constituição respeita também o direito de propriedade. Se assim respeita, então isso significa que respeitamos o direito de aqueles que detêm o capital, as fábricas, as fazendas, as lojas, os títulos financeiros, os imóveis, estarem recebendo a remuneração na forma de aluguéis, juros, e lucros. E porventura a Constituição brasileira obriga as pessoas que detêm o capital a trabalhar? Não.”

Pois bem, se nós asseguramos àqueles que detêm o capital o direito de receberem rendimentos até mesmo sem trabalhar, mas estas pessoas trabalham porque desejam o progresso, colocam as suas crianças e adolescentes nas melhores escolas porque querem o progresso de seus filhos, então porque não assegurar a todos, ricos e pobres, o direito de receber uma modesta renda, como sendo sócios de uma nação tão rica quanto o Brasil?

Este é um direito que minimamente deve ser assegurado a todos os brasileiros e aí nós iremos ter uma outra vantagem importante, que tantas vezes foi ressaltada por economistas como Celso Furtado: que se tivermos assegurado uma estrutura, uma distribuição de renda mais justa, nós asseguraremos também um desenvolvimento do país muito mais saudável e com a demanda por bens de serviço de primeira necessidade assegurada e estimulando-se a produção desses bens em todos os lugares do Brasil.

Então, as vantagens também são muito grandes para aqueles que, eventualmente em regiões mais distantes e pobres, tiverem uma renda assegurada. Haverá estímulo para o progresso de pequenas e médias empresas, para os produtos rurais ou urbanos destas regiões e isto também resultará num desenvolvimento muito mais equilibrado e inteiramente consistente com a criação de oportunidades de emprego, o que consiste numa das principais preocupações de hoje, se não a principal do próprio presidente Lula.

Compartihe

OUTRAS NOTÍCIAS

TRF1 mantém sentença que obriga Caixa a indenizar cliente por roubo de joias sob sua posse
Apreensão de CNH e passaporte só é autorizada se motivar satisfação da dívida trabalhista
Pessoa com visão monocular obtém isenção do IPI na aquisição de veículo