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Juros de mora de 1% e o Código Civil

Por Gilberto Canhadas Filho e André Tan Oh

Não é incomum nos depararmos com sentenças condenatórias determinando que a parte vencida efetue o pagamento de condenação líquida, devidamente corrigida, acrescida de juros legais. Assim, com fundamento no caput do artigo 406, do Código Civil, combinado com o parágrafo primeiro do artigo 161, do Código Tributário Nacional, tornou-se corriqueira a aplicação de juros moratórios em 1% ao mês.

No entanto, é importante ressaltar que o atual Código Civil não fixa os juros de mora em 1%. “Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional”.

Portanto, ao contrário do Código Civil de 1916, que fixava os juros de mora em 6% ao ano, o atual Código Civil apenas determina que, caso as partes não tenham pactuado uma taxa de juros aplicável, deverá ser fixada a taxa que estiver em vigor para o pagamento de impostos da Fazenda Nacional.

Com a atenta leitura desses dispositivos, surge o questionamento quanto à taxa aplicável para os casos em que não tenha havido estipulação antecedente expressa. Inúmeros julgados endossam a aplicação de juros moratórios de 1% ao mês, sendo estes fixados pelo artigo 161, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional (CTN), conforme decidiu o TJ paulista nos Embargos de Declaração nº 0000388-64.2009.8.26.0590.

No entanto, o Código Tributário Nacional, expressamente, determina a aplicação da taxa de 1%, apenas nos casos em que a lei não dispuser de modo diverso. Vejamos: “Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. Parágrafo 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.”

Contudo, outra corrente jurisprudencial vem se estabelecendo, autorizando a aplicação da Taxa Selic, com fundamento nos artigos 13 da Lei nº 9.065, de 1995 e 39, parágrafo 4º, da Lei nº 9.250, de 1995. Isso porque as leis mencionadas são posteriores ao Código Tributário Nacional e fixam a taxa Selic para cálculo de juros de títulos federais, como é o caso do artigo 13 da Lei 9.065, que diz:

Art. 13. A partir de 1º de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com a redação dada pelo art. 6º da Lei nº 8.850, de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90 da Lei nº 8.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a 2, da Lei nº 8.981, de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic para títulos federais, acumulada mensalmente.

Merece destaque, ainda, a Lei nº 9.250, de 1995, que trouxe alterações sobre a arrecadação do Imposto de Renda e reforça a aplicação da Selic para títulos federais, nos seguintes termos: “Parágrafo 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.”

Aliás, esse foi o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Divergência no Resp nº 727.842-SP. O entendimento estabeleceu o posicionamento do STJ sobre o tema.

Por outro lado, ainda nos deparamos com julgados aplicando os juros de 1% ao mês, conforme recente decisão da 21ª Câmara de Direito Privado de São Paulo na Apelação nº 0006429-04.2012.8.26.0344.

Como se vê, o Código Civil é claro ao dispor que os juros moratórios deverão ser fixados com base na taxa em vigor para cálculo da mora de tributos devidos à Fazenda Nacional, qual seja, a taxa Selic, conforme disposto por leis especiais posteriores ao Código Tributário Nacional.

A análise do artigo 406 do Código Civil mostra preocupação do legislador pela aplicação de uma taxa variável para os juros de mora, evitando que a norma confronte com a realidade econômica. Essa também é a razão fundamental pela qual o legislador buscou na mora dos tributos devidos à Fazenda Nacional a taxa aplicável ora em exame, demonstrando uma clara intenção de adequar a execução dos julgados à realidade econômica do país.

Gilberto Canhadas Filho e André Tan Oh são advogados de Trigueiros Fontes Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações.

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