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STF permite divulgação de salários de servidores municipais de SP na internet

A divulgação pela internet da remuneração bruta mensal dos servidores do município de São Paulo, determinada pelo prefeito Gilberto Kassab e que havia sido proibida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), foi liberada pelo presidente do STF

A divulgação pela internet da remuneração bruta mensal dos servidores do município de São Paulo, determinada pelo prefeito Gilberto Kassab e que havia sido proibida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), foi liberada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, que deferiu liminar suspendendo duas decisões da corte estadual contrárias à divulgação dos dados.
A questão constitucional envolvida na publicação das informações no site “De olho nas contas”, explicou o ministro, está em saber se a divulgação da remuneração bruta mensal dos servidores paulistanos importa em respeito ao principio da publicidade – pela transparência dada aos gastos públicos -, ou se trata de exposição indevida dos servidores, em desrespeito à intimidade da vida privada dos cidadãos.
Para Gilmar Mendes, a remuneração bruta mensal dos servidores públicos é um gasto do poder Público que deve guardar correspondência com a previsão legal, com o teto remuneratório do funcionalismo e até mesmo com as metas de responsabilidade fiscal, frisou o ministro em sua decisão. Dessa forma, não se pode desconsiderar que a planilha de dados e informações divulgadas pelo município de São Paulo, em princípio, permitiu constatar a existência de diversas remunerações que excedem, aparentemente, até mesmo o teto remuneratório federal, com valores que quase alcançam R$ 50 mil, salientou o ministro.
“Isso não significa, necessariamente, ilicitudes”, frisou Gilmar Mendes, fazendo menção a possíveis imprecisões nas informações – apontadas pelo jornal O Estado de São Paulo, em sua edição de 6 de julho último -, mas permite o controle social e oficial sobre os gastos públicos e sobre a atuação adequada da administração, para dar exatidão às informações prestadas.
“Por impedir a publicidade dos gastos estatais relacionados à remuneração mensal dos servidores públicos”, disse o ministro, as decisões do TJ-SP causam grave lesão à ordem pública, “com efeitos negativos para o exercício consistente do controle oficial e social de parte dos gastos públicos”, concluiu o presidente do STF, ao deferir a liminar na Suspensão de Segurança (SS) 3902.
Veja a decisão na íntegra:
 
SUSPENSÃO DE SEGURANÇA 3.902-4 SÃO PAULO
RELATOR : MINISTRO PRESIDENTE
REQUERENTE(S) : MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
ADVOGADO(A/S) : CELSO A. COCCARO FILHO
REQUERIDO(A/S) : RELATORES DOS MANDADOS DE SEGURANÇA
NºS 180.176-0/7-00 E 180.589-0/3-01
DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
SÃO PAULO
IMPETRANTE(S) : SINDICATO DOS ESPECIALISTAS DE
EDUCAÇÃO DO ENSINO PÚBLICO DO
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO – SINESP
IMPETRANTE(S) : ASSOCIAÇÃO DOS ENGENHEIROS,
ARQUITETOS E AGRÔNOMOS MUNICIPAIS
DE SÃO PAULO E OUTRO(A/S)
DECISÃO: Trata-se de pedido de suspensão de
segurança, ajuizado pelo Município de São Paulo, contra as
decisões proferidas pelo Tribunal de Justiça do Estado de
São Paulo, nos mandados de segurança nº 180.176-0/7-00 e
180.589-0/1-00 (esta no Agravo Regimental nº 180.589-0/3-
01), que suspenderam a divulgação da remuneração bruta
mensal vinculada ao nome de cada servidor municipal, em
sítio eletrônico na Internet denominado “De Olho nas
Contas”, de domínio da municipalidade.
Na origem, o Sindicato dos Especialistas de
Educação do Ensino Público Municipal – SINESP (processo nº
180.176-0/7-00) e a Associação dos Engenheiros, Arquitetos
e Agrônomos Municipais de São Paulo e outros (180.589-0/1-
00) ajuizaram mandados de segurança contra o ato do
Prefeito Municipal de São Paulo que, em 16 de junho de
2009, determinou a divulgação, no sítio eletrônico da
prefeitura de São Paulo, de lista nominal de todos os
servidores públicos municipais, qualificados por: “cargos
base, cargos em comissão, remunerações brutas e unidades de
lotação” (fl. 21).
Para combater o referido ato, os impetrantes
alegam, em síntese: ilegalidade do ato impugnado, por falta
de previsão na Lei Municipal nº 14.720/08 e no Decreto
regulamentador nº 50.070/2008; vício de iniciativa
legislativa, pois a referida lei decorreu de projeto de
iniciativa parlamentar, embora devesse ter sido originário
do Poder Executivo Municipal; ausência de competência
legislativa municipal para tanto (art. 30, I, CF/88);
violação do artigo 5º, caput, e incisos X e XXXIII, artigo
6º, caput e artigo 37, §3º, inciso II, todos da
Constituição Federal (intimidade e segurança dos
servidores); distorção da realidade remuneratória pelos
dados apresentados; violação do princípio da isonomia, pois
a referida lista não abarcou todos os servidores
municipais, ao excluir, por exemplo, os integrantes da
Guarda Civil Metropolitana (fls. 21-22).
No mandado de segurança nº 180.176-0/7-00, o
desembargador relator do processo no Tribunal de Justiça
deferiu a liminar, com base nos seguintes fundamentos:
inexistência expressa de previsão na lei municipal e no
decreto regulamentador da hipótese de divulgação da
remuneração bruta dos servidores; possível vício formal de
projeto de lei de iniciativa exclusiva do Poder Executivo
Municipal; impossibilidade de divulgação de dados que
colocam em situação de perigo a segurança pessoal e
patrimonial dos servidores (nome, local de trabalho e
remuneração); inexistência de irreversibilidade da
segurança liminar pleiteada.
No mandado de segurança nº 180.589-0/1-00, após
indeferimento da inicial, por suposta ilegitimidade
passiva, houve o provimento do Agravo Regimental nº
180.589-0/3-01, em que o desembargador relator deferiu a
liminar, com base em semelhantes argumentos acima expostos.
Contra as referidas decisões, o Município de São
Paulo ajuíza o presente pedido de suspensão de segurança,
baseado em argumentos de grave lesão à ordem pública.
Segundo o requerente, a grave lesão à ordem
pública se manifestaria pelo descumprimento da Constituição
e do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre os
Interesses Privados, pois as decisões judiciais, baseadas
no direito de intimidade dos servidores, violariam
“frontalmente o Princípio da Publicidade, previsto no art.
37, caput, da CR, os incisos XIV e XXXIII, do art. 5º, da
Constituição Federal, o §3º, II, do art. 37 e o §6º do
artigo 39 da Constituição Federal” (fl. 4).
A municipalidade afirma que a divulgação dos
dados em discussão se deu em cumprimento ao artigo 37,
caput, da Constituição, como medida moralizante, “no
sentido de reunir, em um só local do Portal da Cidade de
São Paulo, todos os dados já disponíveis e outros
necessários relacionados a tais gastos, para que cada um
dos munícipes possa fiscalizar diretamente as contas
públicas, ao acessar as listagens dos contratos públicos,
com respectivos pagamentos, bem como aquelas que contêm o
nome, a lotação, o cargo e vencimentos brutos de cada um
dos servidores da Prefeitura” (fl. 5 – grifo nosso).
Alega-se, ainda, que: a remuneração do servidor
não deve estar sob seu exclusivo controle (fl. 7); a
informação publicada já seria pública (fl. 7); os dados
publicados no Portal de Transparência servem para aumentar
o controle social da Administração (fl. 8); o ato
concretiza o princípio da publicidade (fl. 9); a ponderação
entre intimidade e acesso a informações públicas já está
prevista no art. 39, §6º, CF/88 (fl. 13).
Por fim, a municipalidade informa que semelhante
pedido de suspensão já foi deferido pelo Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, em relação ao mandado de
segurança nº 180.209.0/9-00 (fls. 15-19).
Às fls. 31-126, a Associação dos Engenheiros,
Arquitetos e Agrônomos Municipais de São Paulo apresenta
petição de impugnação aos fundamentos do pedido de
suspensão, com juntada de documentos, reiterando os
argumentos apresentados no processo principal (acima
destacados) e pugnando pelo indeferimento do pedido de
suspensão.
Decido.
A base normativa que fundamenta o instituto da
suspensão (Leis 4.348/64, 8.437/92, 9.494/97 e art. 297 do
RI-STF) permite que a Presidência do Supremo Tribunal
Federal, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia públicas, suspenda a execução de
decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela
antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos
tribunais locais ou federais, quando a discussão travada na
origem for de índole constitucional.
Assim, é a natureza constitucional da
controvérsia que justifica a competência do Supremo
Tribunal Federal para apreciar o pedido de contracautela,
conforme a pacificada jurisprudência desta Corte,
destacando-se os seguintes julgados: Rcl 497-AgR/RS, rel.
Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ 06.4.2001; SS 2.187-
AgR/SC, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 21.10.2003; e SS
2.465/SC, rel. Min. Nelson Jobim, DJ 20.10.2004.
No mandado de segurança originário, a
impetração fundamenta-se: no artigo 5º, caput, e incisos
X e XXXIII, no artigo 6º, caput e no artigo 37, §3º, inciso
II, todos da Constituição Federal, por violação à
intimidade e à segurança dos servidores. A suspensão de
segurança, por sua vez, aponta contrariedade ao
Princípio da Publicidade, previsto no art. 37, caput,
CF/88; ao art. 5º, incisos XIV e XXXIII, CF/88; ao art. 37,
§3º, II e ao art. 39, §6º, da Constituição Federal. Não há
dúvida, portanto, de que a matéria discutida na origem
reveste-se de índole constitucional.
Feitas essas considerações preliminares, passo
à análise do pedido, o que faço apenas e tão-somente
com base nas diretrizes normativas que disciplinam as
medidas de contracautela. Ressalte-se, não obstante,
que, na análise do pedido de suspensão de decisão
judicial, não é vedado ao Presidente do Supremo
Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação
a respeito das questões jurídicas presentes na ação
principal, conforme tem entendido a jurisprudência
desta Corte, da qual se destacam os seguintes julgados:
SS 846-AgR/DF, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ
29.5.96; SS 1.272-AgR/RJ, rel. Ministro Carlos Velloso,
DJ 18.5.2001.
O art. 4º da Lei 4.348/64 autoriza o deferimento
do pedido de suspensão de segurança concedida nas ações
movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a
requerimento da pessoa jurídica de direito público
interessada, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à
segurança e à economia públicas.
Num juízo mínimo de delibação sobre o mérito
da causa, apreende-se que a questão constitucional em
debate no caso concreto está em saber se a divulgação da
remuneração bruta mensal vinculada ao nome de cada servidor
municipal, em sítio eletrônico na Internet denominado “De
Olho nas Contas”, de domínio da municipalidade, significa:
(1) a concretização do princípio da publicidade
(art. 37, CF/88) e o dever de transparência com
os gastos públicos; ou
(2) a exposição indevida de um aspecto da vida do
servidor público – dado pessoal, protegido pela
inviolabilidade da intimidade, da vida privada,
da honra e da imagem dos servidores; ou
(3) a violação da garantia da segurança da
própria sociedade e do Estado – art. 5º, XXXIIII,
CF/88 (sociedade, no caso, constituída pelos
servidores públicos municipais e por aqueles que
dele dependem).
O princípio da publicidade está ligado ao direito
de informação dos cidadãos e ao dever de transparência do
Estado, em conexão direta com o princípio democrático.
O princípio da publicidade pode ser considerado,
inicialmente, como apreensível em duas vertentes: (1) na
perspectiva do direito à informação (e de acesso à
informação), como garantia de participação e controle
social dos cidadãos (a partir das disposições relacionadas
no art. 5º, CF/88), bem como (2) na perspectiva da atuação
da Administração Pública em sentido amplo (a partir dos
princípios determinados no art. 37, caput, e artigos
seguintes da CF/88).
A Constituição Federal de 1988 é exemplar na
determinação de participação cidadã e publicidade dos atos
estatais. Destacam-se, por exemplo, o direito de petição e
de obtenção de certidões, de garantia do habeas data, de
realização de audiências públicas e da regra de publicidade
de todos os julgamentos do Poder Judiciário (art. 93, IX,
CF/88).
Nesse sentido, a Constituição abriu novas
perspectivas para o exercício ampliado do controle social
da atuação do Estado, com destacada contribuição da
imprensa livre, de organizações não-governamentais e da
atuação individualizada de cada cidadão.
Ao mesmo tempo, os novos processos tecnológicos
oportunizaram um aumento gradativo e impressionante da
informatização e compartilhamento de informações dos órgãos
estatais, que passaram, em grande medida, a serem
divulgados na Internet, não só como meio de concretização
das determinações constitucionais de publicidade,
informação e transparência, mas também como propulsão de
maior eficiência administrativa no atendimento aos cidadãos
e de diminuição dos custos na prestação de serviços.
Conforme Catarina Castro, esse fenômeno contínuo
potencializou a divulgação dos órgãos e serviços públicos
disponíveis, “através da publicitação de informações úteis,
como moradas, horários de atendimento, telefones,
competências dos organismos, características dos serviços
prestados, etc., contribuindo para a democratização do
acesso aos serviços administrativos, e para a aproximação
ao cidadão. […] Hoje, os organismos públicos são
obrigados a ter um sítio na Internet e a divulgá-lo, o que
constitui um passo importante para a desburocratização,
para a transparência, a simplificação do atendimento, o
alargamento dos horários (no sentido de horário contínuo de
atendimento), a rapidez no atendimento, a diminuição de
tráfego de serviços, a diminuição do tempo de resposta, a
melhoria do serviço prestado, e a redução dos custos
administrativos. […] A Administração Pública não utiliza
a informática apenas no seu contacto com os cidadãos,
procedendo ao tratamento de dados pessoais que lhes
respeitam. Os seus funcionários e agentes também vêem os
seus dados pessoais tratados pela Administração […]”
(CASTRO, Catarina Sarmento. Direito da Informática,
Privacidade e Dados Pessoais. Coimbra/Portugal: Almedina,
p. 190-191)
A criação dos Portais de Transparência dos
diversos entes estatais, nos diferentes níveis de governo,
tem proporcionado a experimentação social da relação
cidadão-Estado e o exercício do controle social dos gastos
públicos em novas perspectivas.
No âmbito federal, o Decreto nº 5.482, de 30 de
junho de 2005 dispôs sobre a divulgação de dados e
informações pelos órgãos e entidades da Administração
Federal, por meio da Rede Mundial de Computadores –
Internet, incumbindo à Controladoria-Geral da União a
função de gestora do Portal da Transparência (federal).
Dessa forma, determinou-se no Decreto (art. 1º)
a criação de Páginas de Transparência Pública dos diversos
órgãos, em que seja possível o acompanhamento de: I –
gastos efetuados por órgãos e entidades da administração
pública federal; II – repasses de recursos federais aos
Estados, Distrito Federal e Municípios; III – operações de
descentralização de recursos orçamentários em favor de
pessoas naturais ou de organizações não-governamentais de
qualquer natureza; IV – operações de crédito realizadas por
instituições financeiras oficiais de fomento.
A despeito desse avanço positivo, não se olvida
que o tratamento dos dados e informações públicos e a sua
divulgação devem ter como meta a transmissão de uma
informação de interesse público ao cidadão (individual ou
coletivamente), desde que inexista vedação constitucional
ou legal. Assim, veda-se a divulgação de informação inútil
e sem relevância, que deturpe informações e dados públicos
em favor de uma devassa, de uma curiosidade ou de uma
exposição ilícitas de dados pessoais, para mero deleite de
quem a acessa.
Em outros termos, o artigo 5º, XXXIII, da
Constituição, condiciona a divulgação de informações de
interesse público individual, coletivo ou geral à segurança
da sociedade e do Estado. Nesse sentido, o Decreto federal
mencionado assegurou que “não se aplicam aos dados e às
informações de que trata o art. 1º, cujo sigilo seja ou
permaneça imprescindível à segurança da sociedade e do
Estado, nos termos da legislação.”
Também por meio da interpretação do artigo 5º, X,
da Constituição, apreende-se que a divulgação pública de
informações e dados de domínio estatal está condicionada à
preservação da inviolabilidade da intimidade, da vida
privada, da honra e da imagem das pessoas.
Em geral, a legislação federal que se aproxima um
pouco da presente discussão reproduz essas determinações
constitucionais de restrição da divulgação de certos dados
pessoais. É o exemplo tanto da Lei nº 8.159/91 (que dispõe
sobre a política nacional de arquivos públicos e privados),
quanto da Lei nº 11.111/2005 (que regulamenta a parte final
do disposto no inciso XXXIII do caput do artigo 5º da
Constituição Federal).
No contexto de análise do presente caso também se
destaca o debate atual do que vem se convencionando chamar
de direito à autodeterminação informacional. Na experiência
constitucional portuguesa, por exemplo, Canotilho ressalta
que “em rigor, trata-se de um direito à autodeterminação
sobre informações referentes a dados pessoais que exige uma
protecção clara quanto ao <> a que se
destinam essas informações. Daí as exigências jurídicoconstitucionais
relativas às finalidades das informações:
(1) legitimidade; (2) determinabilidade; (3) explicitação;
(4) adequação e proporcionalidade; (5) exatidão e
actualidade; (6) limitação temporal. Todos esses requisitos
permitem o controlo dos fins, impedindo-se, designadamente,
que haja tratamento de dados relativos a finalidades não
legítimas ou não especificadas, excessivas relativamente a
estas mesmas finalidades ou que tenham como referência
dados inexactos ou desactualizados ou, ainda, mantidos por
lapsos temporais injustificados (CANOTILHO, José Joaquim
Gomes; MOREIRA, Vital. Constituição da República Portuguesa
anotada, vol. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais;
Coimbra, PT: Coimbra Editora, 2007, p. 553)”.
No caso referido no presente pedido de
suspensão, há a discussão da constitucionalidade da
divulgação de dados de domínio público-estatal, que
abarcam uma possível justaposição entre um aspecto
individualizado e específico do servidor público
municipal (remuneração bruta mensal vinculada ao nome
do servidor público municipal), em contraposição à
concretização do princípio da publicidade, do direito à
informação dos cidadãos e ao dever de transparência dos
gastos públicos estatais.
O pedido de suspensão, por sua vez, aponta
grave lesão à ordem pública, pois as decisões liminares
impugnadas impediriam, ao fundamento de preservação da
intimidade dos servidores, a concretização da política
pública de transparência e possibilidade de maior
controle social dos gastos públicos.
No caso, entendo que, quanto às decisões
liminares que determinaram a suspensão da divulgação da
remuneração bruta mensal vinculada ao nome de cada servidor
municipal, em sítio eletrônico na Internet denominado “De
Olho nas Contas”, de domínio da municipalidade, está
devidamente demonstrada a ocorrência de grave lesão à
ordem pública.
À semelhança da legislação federal existente
sobre o tema, a legislação municipal (fls. 122-126), em
princípio, abriu margem para a concretização da política de
gestão transparente da Administração Pública,
possibilitando maior eficiência e ampliação do controle
social e oficial dos gastos municipais.
Nesse sentido, as ações judiciais que suspendem a
divulgação de parte das informações disponíveis no sítio
eletrônico da municipalidade, com a manutenção de dados de
apenas alguns servidores em detrimento de outros, acabam
por tornar inócua a finalidade, o controle e a exatidão das
informações prestadas pela Administração ao cidadão em
geral, com evidente prejuízo para a ordem pública.
Ao mesmo tempo, a remuneração bruta mensal dos
servidores públicos em geral é vinculada ao princípio da
legalidade estrita, ou seja, trata-se de gasto do Poder
Público que deve guardar correspondência com a previsão
legal, com o teto remuneratório do serviço público e, em
termos globais, com as metas de responsabilidade fiscal.
Dessa forma, não se pode olvidar que a planilha
de dados e informações divulgada pelo Município de São
Paulo, atualizada em 3/7/2009 (fls. 93-113), em princípio,
permitiu constatar a existência de diversas remunerações
mensais e remunerações totais brutas que excedem,
aparentemente, não só o teto remuneratório municipal, mas,
em alguns casos, até mesmo o teto remuneratório federal
(fl. 97), com valores que quase alcançam R$ 50.000,00
(cinqüenta mil reais).
Isto não significa, necessariamente, a ocorrência
de ilicitudes. A planilha não especificou de forma clara o
que estaria sendo considerado nos campos de “remuneração
bruta”, de “demais elementos da remuneração” e de
“remuneração total bruta”. A falta de exatidão desses dados
acaba por possibilitar a geração de informações
distorcidas, que não devem ser fomentadas pela
Administração pública.
Contudo, a constatação pelos cidadãos e pelos
órgãos estatais em geral (a partir da consulta ao sítio
eletrônico discutido) de indícios de possível violação ao
teto remuneratório dos servidores públicos, por exemplo,
abre importante margem de ação para o controle social e
para o controle oficial, não só em relação aos gastos
públicos, mas em relação à própria atuação adequada da
Administração, no sentido de exigir-se a exatidão, em tempo
hábil, das informações prestadas no sítio eletrônico,
conforme consta em reportagem do jornal “O Estado de São
Paulo”, de 6 de julho de 2009 (fl. 50), cujo trecho
transcreve-se a seguir:
“Ao divulgar os salários brutos dos 147 mil
funcionários, a Prefeitura revelou a existência de
2.418 servidores recebendo, em maio, vencimentos
acima do teto de R$ 12,3 mil – salário do prefeito
Gilberto Kassab. Também revelou que um professor de
ensino fundamental e médio teve remuneração bruta de
R$ 143 mil – informação falsa, resultado de erro de
digitação.
Os vencimentos divulgados incluem bonificações,
indenizações, pagamentos atrasados, de precatórios,
reposições salariais referentes à década de 80,
evolução, etc. Mas como o portal é alimentado
automaticamente pelo sistema de pagamento, tal
separação de dados não aparece.
Assim, em vez de esclarecer, o portal confundiu.
[…]”. (fl. 51)
Não há dúvida de que a forma pela qual a
Administração decide divulgar determinadas informações e
dados públicos pode gerar maior confusão ou indeterminação,
como o que ocorre com a divulgação de informações em
planilhas de demonstração de gastos mensais.
Ressalte-se neste ponto que o dever de
transparência com os gastos e atos estatais deve se pautar
pela maior exatidão e esclarecimento possíveis, pois,
conforme a doutrina de Rafaelle De Giorgi (GIORGI, Raffaele
de. Direito, Democracia e Risco vínculos com o futuro.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998, p. 191-
192), uma característica marcante da sociedade moderna está
relacionada à sua paradoxal capacidade tanto de controlar,
quanto de produzir indeterminações.
Contudo, a forma como a concretização do
princípio da publicidade, do direito de informação e do
dever de transparência será satisfeita constitui tarefa dos
órgãos estatais, nos diferentes níveis federativos, que
dispõem de liberdade de conformação, dentro dos limites
constitucionais, sobretudo aqueles que se vinculem à
divulgação de dados pessoais do cidadão em geral e de
informações e dados públicos que podem estar justapostos a
dados pessoais ou individualmente identificados de
servidores públicos que, a depender da forma de organização
e divulgação, podem atingir a sua esfera da vida privada,
da intimidade, da honra, da imagem e da segurança pessoal.
Assim, diante do dinamismo da atuação
administrativa para reagir à alteração das situações
fáticas e reorientar a persecução do interesse público,
segundo novos insumos e manifestações dos servidores, do
controle social e do controle oficial, por exemplo, deve-se
a municipalidade perseguir diuturnamente o aperfeiçoamento
do modo de divulgação dos dados e informações, bem como a
sua exatidão e seu maior esclarecimento possível.
Nesse sentido, a Administração poderá sempre
buscar soluções alternativas ou intermediárias. No caso em
questão, uma solução hipoteticamente viável para a
finalidade almejada seria a substituição do nome do
servidor por sua matrícula funcional.
Novas soluções propostas à Administração são
sempre viáveis para aperfeiçoar a divulgação de dados que
privilegiem a transparência e busquem preservar, ao mesmo
tempo, a intimidade, a honra, a vida privada, a imagem e a
segurança dos servidores (e daqueles que dele dependem).
Entretanto, no presente momento, diante das
considerações acima expostas, entendo que as decisões
impugnadas geram grave lesão à ordem pública, por impedir a
publicidade dos gastos estatais relacionados à remuneração
mensal dos servidores públicos, com violação da regular
ordem administrativa e com efeitos negativos para o
exercício consistente do controle oficial e social de parte
dos gastos públicos.
Ademais, também está presente a probabilidade
de concretização do denominado “efeito multiplicador”
(SS 1.836-AgR/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, Plenário,
unânime, DJ 11.10.2001), ante a possibilidade de
multiplicação de medidas liminares em demandas que
contenham o mesmo objeto, ajuizadas individual ou
coletivamente.
Ante o exposto, defiro o pedido para suspender
a execução das decisões liminares, proferidas nos autos
dos mandados de segurança nº 180.176-0/7-00 e 180.589-0/1-
00 (esta no Agravo Regimental nº 180.589-0/3-01), em
trâmite no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Publique-se.
Comunique-se com urgência.
Brasília, 8 de julho de 2009.
Ministro GILMAR MENDES
Presidente

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