Enquanto títulos de crédito, os cheques são regidos, dentre outros, pelo princípio da autonomia. Desse princípio, surge o conhecido princípio da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa-fé, consagrado pelo art. 25 da Lei do Cheque (Lei n. 7.357/1985). Entretanto, prescrito o cheque, não há mais que se falar em manutenção das suas características cambiárias, tais quais a autonomia, a independência e a abstração. Inclusive, em razão da prescrição do título de crédito, a pretensão fundar-se-á no próprio negócio subjacente, inviabilizando a propositura de ação de execução.
Assim, perdendo o cheque prescrito os seus atributos cambiários, dessume-se que a ação monitória neste documento admitirá a discussão do próprio fato gerador da obrigação, sendo possível a oposição de exceções pessoais a portadores precedentes ou mesmo ao próprio emitente do título. Ressalte-se que tal entendimento vai ao encontro da jurisprudência firmada nesta Corte Superior no sentido de que, embora não seja exigida a prova da origem da dívida para a admissibilidade da ação monitória fundada em cheque prescrito (Súmula 531/STJ), nada impede que o emitente do título discuta, em embargos monitórios, a causa debendi.
Isso significa que, embora não seja necessário debater a origem da dívida, em ação monitória fundada em cheque prescrito, o réu pode formular defesa baseada em eventuais vícios ou na inexistência do negócio jurídico subjacente, mediante a apresentação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.
O acórdão ficou assim ementado:
DIREITO EMPRESARIAL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO MONITÓRIA. CHEQUE PRESCRITO. PERDA DOS ATRIBUTOS CAMBIÁRIOS. POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DA CAUSA DEBENDI.
- Ação monitória fundada em cheques prescritos.
- Ação ajuizada em 16/04/2013. Recurso especial concluso ao Gabinete em 22/05/2017. Julgamento: CPC/2015.
- O propósito recursal, além de analisar acerca da ocorrência de negativa de prestação jurisdicional, é definir se, na hipótese, é aplicável o princípio da inoponibilidade das exceções pessoais ao recorrente – portador dos cheques e terceiro de boa-fé.
- Não há que se falar em violação do art. 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, soluciona integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte.
- Nos termos do art. 25 da Lei 7.357/85, quem for demandado por obrigação resultante de cheque não pode opor ao portador exceções fundadas em relações pessoais com o emitente, ou com os portadores anteriores, salvo se o portador o adquiriu conscientemente em detrimento do devedor, isto é, salvo se constatada a má-fé do portador do título.
- Na hipótese dos autos, contudo, verifica-se que os cheques, que embasaram o ajuizamento da ação monitória, já estavam prescritos, não havendo mais que se falar em manutenção das suas características cambiárias, tais quais a autonomia, a independência e a abstração.
- Perdendo o cheque prescrito os seus atributos cambiários, dessume-se que a ação monitória neste documento fundada admitirá a discussão do próprio fato gerador da obrigação, sendo possível a oposição de exceções pessoais a portadores precedentes ou mesmo ao próprio emitente do título.
- Recurso especial conhecido e não provido, com majoração de honorários.
(STJ – REsp 1669968/RO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/10/2019, DJe 11/10/2019)
STJ
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