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Decisão controversa do STF traz respostas antes das perguntas

Ensaio para a volta dos anos de chumbo?

Desfecho de julgamento por maioria (9×2), do Supremo Tribunal Federal, na quarta-feira (29), passa a gerar nova insegurança jurídica no país e responsabiliza os veículos de imprensa pela publicação de falas de terceiros. Trata-se de algo inimaginável em qualquer democracia atual. Segundo o julgado, as empresas jornalísticas têm o dever de verificar a veracidade dos fatos alegados pelo entrevistado e de esclarecer ao público que as acusações são sabidamente falsas. Foi definida, em dois pilares, a tese de repercussão geral, constituindo-se no Tema nº 995.

Conforme o acórdão, a empresa será responsabilizada se ficar comprovado que, na época da divulgação da informação, havia indícios da falsidade da acusação. Outro requisito é a demonstração do descumprimento do dever de verificar a veracidade dos fatos e de divulgar a existência desses indícios.

A tese também estabelece que, embora seja proibido qualquer tipo de censura prévia, a Justiça pode determinar a remoção de conteúdo da internet com informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas.

O caso concreto diz respeito a uma entrevista publicada pelo jornal Diário de Pernambuco, em maio de 1995. O entrevistado afirmava que o ex-deputado Ricardo Zaratini teria sido o responsável por um atentado a bomba, em 1966, no Aeroporto dos Guararapes (PE). Da ocorrência resultaram duas mortes e 14 pessoas feridas.

O recurso ao STF foi apresentado pelo jornal contra decisão do STJ. Este confirmou a condenação ao pagamento de indenização, considerando que a informação era falsa. Segundo a empresa recorrente, “a decisão violou a liberdade de imprensa”.

Seis anos de demora no Supremo

No voto condutor do julgamento, o ministro Edson Fachin reconheceu que a Constituição proíbe a censura prévia, mas limitou que “a liberdade de imprensa e o direito à informação não são absolutos, o que possibilita a responsabilização posterior em caso de divulgação de notícias falsas”.

Acompanharam esse entendimento os ministros Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski (aposentado), Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia. Ficaram vencidos o relator original, ministro Marco Aurélio (agora aposentado), e a ministra Rosa Weber (também aposentada). Os dois consideraram que, “se a empresa jornalística não emitir opinião sobre a acusação falsa, não estará sujeita ao pagamento de indenização”.

O caso tramita no STF desde 2017. O julgamento iniciou em 18 de maio de 2018. A conclusão demorou cinco anos e meio. Os parâmetros definidos poderão ser aplicados a 119 casos semelhantes que aguardavam a definição do Supremo.

O Judiciário quer fazer leis

Ausente do país, em férias, o jurista Lenio Streck foi contatado pelo Espaço Vital, via WhatsApp. E, prestativo, ele logo retornou com sua avaliação sobre o embrulho criado pelo Supremo. Suas frases são nucleares e objetivas.

A. “Novamente o STF legisla, embora claramente não seja função sua estabelecer regramentos para o futuro. Mas já se tornou rotina… O tribunal, com a sua nova tese, busca dar respostas antes das perguntas. Ora, nenhum país do mundo faz esse tipo de norma em abstrato. Vejam a extensão das duas frases que constituem o Tema nº 995. Nem as leis entram em tamanhas minúcias”.

B. “O Judiciário pensa que o direito pode abranger todas as hipóteses de aplicação de uma lei. Nesse ritmo o legislador ficará sem função. Em especial, veja-se esse trecho: ´Se o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação dos fatos e na divulgação de tais indícios´. Ora, os jornalistas teriam que investigar antes todas as futuras falas do entrevistado? Ai é que está o xis. O Judiciário quer fazer leis. Ora, há coisas que só cada situação concreta responde. Mas o STF quer dar e adivinhar o futuro. E também controlar o futuro. E isso cria insegurança!”.

Tente entender as teses supremas

Frasona nº 1 – “A plena proteção constitucional à liberdade de imprensa é consagrada pelo binômio liberdade com responsabilidade, vedada qualquer espécie de censura prévia, porém admitindo a possibilidade posterior de análise e responsabilização, inclusive com remoção de conteúdo, por informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, intimidade, vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana, salvaguardando um espaço íntimo intransponível por intromissões ilícitas externas”.

Frasona nº 2 – “Na hipótese de publicação de entrevista em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se: (i) à época da divulgação, havia indícios concretos da falsidade da imputação; e (ii) o veículo deixou de observar o dever de cuidado na verificação da veracidade dos fatos e na divulgação da existência de tais indícios”.

Perspectivas

Cuide-se a imprensa! O STF está querendo adivinhar o futuro. E preparando-se para, também, controlar esse mesmo futuro.

FONTE: ESPACOVITAL.COM.BR

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