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HISTERIA CRIMINAL E DISPACILINA NELES

Antonio Fernando Dantas Montalvão é titular do Escritório Montalvão e Advogados Associados e colaborador de sites e revistas especializadas em direito.

Vladimir é um piauiense de boa cepa e era construtor radicado em Petrolândia – PE, quando então a CHESF construía a barragem hidrelétrica de Itaparica, localizada no Rio São Francisco, entre os estados da Bahia e Pernambuco. Pessoa de boa prosa e me contou certa feita uma historia interessante. Em uma determinada cidade do interior nordestino não havia médico e nem enfermeiro e o milagreiro de plantão era o farmacêutico, homem leigo e bastante curioso. Seu comércio era centrado na venda de remédios de uso comum, melhoral, aralen (para impaludismo), cibalena e etc… Quando um remédio medicado dava certo ele anotava no caderno. Certo dia um vendedor de remédios lhe apresentou um antibiótico de nome dispacilina, remédio para todos s males.

Em certa oportunidade na farmácia chegou uma menina trazida pela mãe com engasgo de jaca, situação jamais vivida e nem pensada pelo farmacêutico. O farmacêutico parou, pensou, mandou a menina abrir a boca, apalpou a garganta e nada. Tentou forçar a garganta de baixo para cima e nada. Incontinenti, lhe veio à lembrança do remédio milagreiro, a dispacilina. Não pensou muito, ferveu a seringa (antigamente era de vidro) e as agulhas para esterizá-las. Mandou a mãe de a garota suspender a saia e baixar a calcinha da garota e tacou a injeção. Com a dor, a criança deu um grito e expulsou da garganta o bago da jaca. Deu certo e ele anotou em seu caderno, para engasgo de jaca dispacilina.

A história me veio à memória em razão de alguns fatos recentes. No Rio de Janeiro o garoto João Hélio foi arrastado por sete quilômetros pelas ruas do Rio de Janeiro, preso ao cinto de segurança do carro de sua mãe que acabara de ser roubado. Os agentes do fato eram menores. Os terroristas de plantão não pensaram noutra coisa, dispacilina neles. A Comissão do Senado se reuniu para baixar a menoridade penal para 16 (dezesseis) anos. Agora tramita na Câmara dos Deputados, em regime de urgência, o Projeto de Lei 1.383/03, que altera o instituto da prescrição sobre a pretensão punitiva, de forma a inviabilizá-la.

No Brasil é assim, Para cada caso que gere repercussão ou revele alguma atrocidade, dispacilina neles. O recurso é a lei, o academicismo exacerbado, inócuo, sem resultado prático positivo. Se reduzida à maioridade, haverá mais presos recolhidos nas penitenciárias já superlotadas. Nos estabelecimentos reservados a menores infratores a coisa já é preta. São Paulo que diga. Ali as revoltas são uma constante. Alongar mais ainda os processos penais com restrição ao instituto da prescrição da pretensão punitiva será mais uma balela. Coisa para quem quer produzir efeito na mídia.

O pensamento geral é a pena como castigo. É preciso endurecer e nisso a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) são experts.

O que combate o crime é a certeza da punição, isso sim. Não importa a pena cominada. Quando o agente vai cometer um crime ele não consulta antes o código penal para saber a pena cominada. O aumento de pena vai reduzir a criminalidade. Lembrar-se-á que alguns Estados dos Estados Unidos da América do Norte a pena de morte é adotada e nem por isso se deixa de praticar o crime que a pena é cominada.

O crime é resultado de diversos fatores e a parte maior da responsabilidade é do Estado Nacional. Não temos uma política definida para a Segurança Pública e o Estado Jurisdicional na administração dos serviços de repressão ao crime é ineficiente. O desequilíbrio entre as regiões e as desigualdades sociais, são, em verdade, fatores determinantes. A ausência de políticas sociais de combate à pobreza e de melhorias para as populações carentes são de relevância, como acontece nas favelas dos grandes centros urbanos. Se o Estado se ausenta o espaço é ocupado pela anarquia generalizada, seja pelo crime organizado, o crime desorganizado ou pelas milícias paramilitares. Não basta a distribuição da esmola da bolsa família, é preciso muito mais.

No combate a criminalidade se tem as medidas mediatas, a médio e longo prazo. Não se fará combate eficaz ao crime sem uma revolução que é esperada, a da educação. Cristóvão Buarque tem razão. A escola não somente educa, como dignifica o cidadão, lhe assegurando o acesso a informação e mais tarde acesso ao mercado de trabalho com mão de obra qualificada. A par disso, geração de emprego e renda é o negócio. Se o Estado fizer sua parte sem medidas histéricas, os resultados serão mais promissores.

O Brasil, diferentemente do que é passado para a sociedade é um dos países onde mais se pune. As penitenciárias e casas de detenção estão abarrotadas e milhares mandados de prisão estão pendentes de cumprimento. Falta onde recolher os apenados. Esse academicismo exacerbado que para tudo uma lei é o remédio, traduz pensamento farisaico e procura esconder a sujeira para debaixo do tapete. Há leis em demasia no Brasil e o que é inconcebível é a política de dispacilina neles.

Em tempo. Quem entrou na profixalia da dispacilina é o Ministério Público. Hoje se o Prefeito contrata servidor municipal a termo, nomeia parente até o quarto grau, deixa de realizar concurso quando não há conveniência administrativa ou não há cargo previsto em lei, deixa de fornecer passagem para tratamento fora de domicílio, não fornece medicamento que não o distribuído pela farmácia básica ou desatende as diuturnas convocações do Parquet, ação de improbidade neles, ou seja, dispacilina neles. Pouco importa a lei, o que importa é a vontade do Promotor, o novo algoz. A ação de improbidade administrativa está sendo vulgarizada pela política de dispacilina neles.

Paulo Afonso, 07 de março de 2007.
A. Fernando D. Montalvão.