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STJ: seguradora não pode condicionar indenização à quitação do veículo

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, no caso de perda total do veículo comprado mediante alienação fiduciária, a seguradora não pode condicionar o pagamento da indenização à comprovação de que o automóvel está com financiamento quitado e sem qualquer gravame.

Veja o acórdão:

RECURSO ESPECIAL. CIVIL. SEGURO DE AUTOMÓVEL. PERDA TOTAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. SÚMULA Nº 284/STF. VEÍCULO SEGURADO. GRAVAME. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PAGAMENTO. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. NECESSIDADE. DESTINATÁRIO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. POSSIBILIDADE. SALDO DEVEDOR. AMORTIZAÇÃO. TRANSFERÊNCIA. SALVADOS. DEDUÇÃO. VALOR. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. APURAÇÃO. MÉDIA DE MERCADO DO BEM. TABELA FIPE. DATA DA LIQUIDAÇÃO DO SINISTRO. DANOS MORAIS. CONDENAÇÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SIMILITUDE FÁTICA. INEXISTÊNCIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Cinge-se a controvérsia a saber: a) se houve negativa de prestação jurisdicional quando do julgamento dos embargos de declaração pela Corte estadual; b) se a seguradora pode condicionar o pagamento da indenização securitária originada da perda total de automóvel alienado fiduciariamente à prévia apresentação, pelo segurado, do DUT ou CRV livre de quaisquer gravames para fins de transferência dos salvados; c) se o valor dos salvados pode ser deduzido da indenização securitária; d) se a indenização securitária decorrente de contrato de seguro de automóvel deve corresponder, no caso de perda total, ao valor médio de mercado do bem (tabela FIPE) apurado na data do sinistro ou na data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro) e e) se ocorreram danos morais ao segurado pela recusa da seguradora de pagar a indenização securitária. 3. A alegação genérica da suposta violação do art. 1.022, I e II, do CPC/2015, sem especificação das teses que teriam restado omissas pelo acórdão recorrido, atrai a incidência da Súmula nº 284/STF. 4. Pagos os prêmios pelo segurado e cumpridos os demais elementos do contrato de seguro de automóvel, a seguradora não pode condicionar, no caso de perda total, o pagamento da indenização securitária à apresentação de documento que comprove a quitação do financiamento e a baixa do gravame do veículo gravado com cláusula de alienação fiduciária, sob pena de esvaziamento da própria finalidade do contrato (art. 757 do CC), contrariando, ainda, a boa-fé objetiva. 5. O dever do segurado de proceder à entrega da documentação do veículo sinistrado, desembaraçado de quaisquer ônus, possibilitando a transferência do salvado à seguradora, somente surge após o pagamento integral da indenização securitária (arts. 786 do CC, 126, parágrafo único, do CTB e 14, I e III, da Circular-SUSEP nº 639/2021). 6. É possível, nos casos em que o veículo sinistrado ainda esteja sob o gravame da alienação fiduciária, promover-se o pagamento da indenização securitária diretamente à instituição financeira, a fim de se amortizar o saldo devedor do segurado, desembaraçando-se o salvado e permitindo-se a transferência da propriedade do bem. 7. A falta de prequestionamento de matéria suscitada no recurso especial impede o seu conhecimento, conforme dispõe a Súmula nº 282/STF. Impossibilidade de exame do tema atinente à dedução do valor do salvado da indenização a ser paga. 8. A cláusula do contrato de seguro de automóvel que adota, na ocorrência de perda total, o valor médio de mercado do veículo como parâmetro para a apuração da indenização securitária, deve observar a tabela vigente na data do sinistro, não a data do efetivo pagamento (liquidação do sinistro). 9. A demonstração do dissídio jurisprudencial pressupõe a ocorrência de similitude fática entre o acórdão atacado e os paradigmas. Inadmissibilidade de apreciação da matéria relativa aos danos morais. 10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido. (STJ – 3ª Turma – RECURSO ESPECIAL Nº 1903931 – DF (2020/0288784-0) RELATOR RECORRENTE ADVOGADOS RECORRIDO ADVOGADOS : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA)

Sobressai-se do voto do relator a seguinte manifestação judiciosa:

“Assim, a questão nodal está em aferir a abusividade da conduta da seguradora, que negou o pagamento da indenização securitária ao argumento de que, “(…) em se tratando de indenização por perda total de veículo objeto de contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária, o pagamento está condicionado à satisfação do contrato de financiamento”, com a apresentação “(…) da carta de quitação do veículo, de modo que o salvado deve ser transferido à seguradora livre e desembaraçado de quaisquer ônus” (fl. 295).

Nesse contexto, é certo que, no caso de sinistro do qual decorra perda total, o segurador faz jus aos salvados, estes entendidos como os bens que se conseguem resgatar de um sinistro e que ainda possuem valor comercial, evitando-se eventual lucro que o segurado obteria com a contratação da garantia securitária. Todavia, a sub-rogação somente se dá após o pagamento integral da indenização securitária devida.

Nos termos dos arts. 786 do Código Civil e 126, parágrafo único, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), quando a seguradora paga a indenização securitária, sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, em direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano.

Desse modo, é lícita a previsão constante em apólices de seguros de automóveis de sub-rogação da seguradora na propriedade do veículo cuja indenização por perda total, furto ou roubo (o tecnicamente chamado de salvado) foi paga.

Ressalta-se que, quando a seguradora se sub-roga nos direitos sobre o salvado, pode ela se ressarcir contra quem de direito, mesmo quando o automóvel ainda não foi localizado, como nas hipóteses de roubo ou furto, podendo, inclusive, fazer uso da ação regressiva, consoante a Súmula nº 188/STF.

Logo, após o pagamento da indenização, é dever do segurado proceder à entrega da documentação do veículo, possibilitando a transferência do salvado à seguradora, desembaraçado de quaisquer ônus, o que evita o enriquecimento ilícito.

Ademais, ocorrido um sinistro que atinja os bens garantidos pela apólice, o segurado não poderá fazer o abandono dos salvados, devendo tomar providências no sentido de protegê-los e de minorar os prejuízos.

A propósito:

“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. SEGURO. SUB-ROGAÇÃO. ENTREGA DO DOCUMENTO DO VEÍCULO APÓS O PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO. REQUERIMENTOS DO AGRAVANTE. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DO FUNDAMENTO DO ACÓRDÃO ESTADUAL. SÚMULA 283. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que não conheceu do agravo. Reconsideração, diante da existência de impugnação, na petição de agravo, da decisão que não admitiu o recurso especial na origem. 2. Nos termos do art. 786 do CC, quando a seguradora paga a indenização securitária, sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, em direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano. Assim, apenas após o pagamento da indenização, é dever do segurado proceder à entrega da documentação do veículo, possibilitando a transferência do salvado à seguradora, desembaraçado de quaisquer ônus, o que evita enriquecimento ilícito. 3. A ausência de impugnação, nas razões do recurso especial, de fundamento suficiente à manutenção do acórdão estadual atrai a incidência da Súmula 283 do STF. 4. Agravo interno provido para, reconsiderando a decisão agravada, conhecer do agravo para negar provimento ao recurso especial.” (AgInt no AREsp n° 1.578.962/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, DJe de 1º/4/2020 – grifou-se)

Nesse contexto, mesmo em relação aos veículos segurados gravados com cláusula de alienação fiduciária, não pode a seguradora vincular o pagamento da indenização securitária à apresentação de documento que comprove a quitação do financiamento e a baixa do gravame, sob pena de se esvaziar a finalidade do próprio contrato (art. 757 do CC), contrariando, ainda, a boa-fé objetiva.

Como os salvados passam a ser de responsabilidade da sociedade seguradora apenas quando efetuado o pagamento da indenização integral, a falta de previsão contratual acerca de como se deve operar o seu pagamento na hipótese de veículos alienados fiduciariamente não pode constituir empecilho ao adimplemento contratual da seguradora, considerando-se que o segurado já cumpriu com sua obrigação ao suportar os prêmios.

Tal negativa desproporcional configura-se, na realidade, locupletamento indevido do ente segurador. Além disso, como determinado pelas instâncias ordinárias, é possível, nos casos em que o veículo sinistrado ainda esteja sob o gravame da alienação fiduciária, promover-se o pagamento da indenização securitária diretamente à instituição financeira, a fim de se amortizar o saldo devedor, desembaraçando-se o salvado e permitindo-se a transferência da propriedade do bem.

……….

Dessa forma, não merece reparos o acórdão local que asseverou ser abusiva a cláusula 16.1 (II) do Manual do Segurado, a qual condiciona o pagamento da indenização securitária à apresentação de documentos comprobatórios da baixa do gravame fiduciário, visto que tal disposição coloca o consumidor (segurado) em situação de extrema desvantagem (arts. 6º, V, 47 e 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor).

……..

Enfim, o fato de o veículo segurado ser objeto de garantia por alienação fiduciária não obsta o pagamento da indenização securitária na ocorrência de perda total do bem. A sub-rogação da seguradora nos direitos de propriedade do salvado somente se perfaz após a observância da sua parte na avença”.

STJ

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Foto: divulgação da Web

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