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Direito de preferência e condomínio de imóvel urbano divisível

Convém, porém, atentar para a limitação da regra atinente ao chamado direito de preferência que visa assegurar o direito que tem o condômino de coisa indivisível de se opor a participar de condomínio com um ou mais estranhos

O art. 504 do vigente Código Civil, seguindo o modelo já anteriormente adotado pelo art. 1.139 do Código Civil de 1916 e respeitando a jurisprudência que, na vigência deste, se construiu, dispõe sobre o direito de preferência do condômino de coisa indivisível sobre a venda da parte ideal pertencente a outro condômino, desse mesmo condomínio. Adverte a referida norma que o condômino de coisa indivisível, que não teve prévio conhecimento da venda, poderá, mediante prévio depósito do preço, no prazo estipulado, haver para si a parte do condomínio vendida a estranho. Veja-se o teor do art. 504 do vigente Código Civil, verbis:

“ Art. 504 — Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência.”

Tal norma legal em nada se afasta da norma (sua irmã gêmea) constante do art. 1.139 do Código Civil de 1916, verbis: “ Art. 1.139 — Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranho, se o requerer no prazo de 6 (seis) meses”.

Convém, porém, atentar para a limitação da regra atinente ao chamado direito de preferência que visa assegurar o direito que tem o condômino de coisa indivisível de se opor a participar de condomínio com um ou mais estranhos. É que o art. 504 do atual CC não se aplica aos condomínios de coisas divisíveis. Em se tratando de condomínio de coisa divisível, como ocorre na hipótese de condomínio de terreno urbano com 10, 12 ou 20 mil m², de ocorrência tão comum nas Quadras do Lago Norte e do Lago Sul de Brasília, não há se falar de direito de preferência do condômino; tal direito, no caso, não existe.
Na interpretação e aplicação do direito de preferência, quando se trate de imóvel urbano divisível, o condômino proprietário de parte ideal de tal imóvel poderá vender a sua parte a estranhos sem prévia oferta aos demais condôminos, desde que a parte por ele vendida atinja a área mínima exigida pela legislação local para constituição e registro como parte autônoma, com a pertinente averbação junto à matrícula do imóvel.

A par do indiscutível direito que tem cada condômino de alhear ou gravar a sua parte ideal no condomínio, quando a coisa for por sua própria natureza divisível, embora ainda não tenha sido feita a convenção de divisão, a todo tempo lhe será lícito exigir que se faça a divisão. E não há se falar da preferência de que tratam o art. 504 do vigente Código Civil e o art. 1.139 do Código de 1916. É que a lei, repita-se, só confere direito de preferência ao condômino para aquisição da parte ideal pertencente a outro condômino, quando a indivisibilidade da coisa é natural ou por destino, e não quando (como ocorre nos condomínios do Lago Norte e do Lago Sul de Brasília), sendo a coisa perfeitamente divisível, se encontre momentaneamente indivisa, a depender de formalidade para se destacar do todo a parte de cada um. O art. 87 do vigente Código Civil bem informa o conceito legal de bens divisíveis.

Leciona Maria Helena Diniz, em seu Curso de Direito Civil Brasileiro, ao versar sobre a classificação dos bens, entre divisíveis e indivisíveis, que “ são divisíveis (CC, art. 87) os bens que puderem ser fracionados em partes homogêneas e distintas, sem alteração das qualidades essenciais do todo, sem desvalorização ou diminuição considerável de valor e sem prejuízo do uso a que se destinam” (…).

“Por outro lado as coisas podem ser indivisíveis (CC, art. 88): Por natureza, quando não puderem ser partidas sem alteração na sua substância ou no seu valor. P.ex: um cavalo vivo dividido ao meio deixa de ser semovente (RT, 227:603; 185:993);” (autor cit., obra cit. — Vol. 1, pág. 340 — Saraiva, 25ª edição — 2008)

E conclui, a douta Maria Helena Diniz, na página seguinte daquela mesma obra, explicitando que o condômino de coisa divisível poderá alienar sua parte da coisa sem sequer consultar seus consortes: “Importante é a delimitação de divisibilidade e da indivisibilidade porque: … 2) Na extinção do condomínio, se divisível o bem, ter-se-á a divisão, recebendo cada comunheiro o seu quinhão; se indivisível, ante a recusa dos condôminos de adjudicá-lo a um só deles, indenizando os demais, o bem será vendido, e o preço repartido entre eles (CC, art. 1.322; RF, 187:237; 161:171). 3) O condômino de coisa divisível poderá alienar sua parcela a quem quiser, sem ter qualquer obrigação para com seus consortes, porém, se o bem for indivisível, não poderá vende-lo a estranho, se o outro comunheiro o quiser, tanto por tanto.” (autor cit., obra cit. — Vol. 1, pág. 341 — Saraiva, 25ª edição — 2008)

No exemplo aqui citado, de lote de terreno destinado a fins residenciais, situado no Lago Norte ou no Lago Sul de Brasília, com 10, 12 ou 20 mil m², portanto bem imóvel que comporta fracionamento em quatro ou cinco partes sem alteração de sua substância (bem imóvel); sem alteração do uso a que se destina (fim residencial), e sem diminuição considerável de seu valor (pelo contrário, é público e notório que o fracionamento do lote em várias partes valoriza o imóvel), não se cogita do direito de preferência; e o condômino poderá alienar livremente sua parcela a quem quiser. E o Código de Posturas do Distrito Federal, Lei Complementar 17/97 e legislação posterior, inclusive Decreto nº 26.156 do overnador do Distrito Federal publicado no Diário Oficial de 31 de agosto de 2005, permitem que tais lotes de terrenos destinados a fins residenciais sejam divididos em frações autônomas.

Desde quando vigente a norma do art. 1.139 do antigo Código Civil, praticamente idêntica à do art. 504 do código atual, se faz presente a distinção entre coisas divisíveis e coisas indivisíveis, para fins de concessão de direito de preferência. Tanto que já de há muito afirma Clóvis Beviláqua, “… dando o Código direito de preferência ao condômino, quando a coisa é indivisível, segue-se que não há esse direito, quando a coisa for divisível inclusio unius exclusio alterius“ (Código Civil Comentado — 6ª edição, vol. IV, pág. 306 “ ( autor cit., obra cit., vol. 16 – pág. 169 – 2ª edição) À luz do direito positivo em vigor há mais de 90 anos em nosso país, em se tratando de coisa divisível, mesmo que ainda não dividida, o condômino proprietário de uma parte não poderá invocar direito de preferência sobre outra, de sorte a obrigar que o outro condômino lhe venda, tanto por tanto, a parte oferecida a um estranho. Porque a regra de que trata o art. 504 sob comento é destinada, exclusivamente, ao condomínio de coisa indivisível e que só se extinguirá com a alienação de todo o bem. Destarte, inaplicável ao condomínio de coisa divisível.

Autor: WALDEMIR BANJA
Advogado, professor de Direito Processual Civil, juiz de direito aposentado do TJDF.
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