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A PROPOSTA DA ADOÇÃO DAS PRISÕES PRIVADAS

A PROPOSTA DA ADOÇÃO DAS PRISÕES PRIVADAS

ALEX GUILHERME SANTOS MARTINS
ACADÊMICO DE DIREITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DE JOÃO PESSOA- UNIPÊ

SUMÁRIO

1- INTRODUÇÃO. 2- DESENVOLVIMENTO. 2.1. A PROPOSTA DAS PRISÕES PRIVADAS. 2.2. AUTORITARISMO E GESTÃO DA VIOLÊNCIA. 3- CONCLUSÃO. 4-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

1- INTRODUÇÃO

A partir da experiência internacional da política de privatização de presídios, que em meados da década de 80, primeiramente nos EUA, e a seguir em outros países industrializados, como Inglaterra, França, Canadá e Austrália, tornaram-se realidade, discuta-se no Brasil a viabilidade da adoção das prisões privadas como resposta à crise do sistema penitenciário brasileiro.
Diante desse debate nacional acerca da possibilidade da privatização de presídios, investigaremos as circunstâncias sob as quais as prisões privadas foram propostas no Brasil, a partir da análise dos fatores que poderiam explicar a sua atratividade no contexto periférico brasileiro.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. A PROPOSTA DAS PRISÕES PRIVADAS

A privatização de presídios, entendida como política penal destinada ao enfretamento da crise do sistema penitenciário brasileiro, ganhou foros de legitimidade e tem sido defendida por seus advogados no Brasil a partir de uma leitura e de uma apropriação seletivas da experiência internacional .
O sistema penitenciário brasileiro tem passado uma série por uma série de distorções estruturais, como a superpopulação. Atualmente, o número de presos já supera o dobro do número de vagas oferecidas pelo sistema.
Verifica-se no Brasil a intensificação do uso da prisão como estratégia privilegiada de controle social, pois nos últimos anos a taxa de encarceramento tem subido significativamente.
Diante das péssimas condições de encarceramento que caracteriza a quase totalidade dos estabelecimentos penitenciários brasileiros, a violência medra, tanto entre detentos, quanto entre detentos e agentes penitenciários. Entre detentos, com graus e requintes inusuais, Espancamentos, estupros e esfaqueamentos são práticas recorrentes, em razão de briga por comida, por cigarros; tem muito estupro de jovens prisioneiros; os jovens são vendidos pelos guardas que os colocam nas celas dos compradores. No entanto, a manifestação mais grotesca de violência entre os detentos é o assassinato como forma de protesto contra as condições de encarceramento. Da parte dos agentes de segurança, a violência contra os detentos é lugar comum. A tortura e os maus-tratos permanecem práticas corriqueiras no sistema, de que são exemplos os choques elétricos e o pau-de-arara. Além disso, procedimentos internos de segurança têm legitimado a aplicação arbitrária de penalidades, que podem variar da advertência ao encarceramento em solitária, e invariavelmente abusos são detectados. Logo, previsivelmente, o sistema penitenciário brasileiro tem se defrontado com uma onda crescente de rebeliões.
Desta forma, no âmbito desse contexto, a partir de reflexões sobre as modernas e recentes experiências, que, nesse sentido, vêm sendo colocadas em prática em estabelecimentos prisionais dos EUA, da França, da Inglaterra e da Austrália tem sido proposta formalmente a adoção das prisões privadas no Brasil, a fim de uma verdadeira retomada de sonhos, destinada, entre outras coisas, a: atender aos preceitos constitucionais da individualização da pena e de respeito à integridade física e moral do preso; lançar uma política ambiciosa de reinserção social e moral do detento, destinada a confiar nos efeitos da reabilitação; introduzir, no sistema penitenciário, um modelo administrativo de gestão moderna; reduzir os encargos e gastos públicos; favorecer o desenvolvimento de salutar política de prevenção da criminalidade, mediante a participação organizada da comunidade nas tarefas de execução da pena privativa de liberdade; aliviar, enfim, a dramática situação de superpovoamento, no conjunto penitenciário nacional.
A proposta prevê ainda a criação de um Sistema Penitenciário Federal, ao qual caberia a responsabilidade pelo cumprimento da pena privativa de liberdade em regime fechado, permanecendo com os Estados a responsabilidade pelo cumprimento da pena privativa de liberdade em regime médio, semi-aberto e em regime aberto.
A admissão das empresas seria feita por conseqüência pública e os direitos e obrigações das partes seriam regulados por contrato. O serviço privado passaria a prover serviços penitenciários, tais como alimentação, saúde, trabalho e educação aos detentos, além de poder construir e administrar os estabelecimentos. Assim, a proposta diz respeito à suposta redução de custos que a privatização supostamente acarretaria para Estado e contribuintes.
Esta proposta é condenada por muitos setores da sociedade, que alegam em síntese que: a experiência está longe de ser moderna; a execução da pena é uma função pública intransferível; a proposta violaria direitos e garantias constitucionais dos presos; a política de privatização de presídios poderia dar margem a uma superpopulação do trabalho prisional, uma vez que, segundo disposição expressa da Lei de Execução Penal, o trabalho dos detentos é considerado relação jurídica de natureza administrativa, não estando sujeito ao regime da CLT.
Ainda que inegavelmente seja relevante questionar o retrato edulcorado da experiência norte- americana apresentado pelos defensores da privatização no Brasil, cumpre notar que o apelo das prisões privadas no contexto brasileiro parece derivar também de funcionalismo pouco explícitas a um padrão histórico autoritário de gestão do problema da violência, que passaremos a analisar.

2.2. AUTORITARISMO E GESTÃO DA VIOLÊNCIA

A política brasileira, historicamente, tem sido atravessada estruturalmente pelo uso continuado e generalizado da violência do aparato repressivo do Estado contra as classes sociais subalternas.
A porosidade das fronteiras entre a repressão política e o combate ao crime comum no século passado, será reposta em momentos históricos subseqüentes, nos períodos formalmente democráticos (1933-37 e 1945-64) e durante os tempos da ditadura militar, revelando-se a natureza política das estratégias de controle social no Brasil e sua centralidade ao mando das elites.
Como conseqüência desses desdobramentos, ocorre no Brasil um processo crescente de militarização do controle do crime: “a militarização da polícia tem levado a uma tendência de combate ao crime e de manutenção da ordem pública por meio de táticas mais apropriadas a uma operação militar”. Esse processo é reforçado pela manutenção, na Constituição de 88, da atribuição à polícia militar de uma função eminentemente civil: o policiamento ostensivo e o controle da ordem pública.
A militarização do combate ao crime tem implicado o aumento substancial do número de vítimas fatais da ação policial, que se caracteriza pelo recurso sistemático à força letal.
Como resultado desse continnum histórico de práticas autoritárias na gestão do problema do crime e da violência, as prisões brasileiras têm sido, ao fim e ao cabo, depósitos inumanos das classes marginalizadas.
A agravar a situação, um processo crescente de “dualidade de poderes” tem se sedimentado no Brasil pela expansão vertiginosa das empresas de segurança privada. Estima- se que tais empresas controlem atualmente um contingente de milhares de agentes de segurança, virtualmente o dobro do efetivo das Forças armadas.
Um cenário de disseminação das práticas violentas tem se constituído em solo fértil à consolidação e expansão do mercado brasileiro de segurança privada.
Um dos efeitos perversos da expansão das empresas de segurança privada no país têm sido a constituição e o desenvolvimento de um sistema de segurança de duas camadas, no âmbito do qual as elites brasileiras crescentemente se valem dos serviços privados, ficando o grosso da população submetido à truculência e ineficácia característica da segurança pública.
Complementarmente à expansão das empresas de segurança privada, o Brasil assiste à emergência de uma rede paralela de controle social pela proliferação de chacinas, linchamentos e execuções extrajudiciais levadas a efeito por justiceiros e “polícias mineiras”.Tais práticas têm se disseminado sobretudo nas zonas pobres e periféricas das grandes cidades, como as favelas, num autêntico processo de “privatização possessiva da justiça”.
De outra parte, a percepção e circulação simbólica da questão do medo da violência nas grandes cidades têm levado a uma privatização dos meios de segurança e uma redefinição das fronteiras entre público e privado na sociedade brasileira, no âmbito das quais são criados novos espaços e práticas de segregação social, tais como condomínios fechados, shopping centers, circuitos eletrônicos de monitoramento e vigilância em edifícios e residências, cancela nas ruas, etc.
É precisamente por isso que, no contexto brasileiro, constituído por uma perversa divisão entre as esferas pública e privada de controle social, em que as fronteiras entre a repressão ao crime político e o comum têm historicamente se interpenetrado, o apelo das prisões privadas não parece residir apenas em sua auto-apresentação como panacéia supostamente eficiente para o enfrentamento da crise do sistema penitenciário brasileiro, nos termos da ortodoxia ideológica neoliberal; antes, porém, a sua atratividade, no Brasil, parece derivar também de sua funcionalidade a um continuum de práticas formais e informais explicitamente autoritárias de gestão do problema da violência, do crime e da punição, que parecem demandar soluções privadas como extensão e reprodução de um processo histórico preexistente, estruturalmente, marcado pela acomodação tensa, precária e complementar entre um “Estado da Violência” e o Estado de Direito.

3- CONCLUSÃO

Procuramos demonstrar que o possível apelo da proposta de adoção das prisões privadas residir não apenas na manipulação da experiência estrangeira por parte de seus advogados, como também na existência de traços estruturalmente autoritários que informam as práticas de controle social do país e que são repostas no atual momento histórico vivido pela sociedade brasileira, no âmbito do desenvolvimento desigual e combinado do capitalismo.

4-REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MINHOTO, L. D. Privatização de Presídios e Criminalidade. A Gestão da Violência no Capitalismo Global. Ed. Max Limonad, 2000.

Cf. Folha de S. Paulo, 2006, p. 3-1.