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REMESSA DAS CONTAS PÚBLICAS AO PODER LEGISLATIVO

REMESSA DAS CONTAS PÚBLICAS AO PODER LEGISLATIVO.

Fernando Montalvão é titular do Escritó-rio Montalvão Advogados Associados, com trabalhos publicados em jornais, si-tes jurídicos e jornalísticos e revistas ju-rídicas impressas.

Acessando o sítio da Folha Sertaneja On Line – Paulo Afonso-BA- (1), tomei conhecimento de que o Prefeito Municipal daquela cidade houvera atrasado a remessa da Prestação das Contas relativas ao exercício fiscal do ano de 2005. Pela letra da lei, o prazo iria até 31.03.2006 e a remessa somente aconteceu em 04.04.

A gestão pública municipal está condicionada a duas formas de controle, o in-terno, por meio de Controladorias ou Sistemas Internos, e o externo, a cargo da Câmara Municipal de Vereadores com o auxílio do Tribunal de Contas. Na Bahia, o TCM –Tribunal de Contas dos Municípios. A Constituição Federal (2) tratando dos sistemas de controles das contas públicas municipais prevê:

Art. 31 – A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Mu-nicipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Po-der Executivo Municipal, na forma da lei.

§ 1º – O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribu-nais de Contas dos Municípios, onde houver.

Já a Lei de Responsabilidade Fiscal – LC 101/2000 (3) -, no art. 49, sobre as contas anuais dispõe:

Art. 49. As contas apresentadas pelo Chefe do Poder Executivo ficarão disponí-veis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técni-co responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da sociedade.

A pergunta é a seguinte: Se o Prefeito Municipal não remeter as contas anuais ao Poder Legislativo no prazo definido em lei, o que acontecerá? Observar-se-á que não se trata aqui sobre a falta de prestação de contas, porém, tão somente, do atraso da remessa das Contas anuais à Câmara Municipal de Vereadores.

No Estado da Bahia, a Constituição Estadual e a Lei Orgânica do Tribunal de Contas dos Municípios, prevêem o afastamento do Prefeito quando houver a-traso na remessa das contas anuais ao Poder Legislativo. Nos textos menciona-dos encontramos:

CE (4):

“Art. 63 – O prefeito enviará as contas do Poder Executivo à Câmara Municipal até o dia 31 de março do exercício seguinte, cabendo ao presidente da Câmara juntar, no mesmo prazo, as do Poder Legislativo.

§ 2º- O prefeito e o presidente da Câmara Municipal, em caso de não-cumprimento dos prazos estipulados no caput deste artigo, incorrerão em crime de responsabilidade, com o imediato afastamento do cargo.”

LC Estadual nº. 006, de 06 de dezembro de 1991(5):

“Art. 33 – Prestação de contas é apresentação voluntária e tempestiva ao Tribu-nal de Contas dos Municípios, por pessoa física, órgão ou entidade, dos docu-mentos por este considerados hábeis e necessários à fiscalização contábil, fi-nanceira, orçamentária, operacional e patrimonial dos municípios.

Art. 52 – As contas dos Poderes Executivo e Legislativo Municipais serão pres-tadas ou tomadas, de acordo com as disposições constantes desta Lei.

Art. 53 – As contas do Poder Executivo, constituídas pela do Prefeito, entidades da administração indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas ou mantidas pelo poder público municipal, bem como as das Mesas de Câmaras que não processarem e pagarem suas despesas, relativas ao exercício financeiro encerrado a 31 de dezembro de cada ano, serão enviadas à Câmara Munici-pal até o dia 31 de março do exercício seguinte ao que se referem, cabendo ao Presidente da Câmara juntar, no mesmo prazo, quando houver, as do Poder Legislativo.

Art. 57 – O Prefeito e o Presidente da Câmara Municipal, em caso de não cumprimento do prazo estipulado no artigo 53, incorrerão em crime de responsabilidade, com o imediato afastamento do cargo.”

A legislação estadual fala em crime de responsabilidade e afastamento imediato do Prefeito e do Presidente da Câmara Municipal, quando houver atraso na re-messa das Contas anuais. Nenhuma valia tem a sanção administrativa de que trata o § 2º do art. 23 da CE, e art. 57 da LC 06/2001.

A democracia entre nós é representativa, posto que os Chefes dos Poderes Exe-cutivos e os membros das Casas Legislativas são eleitos por voto direto e secre-to, conforme art. 14 da CF: “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: “. Uma vez que é o povo que escolhe os seus governantes, a perda de cargo político se constitui em exceção, medida excepcional, e os casos são restritos.

As normas do estado da Bahia são inaplicáveis, porque tratam sobre processo penal, cuja competência exclusiva é da União, art. 22, I, da CF. O mesmo texto constitucional definiu o Município como ente federativo, arts. 1º e 18, caput, definido a sua autonomia político-administrativa nos arts. 29 e 30. É vedado ao Estado legislar sobre matéria que é da competência exclusiva do Município, sob pena de restar violado o princípio da autonomia municipal.

No direito pátrio, o afastamento preventivo do Prefeito, somente ocorre quando processado por crime de responsabilidade, perante o Tribunal de Justiça do Es-tado, ou perante o Tribunal Regional Federal. No último caso, se houver lesão ao erário público federal. O afastamento preventivo, a tempo certo, resulta do art. 2º, II, do Dec.- Lei 201, de 27.02.1967. Observar-se-á que o afastamento somente poderá ocorrer até o encerramento da instrução. Se houver retardamen-to no encerramento dela, voluntariamente, ou não, mediante HC, em face do constrangimento ilegal decorrente do excesso prazal, o gestor voltará ao exercí-cio do cargo.

A Lei de Improbidade Administrativa, de n° 8.429, de 2 de junho de 1992, tipi-fica a não apresentação das contas anuais como ato de improbidade, art. 11, in-cisos II e VI. Faculta, ela, ao juiz, o poder de afastar o gestor público, ao dizer: “A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afas-tamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem pre-juízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução proces-sual”, parágrafo único do art. 20. Para assim acontecer, a decisão deverá ser fundamentada e demonstrada a imperiosa necessidade. Observe-se que a lei re-pete o que está no Dec.-Lei nº. 201/67, afastamento até o encerramento da ins-trução.

Sei que a inaplicabilidade da lei de Improbidade Administrativa ao gestor públi-co exercente de cargo político, especialmente os Prefeitos, importará no esvazi-amento dela, entretanto, não traz a CF, a possibilidade do afastamento do prefei-to por ato do juiz. O STF está apreciando a Reclamação Constitucional de nº. 2138, em que se discute a extensão dos efeitos da Lei nº. 8.429/92 aos atos de improbidade administrativa praticados por agentes políticos. Até agora a tendên-cia é pela inaplicabilidade da Lei.
A CF tratando da perda do mandato político, especialmente dos Prefeitos, prevê as seguintes hipóteses: a) mediante decisão judicial transitada em julgado, em ação de mandato eletivo, §§ 10 e 11 do art. 14 da CF; b) mediante decisão judi-cial em processo por crime de responsabilidade, cuja competência para o conhe-cimento e julgamento, é do Tribunal de Justiça do Estado da localização do Mu-nicípio, art. 29, X; c) assunção de outro cargo ou função na administração públi-ca direta ou indireta, ressalvada a posse em virtude de concurso público e obser-vado o disposto no art. 38, I, IV e V, arts. 29, XIV, c.c. o art. 28, § 1º; c) cassa-ção do mandato pelo Poder legislativo local, nas infrações político-administrativas.
A mesma CF, no § 4º do art. 37, diz que: § 4º – Os atos de improbidade adminis-trativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.”
Entendo que o legislador constitucional ao tratar do ato de improbidade adminis-trativa, não autorizou o seu processamento perante o juiz da Comarca, o que po-deria acontecer, não por lei ordinária, porém, por lei Complementar, mesmo as-sim, cabível ampla discussão sobre a constitucionalidade. Defendo que a compe-tência para processamento da ação de improbidade administrativa contra o Pre-feito somente será possível perante o TJ, sendo inaplicável a afirmativa em rela-ção ao ex-Prefeito, isso em razão do que dispõe o art. 29, X, da mesma CF.

O afastamento preventivo de que trata a legislação baiana, de natureza compul-sória, é incabível. Se o Prefeito vier a ser afastado pelo Tribunal de Justiça, será por crime de responsabilidade e nesse caso, por se tratar de norma de natureza processual penal, é vedado o Estado legislar, fluindo da CF que isso é da com-petência exclusiva da União. Se o Prefeito Municipal estiver sendo processado por infração político-admionistrativa, a competência será da Câmara de Verea-dores, aplicando-se ai o procedimento do Dec.-Lei nº. 167/1967, que não prevê o afastamento preventivo da legislação baiana.

Se o Prefeito Municipal se exceder no prazo de remessa das contas anuais, o ato se constituirá em mera irregularidade, como no caso de Paulo Afonso. A data limite era até 31.03 e a remessa ocorreu dia 04.04. O mesmo não acontecerá, se o atraso for por tempo superior e com o intuito de inviabilizar o prazo de expo-sição das contas ao público, de 60 (sessenta) dias. Ai sim, haverá crime de res-ponsabilidade, porém, o afastamento do Prefeito do exercício do cargo, somente será por decisão judicial da Corte Estadual de Justiça, mediante decisão funda-mentada, em obediência ao princípio do devido processo legal, art. 5º, LIV, da CF.

Fernando Montalvão. Paulo Afonso, 14 de maio de 2006.
montalvao@montalvao.adv.br

Pesquisa por Camila, Igor e Fernanda Montalvão, acadêmicos de direito.

1.www.folhasertaneja.com.br/notícias;
2. www.soleis.adv.br (Códigos);
3. www.soleis.adv.br (Leis por assunto);
4. www.bahia.ba.gov.br/assemb/informações/serviços/legislação;
5. www.tcm.ba.gov.br/legislação.