Uma fábrica de estofados de Minas Gerais terá de indenizar um trabalhador por danos morais porque anotou em sua carteira de trabalho que ele perdeu o direito a férias por ter faltado 37 vezes ao trabalho no período de um ano.
A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a decisão do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais e não conheceu do recurso da empresa Nativa Indústria do Mobiliário S/A, de Lagoa Santa (MG). A fábrica terá de pagar indenização de R$ 5 mil ao estofador pelos danos causados a sua vida profissional.
O relator do recurso, ministro Emmanoel Pereira, afirmou que é inegável que a anotação na carteira do trabalhador “de faltas ao serviço, quando, inclusive, já punido com a perda do direito à fruição das férias, é ato a causar-lhe enormes dificuldades na tentativa de ser reaproveitado no mercado de trabalho, diante do inevitável tratamento discriminatório que receberá, em virtude do registro do ato faltoso”. O recurso da empresa nem chegou a ter o mérito analisado.
Segundo o advogado do estofador, quando ele recebeu a proposta de emprego avisou que fazia “uns bicos” e que necessitaria mantê-los. O dono da firma teria concordado com a manutenção de suas atividades, o que implicaria em algumas faltas ao serviço.
O empregador nega que tenho aceito tal condição. Ainda segundo o estofador, ele procurava conciliar os bicos com períodos de pouca demanda de serviço na empresa. Para executar serviços particulares em casa, o empregado faltou ao serviço, o que levou a empresa a registrar em sua carteira de trabalho a seguinte anotação: “perda do direito à férias por motivo de 37 faltas injustificadas no período aquisitivo, conforme o artigo 130 da CLT”.
O dispositivo da CLT estabelece uma proporção entre o número de faltas e o período de férias. O empregado terá 30 dias corridos de férias quando não houver faltado ao serviço mais de cinco vezes. Terá 24 dias corridos de férias, caso tenha faltado de seis a 14 vezes. Se o número de faltas tiver ficado entre 15 e 23, o empregado terá 18 dias de férias. Finalmente, as férias serão de 12 dias corridos quando o empregado tiver entre 24 e 32 faltas. O artigo 130 da CLT dispõe que é vedado ao empregador descontar as faltas do empregado ao serviço do período das férias.
A perda do direito à férias, o não recolhimento do FGTS e o pagamento de salário “por fora” levaram o eempregado a pedir a rescisão indireta do contrato do trabalho por descumprimento das obrigações contratuais pelo empregador. Na ação, sua defesa também reivindicou o pagamento de indenização por danos morais após comparar a atitude da empresa ao processo de Inquisição, acusando, condenando e executando.
“Ao assim proceder, a empresa praticou dano moral puro e irreversível contra o trabalhador, procedendo verdadeira morte civil, pois todas as vezes que procurar emprego em qualquer empresa, vai constar que não é um bom empregado”, argumentou seu advogado.
Em primeira instância, a caracterização da rescisão indireta do contrato de trabalho foi negada pela 16ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Mas o juiz acolheu o pedido de indenização por danos morais, arbitrando o valor da condenação em R$ 5 mil.
Na sentença foi registrado que anotações desse tipo não estão autorizadas por lei ou por portarias do Ministério do Trabalho. “No espaço da CTPS (carteira de trabalho) destinado à anotação de férias, cabe ao empregador registrar as férias usufruídas, ou seja, os períodos aquisitivo e concessivo, jamais os motivos pelos quais o empregado deixou de usufruí-las”, afirmou o juiz.
Ambas as partes recorreram à segunda instância. O tribunal acolheu o pedido de rescisão indireta feito pelo estofador e manteve a condenação por danos morais contestada pela Nativa Indústria do Mobiliário S/A.
Os desembargadores reconheceram a existência de faltas ao serviço, mas consideraram que o trabalhador foi suficientemente apenado pela má conduta quando perdeu o direito às férias.
“Este tipo de anotação não deve constar da CTPS pois provoca prejuízos e constrangimentos ao empregado na procura de novo emprego”, registrou o acórdão regional, mantido em todos os termos pela 1ª Turma da Corte Trabalhista.