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Características da obrigação de dar coisa certa

O objeto da obrigação de dar pode ser um bem móvel ou um bem imóvel.

Características da obrigação de dar coisa certa — O Código Civil abre o Direito das Obrigações com a obrigação de dar coisa certa, opção sem motivação técnica relevante. Obrigação de dar é a que se realiza mediante o deslocamento físico ou jurídico de um bem, que migra do patrimônio do sujeito (devedor) a quem cabe satisfazer o dever, imposto pela lei, pelo negócio jurídico ou pela sentença, ao do outro sujeito (credor).
O objeto da obrigação de dar pode ser um bem móvel ou um bem imóvel. A satisfação da obrigação de dar bem móvel se concretiza com a tradição (1); a de bem imóvel, com o registro. A obrigação de dar coisa certa exige que o bem se mostre definido e preciso quanto às características relacionadas ao gênero, qualidade, quantidade e funcionalidade.
Coisa certa é aquela que se conhece, porque se define com a propriedade que está fora do exercício da dúvida ou da incerteza. A coisa certa se apresenta precisada, especificada, caracterizada, conhecida na integração do ato jurídico (latu sensu). Uma coisa certa (um bem jurídico) (2) nem sempre carrega os atributos da singularidade ou da inconfundibilidade.
Uma coisa certa pode ser singular, por ser a única existente; pode ser inconfundível, por dispor de uma marca (sinal) diferenciadora. No entanto, uma coisa certa nem sempre é única ou exclusiva, se houver outra com que se identifique pela similitude de particularidades, se já têm a mesma qualidade, a mesma quantidade e a mesma funcionalidade.
Coisa certa não significa coisa idêntica; coisa certa não implica, pois, uma única coisa ou coisa única. Para o cumprimento da obrigação de dar coisa certa, o que importa é que o bem tenha mesmo gênero, qualidade e quantidade. Assim é que se executa a obrigação de dar coisa certa mediante a entrega do bem prometido, original ou similar, desde que apresente as mesmas características quanto ao gênero, qualidade, quantidade e funcionalidade.
A mesma característica em gênero quer dizer identidade de tipo, com propriedades em comum; a mesma característica em qualidade significa igualdade de atributos; a mesma característica em quantidade implica identidade de medida de valor ou de unidade; e a mesma característica em funcionalidade se traduz pela semelhante capacitação.
Similar não é coisa diferente do bem comprometido na obrigação de dar coisa certa, porque, segundo se ressaltou, nem todo bem é único ou singular. O que importa para que se repute bem cumprida a obrigação é a presença simultânea das características da coisa prometida.
Os acessórios e a obrigação de dar coisa certa — A regra estabelece que a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios, ainda que silenciados. A regra é, pois, a de que a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios; enquanto a exceção depende de explicitação formal ou das circunstâncias do caso.
Para que a satisfação da obrigação seja limitada à coisa principal (2), faz-se necessário que se insira disposição manifesta no instrumento (ou título), no qual se expressou o ato ou o negócio jurídico, segundo a qual os acessórios que compõem ou integram o bem se acham preservados, sem que, pois, fossem abrangidos.
Também, admite-se a hipótese de exclusão dos acessórios do ato ou do negócio jurídico quando as circunstâncias do caso assim sugerirem ou prevalecerem, como resultado de conclusão extraída das particularidades sob as quais se firmou a obrigação. Portanto, há duas situações que autorizam que a coisa certa, compreendida na obrigação, fique desornada dos acessórios: a) uma explícita; e b) uma implícita.
A explícita se revela formalmente, no próprio instrumento, com precisão e objetividade, de tal sorte que se afugentam as dúvidas ou incertezas quanto aos bens ou coisas acessórias excluídas do objeto principal do ato ou do negócio jurídico. Exige-se que, no instrumento em que se lançou a obrigação, haja a definição da coisa (do bem), mas com a ressalva segundo a qual os acessórios não integram o ato ou o negócio.
À falta da ressalva formal e particularizada, a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios, sem que seja necessária a individualização de cada um dos bens secundários, se outra inferência não se formar em face do caso concreto. A implícita situação se deduz pelo concurso de elementos que compõem a circunstância, segundo balizas que identificam a possibilidade, sob a influência da razoabilidade e da proporcionalidade, de a obrigação de dar coisa certa abranger, também, os acessórios do bem principal.
Diz-se, conseguintemente, que o simples silêncio ou omissão — leia-se falta de ressalva no instrumento — não se impõe como regra absoluta para que a obrigação de dar coisa certa também absorva os acessórios. No caso de silêncio, o trabalho interpretativo sobre o alcance da vontade contida no ato ou no negócio jurídico se reforça com a invocação da razoabilidade e da proporcionalidade.
Incumbe ao intérprete, no exercício de cognição sobre o alcance da vontade, vasculhar, na relação jurídica, os indicativos do bom senso, mediante a análise do que seria razoável e proporcional (justo) na composição dos interesses comutados. Carece de razoabilidade e de proporcionalidade a construção de intérprete que suponha que os acessórios foram abrangidos numa obrigação de dar coisa certa, se a inserção implica desequilíbrio na relação jurídica, com claro prejuízo para um dos protagonistas.
Portanto, não se pode inflar o bem principal, objeto da obrigação de dar coisa certa, com bens acessórios, se o inchaço representar distorção das bases do ato ou do negócio jurídico, com perda razoabilidade e da proporcionalidade.

(1) A tradição da coisa móvel pode ser material (real) ou ficta (simbólica), conforme a natureza e o bem que compõe o negócio jurídico.
(2) Dissemos: “Um bem preenche uma necessidade ou supre um interesse de ordem material ou imaterial, sem perder o predicativo que a ordem jurídica reconhece como relevante, a exigir tutela.No mundo dos fatos, uma coisa pode ser corpórea ou incorpórea, segundo critério que lhe define a natureza material ou imaterial. No mundo do direito, uma coisa, corpórea ou incorpórea, pode ser uma coisa ou um bem, segundo a qualidade que dispuser para preencher uma necessidade ou um interesse do homem. Assim, no direito, todo bem é uma coisa; mas nem toda coisa é um bem. Coisa é gênero de que são espécies: a) a coisa, sem expressão econômica, social ou moral; e b) o bem” (in Comentários ao Código Civil, Tomo I, Lumen Juris: 2009, p. 128).
(3) Sobre a divisão dos bens reciprocamente considerados, o Código Civil os classificou em: a) principal; e b) acessório. Os bens principais são aqueles que têm existência independente e própria, sem subordinação de natureza jurídica que lhe exija vinculação a outro bem. Os bens acessórios são aqueles cuja existência supõe ao do principal. Classificam-se em: a) frutos; b) produtos; c) rendimentos; d) acessões; e) benfeitorias; e f) pertenças. Vide nossos Comentários ao Código Civil, Tomo I, Lumen Juris: 2009, p. 143/153).

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