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Caso Lula: Decisão de Fachin conflita com precedentes do Supremo

O Código Penal adotou a teoria do resultado para definir a competência do juízo pelo lugar da infração (territorial) de natureza relativa (art. 70), e em razão da natureza da infração (em razão da matéria) de natureza absoluta (art. 74)

O juízo para processar e julgar o ex-Presidente Lula é a Justiça Federal, portanto, em decorrência da matéria. Se tivesse sido julgado pela Justiça Estadual, seria nulidade absoluta, visto que, era o caso de violação ao juízo natural.

Já a decisão do min. Fachin foi de considerar competente o juízo federal de Brasília, e não o de Curitiba, onde tramitou o processo, portanto, de incompetência de ordem territorial.

Seria, então, o caso de incompetência em razão do lugar, de nulidade relativa.

Esse é o ponto central da decisão em questão.

Registre-se, por oportuno, que essa matéria já tinha sido enfrentada pelo TRF da 4ª Região e pelo Superior Tribunal de Justiça, portanto, matéria vencida nessas instâncias ordinárias.

Na incompetência relativa não se anula os atos, remete-se para o juízo competente que pode convalidá-los.

Aqui o primeiro confronto da decisão do min. Fachin com o Plenário do Supremo Tribunal Federal diante do julgado a seguir:

HABEAS CORPUS. DENÚNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. RATIFICAÇÃO. PROCURADORIA-GERAL DA REPÚBLICA. INQUÉRITO NO ÂMBITO DO STF. LEI Nº 8.038/90. 1. “Tanto a denúncia quanto o seu recebimento emanados de autoridades incompetentes rationae materiae são ratificáveis no juízo competente”. Precedentes. 2. Caso em que a notificação para a apresentação de resposta (art. 4º da Lei nº 8.038/90), fase anterior ao julgamento em que o Tribunal deliberará pelo recebimento ou rejeição da denúncia (art. 6º da Lei nº 8.038/90), não permite se inferir que tenha o relator do inquérito ratificado o ato de recebimento da denúncia, exarado pelo juízo de origem. 3. Alegações formuladas a respeito da inépcia da denúncia que, além de demandarem o exame de provas, insuscetível de realização em sede de habeas corpus, inserem-se no âmbito da deliberação a ser realizado oportunamente pelo Tribunal em julgamento que está previsto no art. 6º da Lei nº 8.038/90. Ordem indeferida. (STF – HC 83006 / SP – SÃO PAULO – Plenário – rel. Mn. Ellen Gracie – DJ 29/08/2003).

 Como se vê, mesmo tratando-se de incompetência “ratione materiae” os atos são ratificados pelo juízo competente; no caso a competência é territorial, desprovida de vícios que produzam ofensas ao direito da defesa.

De modo que, se o Plenário do STF decidiu que em razão da matéria, que tem forte carga de vícios em razão do juízo, a relativa, que tem a mesma Justiça e difere apenas o juízo, declarar a nulidade dos atos é desarrazoado, no mínimo.

E sendo de incompetência territorial como decidiu o min. Fachin, seria o caso de preclusão por ter sido a matéria enfrentada pela TRF 4ª e o STJ, senão vejamos:

“A competência territorial é relativa e prorrogável/derrogável, de modo que eventual nulidade dela decorrente também é relativa e somente pode ser proclamada quando demonstrado o efetivo prejuízo (STF – 1ª Turma – ARE 1120258 – rel. p/ acórdão – Min. Luiz Fux – J.  08/10/2013)

Depreende-se, assim, que reconhecida a incompetência territorial, seria o juízo prorrogável para conhecer e decidir a causa, sem nulidades.

Extrai-se do substancioso voto do e. Relator Min. Fux (foto):

“HABEAS CORPUS 106.074 PARANÁ VOTO-VISTA DO MIN. FUX

Além disso, a competência territorial é relativa, prorrogando-se caso não seja ajuizada exceção de incompetência. Nesse sentido é a doutrina sobre o tema, in verbis:

Já a competência relativa, ou territorial, é aquela que, como é intuitivo, pode ser flexibilizada ou, de modo mais simples, relativizada, dependendo do exame concreto de determinada relação processual e do interesse das partes envolvidas. (Eugênio Pacelli de Oliviera, Curso de Processo Penal, 9. ed., Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2008, p. 221) – grifo adicionado

Por isso que é cediço na Corte que “a decisão de exceção de incompetência relativa que rejeita a alegada incompetência do juízo, declarando-o competente ao afirmar a conexão hábil a manter o feito sob sua jurisdição, torna a matéria preclusa, mercê de eventual nulidade quanto ao critério territorial ser relativa. […]” (HC 93368, rel. min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ de 25/8/2011).

Ora, ajuizada a exceção de incompetência, e julgada esta improcedente, forçoso é concluir-se no sentido de que a matéria encontra-se preclusa”.

Em outro Julgado, o STF adotou o mesmo entendimento:

A decisão de exceção de incompetência relativa que rejeita a alegada incompetência do juízo, declarando-o competente ao afirmar a conexão hábil a manter o feito sob sua jurisdição, torna a matéria preclusa, mercê de eventual nulidade quanto ao critério territorial ser relativa. (STF – HC 93368, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 09/08/2011, DJe-163 DIVULG 24-08-2011 PUBLIC 25-08-2011 EMENT VOL-02573-01 PP-00030).

Aqui temos Fachin contrariando Julgados do próprio Supremo Tribunal Federal, o ministro de forma monocrática decidiu declarar a nulidade apenas dos atos decisórios praticados nas respectivas ações penais, inclusive os recebimentos das denúncias, devendo o juízo competente decidir acerca da possibilidade da convalidação dos atos instrutórios.

Como resultado temos o efeito colateral decorrente da inocuidade dos trabalhos dos membros e servidores do TRF da 4ª Região e do STJ de muitas horas de trabalho custeadas pelo erário.

É relevante assinalar que o art.  563 do Código de Processo Penal preceitua:

Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.

A defesa não demonstrou nem ficou comprovado prejuízo para a defesa, apenas, porque o processo não foi julgado em Brasília, onde o clima é seco, mas em Curitiba domina o clima frio e úmido. Talvez, a única diferença.

O próprio STF tem aplicado de forma literal o aludido dispositivo, senão vejamos:

“No presente writ, a impetração não alega ou comprova, em nenhum momento, a ocorrência de algum prejuízo causado ao paciente em decorrência da fixação da competência do Juízo Federal de Curitiba. A alegação de nulidade, relativa ou absoluta, deve ser acompanhada da demonstração de prejuízo, o que não ocorreu na espécie. Precedentes.  Writ denegado”. (HC 103510/PR, Relatora Ministra ELLEN GRACIE, SEGUNDA TURMA, DJe 29/10/2009). (HC 93368, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 09/08/2011, Dje-163 DIVULG 24-08-2011 PUBLIC 25-08-2011 EMENT VOL-02573-01 PP-00030)

A regra em julgados do Tribunais Estaduais, Federais e do STJ, é somente anular um processo quando demonstrado prejuízo concreto para a defesa, e não de forma abstrata.

Outro ponto controvertido é o exame de provas na via estreita de Habeas Corpus, pois, ao decidir, “Fachin ressaltou que as ações não poderiam ter sido analisadas em Curitiba, porque os fatos apontados não têm relação direta com o esquema de desvios na Petrobras: “ficou demonstrado que as condutas atribuídas a Lula não foram diretamente direcionadas a contratos específicos celebrados entre o Grupo OAS e a Petrobras”.

O advogado Fábio Tofic Simantob[1] analisou esse trecho da decisão do ministro Fachin de anular condenações de Lula na Lava Jato. Para o especialista em Direito penal, “é uma sentença de absolvição“, pois elimina um pilar da acusação, já que os atos de ofício para a alegada corrupção eram as indicações dos diretores para Petrobras.

Evidencia-se, assim, que o Habeas Corpus sucedeu à Apelação.

Em uma análise pormenorizada dos acontecimentos em tela projeta-se uma série de equívocos nessa decisão em favor da defesa, que não se verifica em situações idênticas aos réus comuns e mortais.

Ao final, pode-se deduzir que a decisão mais judiciosa seria a declaração de preclusão da incompetência territorial, como sempre trilhou a jurisprudência do Supremo.

[1] https://www.migalhas.com.br/quentes/341393/para-fabio-tofic-decisao-de-fachin-e-sentenca-de-absolvicao.

Equipe de Redação

#incompetência #territorial #matéria #preclusão #nulidade #juízo #processo

Foto: divulgação da Web

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