seu conteúdo no nosso portal

Nossas redes sociais

Cláusula arbitral barra execução se esta depender do mérito do título extrajudicial

A existência de cláusula compromissória arbitral não impede a execução de título extrajudicial de forma paralela, desde que preenchidos os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade. Se os argumentos de defesa do devedor se relacionarem com o mérito do título executivo em que inserida a cláusula arbitral, só o juízo arbitral será o competente para sua análise.

Esse foi o entendimento firmado pelo STJ, cujo acórdão ficou assim redigido:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA PACTUADA. POSSIBILIDADE DE CONCOMITÂNCIA ENTRE EXECUÇÃO NO JUÍZO ESTATAL E PROCEDIMENTO ARBITRAL. NECESSIDADE DE SE OBSERVAR CERTOS REQUISITOS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DO TÍTULO EXEQUENDO. CERNE DA CONTROVÉRSIA QUE GUARDA RELAÇÃO COM O PRÓPRIO MÉRITO DO CONTRATO EXECUTADO. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO KOMPETENZ-KOMPETENZ. DERROGAÇÃO DO JUÍZO ESTATAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ARBITRAL. NECESSIDADE DE SUSPENSÃO DOS ATOS EXECUTIVOS. FIXAÇÃO DE SUCUMBÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

  1. Aplica-se o NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
  2. A existência de cláusula compromissória não obsta a execução de título extrajudicial, desde que preenchidos os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade na medida em que os árbitros não são investidos do poder de império estatal à prática de atos executivos, não tendo poder coercitivo direto. Precedentes.
  3. A celebração de cláusula compromissória implica parcial derrogação da jurisdição estatal, impondo ao árbitro o poder-dever de decidir as questões decorrentes do contrato ou das obrigações nele consignadas (existência, constituição ou extinção do crédito).

Necessidade de observância do princípio Kompetenz-Kompetenz.

Precedentes.

  1. Porque os argumentos trazidos na exceção de pré-executividade dizem respeito ao próprio mérito do título executivo em que inserida a cláusula compromissória, deve ser ela rejeitada, com a imediata suspensão da execução até final decisão proferida no juízo arbitral.
  2. Recurso especial provido.

(REsp 1864686/SP, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/10/2020, DJe 15/10/2020)

Extrai-se do voto do Relator a seguinte manifestação:

“É que esta Corte já se posicionou no sentido de que a existência de cláusula compromissória não obsta a execução de título extrajudicial, desde que preenchidos os requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, na medida em que os árbitros não são investidos do poder de império estatal à prática de atos executivos, não tendo poder coercitivo direto.

Nesse sentido, é a doutrina do professor HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, para quem se o contrato configura, por si só, e por suas garantias, um título executivo extrajudicial, o credor não fica inibido de executá-lo judicialmente, mesmo existindo convenção de arbitragem.

É que não se insere nos poderes dos árbitros a atividade executiva, mas apenas a de acertamento. Assim, não se pode exigir que todas as controvérsias oriundas de um contrato sejam submetidas à solução arbitral, se, como no caso da execução, a via da arbitragem se revela impotente (Processo de execução e cumprimento da sentença. São Paulo: Universitária de Direito, 2014, p. 146). Contudo, admitida a possibilidade de coexistência entre processo de execução e procedimento arbitral, há que se ter em mente que a celebração de cláusula compromissória implica a limitação material do que poderá ser objeto de apreciação pelo Juízo estatal. Ou seja, mencionada cláusula derroga a jurisdição estatal impondo ao árbitro o poder-dever de decidir as questões decorrentes do contrato ou obrigações nele consignadas (existência, constituição ou extinção do crédito) (Kompetenz-Kompetenz).

Mencionado entendimento, já foi exarado pela eminente Ministra NANCY ANDRIGHI, no julgamento da Medida Cautelar nº 13.274/SP, quando assentou que é competente para decidir as questões de mérito relativas a contrato com cláusula arbitral, a câmara eleita pelas partes para fazê-lo sendo que tal competência não é retirada dos árbitros pelas circunstância de uma das partes ter promovido, antes de instaurada a arbitragem, a execução extrajudicial do débito, perante juiz togado.

Ainda sobre o tema, CARLOS ALBERTO CARMONA, leciona que …

Não há, porém, incongruência alguma entre a existência de um título executivo e a possibilidade de arbitragem, mas a correlação entre os temas deve ser bem compreendida: se houver alguma dúvida sobre o título (ou sobre as obrigações ali consignadas), tal crise de certeza deve ser dirimida pela via arbitral; mas se houver inadimplemento, o credor socorrer-se-á desde logo da via judicial, propondo demanda de execução, sem que haja espaço para a arbitragem. Vale tomar como referência, para argumentar, algum título que tome a forma descrita no inciso II do art. 585 do Código de Processo Civil: se as partes firmam um contrato de mútuo ou uma confissão de dívida – fazendo assinar o instrumento particular por duas testemunhas -, que significado tem inserir em tais contratos uma cláusula compromissória, seguida de uma cláusula de eleição de foro? A vontade dos contratantes resulta clara: se houver alguma controvérsia sobre o contrato (que também constitui título executivo), não deverão os contratantes recorrer ao Poder Judiciário, mas sim aos árbitros; mas, para resolver eventual crise de inadimplemento, as partes já têm título executivo, de maneira que a via adequada é o processo de execução (e os árbitros não têm naturalmente competência para medidas satisfativas), que será capitaneado pelo juiz estatal da comarca previamente eleita pelas partes (eleição de foro). Coordenam-se, mais uma vez harmonicamente, a cláusula compromissória e a cláusula de eleição de foro. Mas, proposta a demanda executiva, o que fazer com os embargos à execução que o devedor poderá manejar? Parece razoável deduzir que, havendo cláusula compromissória – e tratando os embargos de matéria de fundo (validade, eficácia e extensão do título executivo) -, caberá levar tais questões aos árbitros, tocando ao juiz togado apenas o julgamento de embargos que tratem de questões processuais. (Considerações sobre a cláusula compromissória e a cláusula de eleição de foro. In Arbitragem: Estudos em homenagem ao Prof. Guido Fernando da Silva Soares, in memoriam. Coord. Carlos Alberto Carmona, Selma Ferreira Lemes e Pedro Batista Martins. São Paulo: Atlas, 2007, p. 43)

Vale lembrar, ainda, que a pactuação válida de cláusula compromissória possui força vinculante, obrigando as partes da relação contratual a respeitar, para a resolução dos conflitos dai decorrentes, a competência atribuída ao árbitro (REsp 1.277.725/AM, Rel. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma, DJe 18/3/2013).

Dessa forma, se os argumentos de defesa do devedor disserem respeito a apreciação de questões formais do título ou atinentes aos atos executivos, deve ele opor embargos à execução ou exceção de pré-executividade, dependendo do caso. Já, se esses argumentos se relacionarem com o mérito do título executivo em que inserida a cláusula arbitral, só o juízo arbitral será o competente para sua análise.

Reconhecida a possibilidade de concomitância do juízo estatal e do arbitral e apontado quem é o juízo competente para decidir as questões trazidas, há que se reconhecer, no presente caso, a derrogação do juízo estatal para apreciar as teses levantadas por C. S.A., nas razões da exceção de pré-executividade que manejou, pois somente apontou questões atinentes ao próprio crédito previsto no título executivo extrajudicial objeto da execução contra ela movida (ausência de título executivo na medida em que o contrato não é certo, líquido e, tampouco, exigível).

Como consequência do posicionamento aqui adotado, há que ser rejeitada a exceção de pré-executividade diante da existência da já mencionada cláusula compromissória, com a imediata suspensão da execução até final decisão proferida no juízo arbitral, nos termos do art. 919, § 1º, do NCPC, aplicado de forma analógica porque preenchidos os seus requisitos tendo em vista a penhora realizada à e-STJ, fl. 900.

No mais dou por prejudicada a análise das demais teses trazidas no apelo nobre interposto por A. LTDA. e H. S.A..

Nessas condições, DOU PROVIMENTO ao recurso especial de modo a rejeitar a exceção de pré-executividade manejada por C. S.A

STJ

#cláusula #arbitral #execução #competência #mérito #judicial

Foto: divulgação da Web

Compartihe

OUTRAS NOTÍCIAS

Trabalhador que passa por desvio de função tem direito à diferença de salário entre os cargos
Embargos de declaração não são meio para reabrir questões de prova
Negada indenização a transexual que teria sido impedida de usar banheiro feminino