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A história da prova

A prova – A história da prova demonstra a fragilidade do homem em busca da verdade, sob a influência de fenômenos culturais, tomados por forte desalinho com a cientificidade. Tardou o homem a tecer um modelo de investigação da verdade desvencilhado da interferência da misticidade. O caráter místico que se impunha ao sistema de inquirição da verdade transformou o homem em instrumento passivo na afirmação de postulados que consolidavam realidade em ambientes tomados por evidente furor religioso, sem espaço para a racionalidade e a cientificidade.

A prova – A história da prova demonstra a fragilidade do homem em busca da verdade, sob a influência de fenômenos culturais, tomados por forte desalinho com a cientificidade. Tardou o homem a tecer um modelo de investigação da verdade desvencilhado da interferência da misticidade. O caráter místico que se impunha ao sistema de inquirição da verdade transformou o homem em instrumento passivo na afirmação de postulados que consolidavam realidade em ambientes tomados por evidente furor religioso, sem espaço para a racionalidade e a cientificidade.

O homem era vítima de suas próprias criações, buriladas para coonestar o místico como elemento indissociável do processo de conhecimento da verdade. No entanto, sempre que a sociedade se civilizou, mais se humanizou a perseguição da verdade, mediante o recurso da ciência, produto da inteligência do homem racional, liberto do dogmatismo religioso. Gradualmente, a fé (1) e a força (2) cederam espaço à razão, como único meio de afirmação da verdade, pelo qual se processa a produção da prova, obtida com o sinete da civilidade.

Para os tempos de hoje, a sujeição da verdade a processos

grotescamente argolados a soluções místicas permite compreender o comportamento atoleimado que grassava na formação da cultura dos povos que se alimentaram do farisaísmo religioso, de cujos postulados hauriam as regras que presidiam a extração e a produção da prova. A religião, berço da inocência na revelação da prova, prometia respostas infalíveis, mas com métodos grosseiros, mais generosos com o acaso do que com identificação da verdade.

Os meios adotados para a revelação da verdade, sempre tecida em ambiente de excessiva passividade racional, se afortunavam na certeza de que a vontade divina comungaria com a justiça, como expressão da indefectibilidade suprema e incensurável dos deuses. De métodos cruéis a patéticos, a prova governava-se pela cultura do homem, mas se guiava pela vontade divina, num ritualismo transformativo, adaptado à realidade do modelo de organização social.

Confinava-se o homem em ambiente investigativo caracterizado por técnica rudimentar, para decifrar a verdade, sempre tolerante com eventuais caprichos do destino, mesmo quando a injustiça fosse produto da vontade sagrada, confundida com ignorância técnica. Quiseram fazer com que a divindade dividisse o mesmo ambiente poluído pelo homem com traquinagens investigativas, em rituais em que o asceticismo era mera apologia da solicitude certeira da verdade.

Submetido às ordálias (3), meios de prova urdidos pela religiosidade e pela crendice de que a força divina protagonizava o processo com que se identificaria a responsabilidade em face de violação a dever moral ou jurídico, o homem, inconscientemente, conspirava contra a purificação dos recursos que o fizessem conhecer a verdade, ambientada no mundo da racionalidade. O homem, pelas injustiças que cometia, percebeu que Deus estava ausente das cerimônias em que se buscava a produção da prova, constatação tardia, mas relevante para reformular o sistema para a identificação da verdade.

Deus teria cansado da verdade dos homens e os homens teriam cansado da verdade de Deus, percepção inconsciente, mas que justificaria a remodelação da ideologia do sistema de produção e apresentação da prova. Assim, a verdade dos homens não era mais a verdade de Deus e a verdade de Deus não era mais a verdade dos homens, em matéria de prova, prova de fato jurídico…

A dessacralização da prova, por conseguinte, dinamiza o processo de racionalização da busca da verdade, com base na inteligência do homem, fenômeno jurídico-sociológico por força do qual se passou a reservar o poder divino de justiça para o ambiente em que os interesses materiais estivessem ausentes. Para o sistema jurídico atual e ocidental, a prova se faz com a razão, sem a religião, em cujos fundamentos se assenta a fé, para a sorte de Deus, agora já longe de tantas injustiças perpetradas pelos homens.

(1) A fé catalisou o processo de produção de prova, com que se identificaria a verdade possível, desde que o homem se projeta em organização social definida pela presença de estruturas hierarquizadas e institucionalizadas, ainda que de maneira rudimentar.

(3) Duelo ou embate judiciário constituiu-se em usual e importante meio de prova, com flagrante presença da força na condição de elemento único para a solução de um conflito, na Idade Média, época em que a tenacidade física do homem valia mais do que o preparo intelectual, escasso e quase sem valor. Ritualizava-se a luta física entre os litigantes, para a definição do vencedor do litígio, com a presença simbólica de uma autoridade judiciária.

(3) “A ordália, ou julgamento de Deus, consistia em submeter alguém a uma prova, na esperança de que Deus não o deixaria sair com vida ou sem um sinal evidente, se não dissesse a verdade ou fosse culpado. Prova de caráter eminentemente religioso, numa época em que tudo, o lar, a família, a cidade, o governo, a justiça, era protegido ou mesmo presidido por um deus ou por Deus, a sua aplicação se enquadrava exatamente ao sistema jurídico daqueles povos, conseqüência lógica da noção que tinham de direito e justiça”, conforme palavras de Moacyr Amaral Santos, o jurista brasileiro que melhor produziu sobre o instituto da prova (Prova Judiciária no Cível e Comercial, Vol. 1, 5ª edição, 1983, Saraiva, pág.17). Registra Moacyr Amaral Santos, apoiado em doutrinadores, as mais difundidas e conhecidas ordálias: a) a prova pela sorte: dois pedaços de madeira eram envoltos com lã, um assinalado com uma cruz representando a absolvição, o outro assinalado com os nomes dos acusados representando a culpa. Após o sorteio de apenas um pedaço, livrava-se ou condenava-se o acusado; b) a prova pelo fogo: o acusado teria de passar por duas sarças, vestindo uma camisa embebida em cera. Após tal feito, se não fosse queimado, se livrava da culpa; c) a prova pela água fervendo: o litigante deveria tirar um ou mais objetos do fundo de uma caldeira de água fervente. Após três dias era feito o exame nas mãos e braços, que permaneciam enfaixados durante tal período. Estando os braços ou mãos ilesos ou quase, o litigante era absolvido, do contrário condenado; d) a prova pela água fria: fazia-se a imersão das mãos do acusado em um vaso cheio de água fria. A idéia fundamental estava no milagre: se Deus pode tornar inócua a água fervendo, poderá tornar a fria danosa ao culpado. Também admitiam-se as situações de prova do esforço físico: os litigantes eram desafiados a atravessar um rio, de tal sorte que perdia a causa quem se cansasse. Ou: o acusado era lançado ao rio, com os pés e as mãos amarrados. Era lhe reconhecida a inocência, se afundasse, pois, se permanecia à superfície, se lhe reputava culpado, sob a suposição de que o elemento puro da água não queria recebe-lo; e) a prova pelo cadáver: o acusado era conduzido juntamente com o assassinado numa padiola, pouco depois de ocorrido o delito. Nesse momento, o acusado pronunciava juramento de que era inocente apoiando seus dedos sobre as feridas ou umbigo da vítima. Se estas voltassem a sangrar, estava provada a autoria do crime ; f) a prova pela cruz: os litigantes eram colocados de pé, com braços abertos, em forma de cruz, em frente à própria cruz, durante certo tempo ou enquanto se rezava o Evangelho. Aquele que primeiro deixasse cair os braços era condenado; g) a prova do pão e queijo: o acusado deveria engolir determinada quantidade de pão e queijo, ficando demonstrada a sua culpabilidade caso não conseguisse; h) a prova da eucaristia: constituía uma purgatio canonica, como o juramento. Foi sustentada pelo Papa Gregório III em Canossa; i) a prova pela caldeira pendente: o acusado deveria suspender uma caldeira cheia d’água pronunciando certas orações. Se o indivíduo fosse culpado a água deveria se agitar e a caldeira virar; j) a prova do pão bento: o acusado segurava um pão bento. Se culpado, o pão deveria fazer um movimento de ondulação; caso contrário estava provada sua inocência; l) a prova pelas serpentes: O acusado era posto no meio de serpentes, acreditando-se que estas morderiam apenas se o mesmo fosse o verdadeiro criminoso

Parte Geral

Livro III — Dos Fatos Jurídicos

Título V — Da Prova I (arts. 212 a 232)

Capítulo II — Da Decadência VII

(arts. 207 a 211)

Autor: Luís Carlos Alcoforado

Advogado, ex-examinador em Direito Civil do Exame de Ordem da ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Distrito Federal, membro do Instituto dos Advogados Brasileiros, Seção do Distrito Federal

luis.alcoforado@alcoforadoadvogados.com.br

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