A penhora sobre o saldo da conta-corrente da empresa executada equivale à penhora do próprio estabelecimento comercial. Por esse motivo, somente pode ser decretada como medida excepcional e deve ser fundamentada.
Esses entendimentos são da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os ministros acolheram o recurso da Santa Branca Indústria de Produtos Alimentícios Ltda, de São Paulo, para tornar sem efeito a penhora decretada sobre os saldos das contas-correntes da empresa.
Em seu voto, a ministra Eliana Calmon, relatora do processo, lembrou decisões divergentes das Turmas do STJ. Para a relatora, no entanto, a melhor solução para o caso foi dada em um voto do ministro Adhemar Maciel, hoje aposentado do STJ, entendendo que a penhora do saldo bancário corresponde à penhora da própria empresa.
“Como bem ponderou o ministro Adhemar Maciel, a penhora dos saldos em conta-corrente não equivale à penhora sobre o faturamento, nem pode ser considerada de forma simplória como sendo penhora em dinheiro”, destacou a ministra. Segundo Eliana Calmon, a penhora sobre o saldo bancário “equivale à penhora do estabelecimento comercial e, como tal, deve ser tratada para só ser possível quando o juiz justificar a excepcionalidade”.
Eliana Calmon enfatizou ainda que “permitir-se a penhora dos saldos bancários de uma empresa é o mesmo que decretar a sua asfixia, porque tal determinação não respeita os reais limites que deve ter todo credor: atendimento prioritário aos fornecedores, para possibilitar a continuidade de aquisição da matéria-prima, pagamento aos empregados, prioridade absoluta pelo caráter alimentar dos salários”.
Penhora
O bloqueio e a transferência dos valores existentes nas contas-correntes da Santa Branca foram determinados pelo Juízo da Comarca de São Bernardo do Campo (SP). O Juízo analisou e acolheu a ação de execução movida pela Fazenda do Estado de São Paulo contra a empresa para a cobrança de dívida relativa ao recolhimento do Imposto Sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
A Santa Branca apelou da penhora com um agravo (tipo de recurso). No processo, a empresa afirmou que a decisão de primeiro grau teria contrariado os artigos 620, 678, 719 e 720 do Código de Processo Civil (CPC). Para a empresa, a penhora determinada corresponderia à penhora do seu faturamento de forma ilimitada e sem atendimento aos requisitos da lei processual, pois o Juízo deveria limitar o percentual a ser penhorado e nomear um administrador.
A medida como aplicada poderia, segundo a empresa, inviabilizar o funcionamento da atividade comercial. A Santa Branca destacou, ainda, o fato de já estar sofrendo penhora de seu saldo bancário em outra ação judicial.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) rejeitou o recurso mantendo a penhora. Para o TJ-SP, inexiste impedimento legal à penhora do saldo da conta-corrente até o limite da execução, ainda que haja necessidade da penhora de todo o saldo encontrado.
O Tribunal lembrou que, na forma da lei, o dinheiro, incluído o saldo bancário da empresa, estaria em primeiro lugar entre os bens penhoráveis não havendo limitação legal para a penhora. O TJ-SP também descartou a alegação da empresa de haver penhora sobre o dinheiro em outras execuções entendendo que isso não seria dupla penhora.
Tentando modificar as decisões anteriores, a Santa Branca recorreu ao STJ reiterando suas alegações. Segundo a empresa, embora a penhora sobre a conta-corrente não corresponda à penhora sobre o faturamento, ela pode inviabilizar sua atividade na medida em que recai sobre o total dos recursos da empresa, que não teria faturamento e caixa para os compromissos mensais.
Ao analisar o recurso, a ministra Eliana Calmon lembrou que, “doutrinariamente, a penhora sobre o saldo da conta-corrente é tratada como sendo penhora de dinheiro, admitindo-se a quebra do sigilo bancário pela busca de dinheiro disponível”. A relatora lembrou decisões do STJ no mesmo sentido da doutrina.
No entanto, segundo a ministra, esse tipo de penhora só deve ser aplicado em casos excepcionais e com a devida fundamentação, o que não teria ocorrido no caso. Por esse motivo, a relatora acolheu o recurso tornando sem efeito a penhora do saldo da conta-corrente da empresa. O voto de Eliana Calmon foi seguido pelos demais membros da Turma.