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A obrigação alimentar extinta, mas mantida por liberalidade não configura a surrectio

A obrigação alimentar extinta, mas mantida por liberalidade não configura a surrectio

Conceito: “Surrectio” nada mais é do que a “aquisição” de um direitos em face ao exercício de um conduta reiterada. Aqui, a atitude de uma parte ao longo do tempo faz surgir para a outra um direito não pactuado originariamente.

No caso, o devedor de alimentos, apesar de ter sido exonerado judicialmente do dever alimentar após 24 (vinte e quatro) meses da celebração de acordo na ação de divórcio e de ter logrado êxito em ação revisional posteriormente proposta pela ex-mulher, cujo intuito principal era a manutenção do dever obrigacional já extinto, resolveu, aparentemente por conta própria, arcar com o pensionamento por cerca de 15 (quinze) anos. Entretanto, o instituto da surrectio costuma balizar a interpretação na esfera contratual, bem como os deveres anexos à obrigação principal, em um contexto normalmente diverso do direito de família, que se rege por princípios autônomos àqueles aplicáveis, como regra, aos negócios jurídicos de modo geral. A liberalidade em questão não ensejou direito subjetivo algum, pois a própria beneficiária já tinha ciência de que o direito pleiteado era inexistente. A improcedência da ação revisional proposta com o intuito de prorrogação do pagamento dos alimentos é, por si só, fundamento suficiente. Assim, não há falar em ilicitude na conduta do ex-cônjuge por inexistência de previsibilidade de pagamento eterno dos alimentos, especialmente porque ausente relação obrigacional. A boa-fé não pode, nesse momento, ser-lhe prejudicial. Portanto, a teoria do abuso de direito não se aplica no caso concreto, em que a assistência foi humanitária e, perceptivelmente, provisória. O dever de prestar alimentos entre ex-cônjuges ou companheiros é regra excepcional que desafia interpretação restritiva. No caso, a ex-esposa fez dos alimentos percebidos voluntariamente um modo de subsistência por escolha própria. A fixação de alimentos depende do preenchimento de uma série de requisitos e não pode decorrer apenas do decurso do tempo. A idade avançada ou a fragilidade circunstancial de saúde, fatos inexistentes quando da separação, não podem ser imputados ao ex-cônjuge, pois houve tempo hábil para se restabelecer após o divórcio, já que separada faticamente há quase duas décadas. Ademais, não há título executivo judicial ou extrajudicial apto a ensejar a cobrança dos alimentos, pois, desde que ultrapassado o prazo de 24 (vinte e quatro) meses a obrigação findou, ficando exonerado o alimentante do pagamento a partir de então. Como é cediço, a execução desamparada em título judicial ou extrajudicial é nula.

Veja o acórdão:

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. TÍTULO EXECUTIVO. AUSÊNCIA. COISA JULGADA MATERIAL.
OBSERVÂNCIA. OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. TEORIA DO ABUSO DE DIREITO.
SURRECTIO. INAPLICABILIDADE. PAGAMENTO. AUTONOMIA PRIVADA. MERA LIBERALIDADE.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. Controvérsia acerca da possibilidade ou não de, com fundamento na teoria do abuso do direito e na surrectio, perpetuar obrigação alimentar assumida por longo período a título de mera liberalidade pelo alimentante já exonerado da dívida.
3. Não há falar em ilicitude na conduta do recorrente por inexistência de previsibilidade de pagamento eterno dos alimentos, especialmente porque ausente relação obrigacional.
4. É cediço que a execução desamparada em título judicial ou extrajudicial é nula.
5. Na hipótese, inviável a manutenção do dever alimentar em virtude do decurso do prazo fixado em acordo homologado em juízo e pela existência de coisa julgada refutando a dívida.
6. Recurso especial provido.
(REsp 1789667/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 22/08/2019)

STJ

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Foto: divulgação da Web

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