Num parecer favorável à extradição de um policial argentino acusado de ter participado de torturas durante a ditadura argentina, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se favorável à punição, também no Brasil, de agentes militares que cometeram violação semelhante, além de morte e desaparecimento de militantes de esquerda. Para Janot, esses crimes são imprescritíveis e não estão cobertos pela Lei da Anistia, diferentemente do que havia sustentado seu antecessor, Roberto Gurgel, e o próprio Supremo tribunal Federal.
A divulgação do parecer não agradou a ministros do STF que sequer analisaram o pedido de prisão do argentino, o que poderia até facilitar uma fuga de Montenegro, o argentino alvo do pedido de extradição. O parecer de Janot foi retirado ontem da página da PGR, onde ficou exposto por dez dias. A posição de Janot animou ex-presos políticos e defensores da punição para os militares acusados de praticar esses crimes na ditadura. Gilney Vianna, ex-perseguido e coordenador do Projeto Direito à Memória e à Verdade da Secretaria de Direitos Humanos, crê que a manifestação de Janot pode reverter a decisão do STF. O Supremo já decidiu que a anistia atingiu todos os crimes e, portanto, os torturadores não poderiam ser responsabilizados criminalmente no Brasil. – O procurador foi além do caso do argentino e colocou três questões fundamentais: que o direito internacional, suas convenções, precisam ser internalizadas; declarou serem imprescritíveis esses crimes; e entendeu ser o sequestro um crime permanente. É uma esperança para os familiares de dezenas de desaparecidos políticos – disse Gilney. Mas o STF, em setembro, já examinou caso parecido e não mudou o entendimento sobre a anistia. Num caso de sequestro, o tribunal considerou que o crime de sequestro na ditadura e até hoje não esclarecido pode justificar a extradição do estrangeiro. O presidente da Comissão de Anistia, Paulo Abrão, destaca que o parecer de Janot inova ao defender que também são imprescritíveis outros tipos de crime contra a humanidade, como genocídios, massacres e torturas generalizadas. Por outro lado, Abrão ressalta que o parecer não se estende aos crimes cometidos na ditadura: – Se não houver resposta séria e forte para esse tipo de crime, estamos sinalizando para o futuro uma regra de ouro, que é qual? Ditadores do futuro, torturadores do futuro, genocidas do futuro, loucos do futuro, novos Hitleres do futuro, façam o que quiser, só não se esqueçam de antes de sair do poder aprovar para vocês mesmos uma lei que perdoa as ações que vocês fizeram.
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