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Retrocessos da ciência juridica

Duas estruturas normativas empobreceram a ciência jurídica brasileira nos últimos tempos. A primeira delas concerne à repressão à lavagem de dinheiro.

   Duas estruturas normativas empobreceram a ciência jurídica brasileira nos últimos tempos. A primeira delas concerne à repressão à lavagem de dinheiro. A preocupação com o tema é universal e justa. A segunda ao empenho normativo para que a mortandade no trânsito em nosso país seja combatida por todos os meios. Também, obviamente justa.   Não obstante, o legislador, estando ou não sob o impacto de guerras, jamais deve abandonar a prudência no processo de criação das normas jurídicas. Direito (juris) e prudência (prudentia) formaram, nos primórdios da civilização, a jurisprudência, que tinha sentido mais amplo do que o atual, a refletir a sucessão de precedentes judiciários harmônicos, diuturnos e consolidados. Envolvia a produção integral do homem no sentido de guiar adequadamente o convívio social. Talvez a importância dos temas, e pressa, tenha prejudicado a prudência, nas duas referidas hipóteses.   A nova lei repressiva do crime de lavagem de dinheiro (Lei nº 12.683) erradicou a enumeração necessária e taxativa dos crimes antecedentes. Desse modo, fica ao arbítrio do magistrado criar a norma penal. Logo, em tese, qualquer crime contra o patrimônio pode implicar em ilícito de lavagem, cuja pena, em regra, é significativamente mais exacerbada que a prevista para a ilicitude prévia. Derrogou-se o imemorial princípio do “nullun crimen, nulla pena sine previa lege”, uma óbvia garantia do direito penal democrático. Além disso, criou-se o dever de todo e qualquer profissional liberal (os advogados não são afastados da abrangência da lei) de comunicar ao COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), a realização de todo e qualquer negócio jurídico celebrado com seus clientes ou constituintes. Mais: estão impedidos, inclusive, de transmitir o comunicado feito ao próprio cliente interessado, numa quebra de confiança e do correto relacionamento entre profissionais e tomadores de seus serviços. A CNPL (Confederação Nacional das Profissões Liberais) submeteu o segundo aspecto ao crivo do E. Supremo Tribunal Federal. Confederação de natureza sindical, carece de pertinência temática para levar à Corte Suprema o tema dos crimes antecedentes. Outra ação direta de inconstitucionalidade foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, porém também restrita ao segundo aspecto e, mais ainda, sob o corporativismo restrito da defesa exclusiva dos profissionais do direito. O arbítrio judicial está em pé. Provavelmente, ninguém tem coragem de antepor a ciência jurídica ao crime organizado, que, como se verifica, é capaz de destruir o Estado e arraigado s princípios civilizatórios.   A lei nº 12.760, de 20 de dezembro de 2012, rotulada de lei seca ou de tolerância zero, pecou por um simplismo draconiano. O motorista, examinado por instrumentos manuseados pelos policiais e de diversas qualidades tecnológicas (sinais que indiquem alteração da capacidade psicomotora, teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento), se constatado em sua fisiologia 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar terá sua carteira de habilitação apreendida pelo longo prazo de 1 ano e, ainda, estará submetido a uma multa de perto de 2 mil reais. Ainda que se encontre no limite mínimo. Não há matizes, variantes, compatíveis com os graus diversos de periculosidade que a conduta possa acarretar. O livre convencimento da autoridade, aqui admissível, entre parâmetros mínimos, médios e máximos, foi ignorado pelo legislador, e seguido, como não poderia deixar de ser, pelo Contran, ao baixar a Resolução nº 432, de 23 de janeiro de 2013.  Se o índice for igual ou superior a 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue (d/L) ou igual ou superior a 0,34 miligrama de álcool por litro de ar alveolar expirado (0,34 mg/L) haverá prisão em flagrante e instauração do processo penal. Se procedente a ação penal, o juiz poderá empreender a dosimetria da pena, direito que não foi outorgado à autoridade administrativa, na hipótese anterior. Por outro lado, como os apressados legisladores não poderiam insultar um princípio constitucional, o motorista pode se recusar ao exame pericial. Será processado, mas sua sorte dependerá de prova testemunhal (dentre todas, a havida como prostituta). Evidentemente, poderemos conviver com injustiças.   As razões expostas e ainda outras, que podem ser acrescidas pela comunidade jurídica, nos convencem que ambos os recentes marcos regulatórios de nossa vida social merecem uma paciente e profunda revisão.

   

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