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Novas perspectivas da “causalidade alternativa”

Vamos colocar o problema da “causalidade alternativa” a partir de dois casos:

(1) Um saco de gelo é arremessado de um dos apartamentos de um prédio e atinge um veículo estacionado. A vítima não consegue identificar de qual apartamento ele fora lançado (TJSP).

(2) Dois amigos gravam um vídeo íntimo de uma garota. Dias após, esse vídeo é disponibilizado na rede (TJRS). As vítimas nesses casos merecem alguma indenização? O fato da autoria efetiva não ter sido apurada impede o sucesso da ação judicial?

A resposta na lei não é nada clara. Ao contrário, a lei é praticamente omissa.

Uma das conquistas da doutrina e da jurisprudência no Brasil foi a “teoria da causalidade adequada”, assim sintetizada pela pena de Arnaldo Rizzardo: “Os partícipes que se encontravam no grupo são considerados responsáveis solidários pelo evento perpetrado por um deles contra a vítima porque praticaram fato ou ato capaz de causar o efeito.

Mesmo que o autor do fato seja uma só pessoa, nasce a responsabilidade solidária até porque todos os participantes silenciam a respeito do culpado, revelando uma concordância, e, assim, participação indireta no resultado. Há um conjunto de pessoas no qual qualquer uma delas poderia causar o dano, tendo executado ações próprias para tanto” (Responsabilidade Civil, p. 75).

Nos últimos anos, essa teoria é aplicada pelos tribunais para responsabilizar membros de grupos, diante de danos sofridos por pessoas incapazes de identificar com exatidão a autora de atos específicos.

Um caso interessante foi julgado pelo TJRS. O desembargador Eugenio Fachini se deparou com um pedido de reparação de danos morais, em razão do vazamento de vídeos do autor mantendo relação sexual. Os autos comprovavam que os réus tiveram a posse dos vídeos e de que se envolveram direta e ativamente em “trama” articulada para prática de extorsão. Isto é, ameaçaram a vítima de divulgação dos vídeos em questão, prometendo a sua eliminação diante de pagamento de resgate.

A câmara considerou que embora impossível precisar exatamente qual dos integrantes do grupo foi o responsável por vazar o vídeo, a condenação mostrava-se possível, à luz da teoria da causalidade alternativa.

Outro caso foi relatado pelo desembargador Miguel Angelo da Silva. Um ato sexual praticado no interior de veículo de propriedade de um dos codemandados fora gravado. Ato contínuo, sem a autorização da vítima, foi postado o vídeo na internet, com cenas de sexo explícito. Nenhum dos réus assumiu a responsabilidade pelo “upload”. Mais uma vez, o TJRS decidiu pela responsabilização civil solidária de todo o grupo que participou do episódio, a despeito da impossibilidade de identificar precisamente a conduta individualizada dos envolvidos.

Havia um fato certo: todos foram partícipes do evento que culminou na difusão das imagens constrangedoras.

Nesse tipo de responsabilidade coletiva ou grupal, segundo o relator, seria irrelevante identificar quem efetuou a postagem das imagens no ambiente virtual, pois todos contribuíram para a causação do dano.

No caso do saco de gelo, o TJ-SP distribuiu o dever de reparar a todos os condôminos, independentemente da quase totalidade deles nada ter feito para justificar a sua responsabilidade na reparação do dano. (AC nº 9171680-03.2000.8.26.0000, Rel. Adilson de Andrade).

Portanto, pela aplicação da teoria da causalidade alternativa, protege-se a vítima. De outro lado, ficam expostos os membros de um grupo, diante da certeza de que algum deles praticou o ato danoso.

A balança do direito, nessas situações, pende para a tutela da vítima, porém conserva ao condenado o chamado direito de regresso, de sorte que, se ele conseguir identificar o verdadeiro responsável, poderá obter o ressarcimento.

Daniel Ustárroz – Advogado e Professor

Fonte: espacovital.com.br

Foto: divulgação da Web

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