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Divulgação de grampos telefônicos provoca paranóia

A enxurrada de grampos telefônicos divulgados pelo Brasil afora tem mudado o comportamento dos profissionais do Direito ao telefone.

A enxurrada de grampos telefônicos divulgados pelo Brasil afora tem mudado o comportamento dos profissionais do Direito ao telefone. E não é só da escuta ilegal, aquela encomendada pelo desafeto, concorrente ou cônjuge. “Os juízes estão autorizando a fazer investigação prospectiva. Amanhã não saberemos se o meu ou o seu telefone estará grampeado”, disse o advogado José Gerardo Grossi, ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral, à revista Consultor Jurídico. E acrescentou: “Sempre acho que estou grampeado. Trato meus telefonemas como se grampeados estivessem”.

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Edson Vidigal, evita atender telefonemas de números desconhecidos em seu celular. “Só atendo quando vejo que é da minha casa, da minha mulher e do meu gabinete”, contou. A informação é confirmada durante a entrevista para a ConJur quando seu celular toca. Ele olha o número antes de atender, sorri e diz: “É do meu gabinete”. Em seguida, atende sem receio.

Segundo o ministro, “inocentes pagam por pecadores na medida em que são citados em conversas de terceiros”. Vidigal lembrou ainda que “ninguém está livre de ser citado em conversas de outras pessoas”. E ressalvou: “Não se sabe inclusive se conversas como essas são previamente armadas”.

O presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Francisco Fausto, assim como Grossi e Vidigal, também tem receio de ser grampeado. De vez em quando pede para a Polícia Federal fazer “varredura” nos telefones do TST.

A paranóia fixa novas condutas. Na Advocacia-Geral da União, já no governo passado, pedidos de audiência devem ser feitos previamente por fax. Essa regra, no STF, foi adotada pelo ministro Nelson Jobim. Ministros antes acessíveis, como Carlos Velloso, agora filtram cautelosamente os caqndidatos. Outros, prudentemente, cercam-se de alguma testemunha mesmo quando o despacho é o mais rotineiro. Mesmo fora do trabalho, em clubes ou em restaurantes olhar em volta antes de falar sobre temas mais sérios virou um reflexo condicionado.

Conversas bisbilhotadas

Para Grossi, os grampos telefônicos não têm sido usados para fazer justiça no Brasil e sim para atrapalhá-la “cruelmente”. Ele disse que na Operação Anaconda diversas conversas foram “bisbilhotadas para se aproveitar menos de dez”. O advogado questionou se a “bisbilhotice” permite algum resultado.

Outro ministro que não se quis identificar também questiona: “O meliante que se sabe grampeado pode usar o veneno como antídoto em seu favor”. Ou seja, para complicar a investigação ou afastar de si o foco, o bandido usaria o próprio grampo para fazer a sua contra-informação ou jogar cascas de bananas no caminho da polícia. “Eventualmente, pode ser ingenuidade dos investigadores se acharem mais preparados que os investigados”, assesta o juiz.

O presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Nilson Naves, considera que “há excesso de autorizações judiciais para as interceptações telefônicas”. De acordo com ele, a Polícia Federal e o Ministério Público estão pedindo interceptações “muitas vezes sem indícios de prova”. Naves disse que o direito à inviolabilidade é mais importante que o direito à quebra de sigilo.

O vice-presidente do TST, Vantuil Abdala, assim como Fausto, é favorável aos grampos telefônicos desde que haja autorização judicial. “E para isso não basta somente a cisma do Ministério Público. É preciso pelo menos indícios de provas”, disse Abdala. Segundo ele, o uso de escutas telefônicas autorizadas, em tese, pode ajudar a fazer Justiça no Brasil.

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, concorda que os grampos telefônicos autorizados teoricamente podem ajudar a fazer justiça. “Na Itália, a escuta foi decisiva para acabar com a máfia”, ressaltou. Porém, ele lembrou que não há estatísticas no Brasil sobre o assunto.

Fausto disse que as escutas têm ajudado a descobrir escândalos. “Pode não ser justo para quem é grampeado”, ironizou. Para ele, grampos telefônicos usados na Operação Anaconda, por exemplo, são justificáveis. O presidente do TST ressalvou, entretanto, que não é de conhecimento público casos de escutas telefônicas sem sucesso.

O ministro do TST, Lélio Bentes, também é a favor do grampo telefônico autorizado. Ele discorda daquilo que Grossi chamou de bisbilhotice. “Se for preciso ouvir várias conversas para se chegar a um grupo de pessoas, já é um ganho enorme”, afirmou.

Para o ministro do STF, Marco Aurélio, os grampos telefônicos têm ajudado a fazer justiça no Brasil. Mas ele frisou que “para serem autorizados é preciso que sejam indispensáveis”. Para o ministro, o Ministério Público atua de forma elogiável nas investigações.

O ministro do STJ, Luiz Fux, disse que “a gravação telefônica legalmente obtida tem ajudado a esclarecer fatos que não viriam à tona naturalmente para a sociedade”. Fux apenas criticou a divulgação de conversas de terceiros que não são investigados nos processos.

Todos os entrevistados repudiaram os grampos telefônicos feitos sem autorização judicial.

Caminho das pedras

De acordo com Grossi, as autorizações para grampos telefônicos deveriam ser regulamentadas no Brasil. “Atualmente, há telefones que ficam grampeados o ano inteiro quando a Lei n 9.296/96 permite escutas somente por 15 dias prorrogáveis por mais 15. Juízes não têm cumprido a lei”, ressaltou.

O ministro substituto do TSE disse que as fitas de grampos telefônicos deveriam ser carimbadas pela Justiça. “Assim, não há perigo de ser entregue ao juiz somente uma parte e a outra ser usada para fazer chantagem”, afirmou. Segundo Grossi, somente os juízes que autorizam as interceptações telefônicas deveriam receber as fitas gravadas. “Em um caso que atuo, as fitas gravadas foram diretamente para o Ministério Público. As conversas vazaram imediatamente”, criticou.

Vidigal afirmou ainda que “o uso do grampo telefônico precisa ser conciliado com o direito à privacidade”. Para o ministro, grampos telefônicos têm sido usados indiscriminadamente no Brasil. Ele disse que o País vive um “estado de neurose”.

O ministro sugeriu a criação de uma central de grampos telefônicos, coordenada pelo Poder Judiciário com assistência técnica do Ministério Público e STJ para acompanhar as investigações. “Tecnicamente, isso é possível”, afirmou.

Leitores opinam

O uso dos grampos telefônicos tem sido usado para fazer justiça no Brasil. É o que aponta a enquete feita pela revista Consultor Jurídico. Até o fim da tarde desta sexta-feira (27/11), 70% dos 1.352 leitores que votaram opinaram nesse sentido. Apenas, 15% discordam. E 14% disseram que às vezes o uso de escuta ajuda a fazer justiça no País.

O advogado de Salvador, Maurício Cantão, disse que “se o grampo tiver fins sérios e observar procedimentos legais para o caso é, sem dúvida, poderoso instrumento para aplicação de Justiça”. O advogado de São Paulo, Marcelo Levy Garisio Sartori, afirmou que “o grampo telefônico deve ser utilizado nas hipóteses em que não há nenhum outro modo de se obter a verdade real dos fatos”. Para o advogado Antonio Fernandes Neto, também de São Paulo, “o uso de escutas telefônicas não ajuda a fazer justiça, mas ajuda nas investigações”.

De acordo com o juiz aposentado de São Paulo, Homero Benedicto Ottoni Netto, “a escuta telefônica beira, perigosa e tentadoramente, o arbítrio e, se executada com ponderação e controle em nome da moralidade pública e da defesa da cidadania, pode ser autorizada”. Ele acrescentou que a “sua fiscalização, porém, deve ser rigorosa e punidos aqueles que dela abusarem”.

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